Estrelas & Miojo

O facebook tem algumas postagens recorrentes, candidatas a virais. Em uma delas lemos:Toda vez que uma criança come miojo, uma estrelinha morre. Sei que macarrões instantâneos vêm com aquele pozinho mais suspeito do que olhar de cachorro para picanha na brasa. O miojo é ruim mesmo. Mas daí a matar uma estrelinha há montanhas de exagero.

Por Fernanda Pompeu enviado para o Portal Geledés

Nas redes sociais e nas ruas há muitas afirmações com pretensão de verdade absoluta. Quando nenhuma pedra é só pedra, nem a água é só água. Tem pedra falsa, tem pedra mole, tem pedra de rim. Água suja, água misturada com areia, água de joelho. Os extremos sempre flertam com as mentiras. Eles gostam de hipnotizar para nos enganar e ganhar.

No mundo lúdico temos o exemplo dos dois bois em Parintins, Amazônia. O vermelhoGarantido e o azul Caprichoso. São rivais no bumbódromo e no imaginário. Os adeptos de um boi nem sequer dizem o nome do outro, se referem ao o contrário. Mas na vida real, há casais de mulher Caprichoso e marido Garantido. Também vice-versa. São chamados de casais Romeu e Julieta.

Quando a rivalidade extrema viceja no plano político e social, a coisa fica mais chata. Ter razão em tudo é atestado de desrazão, porque se elimina o contraditório, constelações de pontos de vista, distintas abordagens. Recrudesce a guerra de clubes e partidos, na qual mais do que vencer o que importa é derrotar o outro. São as ilusões das certezas.

Eu também já fui radical. Apontei o dedo na cara de quem pensava diferente de mim. Puxei adjetivos mal cheirosos para interromper conversações com quem lia a sociedade de jeito antagônico ao meu. Fechei-me com os pares sem convencer os ímpares.

Hoje creio que meu radicalismo foi perda de latim e saliva. Planeta e cabeças são redondos para a gente mudar de ideia. Isso não tem a ver com renegar o passado, trocar de lado ou vestir a camisa do adversário. Tem a ver com expandir a visão de mundo, melhorar a negociação dos conflitos. É fato não há vida na Terra, nem filme na tela sem conflitos. Mas acredito que ninguém precisa matar ou morrer por eles.

Faz três dias, na rua Natingui, Vila Madalena, dentro de um Lava Jato, um funcionário matou a tiros o colega. A briga foi por conta de um tapete de carro. Preso, o assassino declarou que a razão estava ao seu lado. O que me faz pensar que verdades verdadeiras podem ser letais. Elas apagam mais estrelinhas do que os miojos.

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