Eu, mulher negra racista. Uma conversa que também é sobre você

“É vocês negras que têm a auto-estima baixa e não aceitam determinados elogios. O problema está em vocês. Inseguras”.

por Charô Nunes

A primeira vez que fui acusada de ser mulher negra racista foi durante uma terapia. Agora imaginem essa preta aqui ficando bege de listinhas rosas e bolinhas azuis ao ouvir que sou uma mulher negra racista. Eu era o problema, a agente de meu sofrimento. Não a cultura branca de exclusão que de tão hegemônica passa desapercebida por negros e brancos. O racismo não é um problema meu, sempre é do outro. E daí que a gente perde a oportunidade de  conversar a respeito, juntos.

Um dos aspectos mais interessantes (e cruéis) do racismo cordial é justamente advogar que o pior racista é o próprio negro, nesse caso uma manicure que se orgulha de atender apenas clientes brancas. Se for discriminada e não tiver força para reagir, a culpa também será toda sua. Sempre você, você, você. E o que dizer da mãe que decidiu clarear a própria pele e a dos filhos? Definitivamente uma mulher negra racista.

Mas o que você faria se ensinada desde muito cedo que ser negro é muito ruim? Se sua mãe não tivesse tido a oportunidade de fortalecer sua própria autoestima e assim nunca ter podido ensinar nada a você? O você faria se todos os dias visse uma mundo completamente branco na televisão e nos telejornais? O que fazer se o mundo te diz que seu cabelo é feio, seu nariz é largo demais?

MAS NÃO EXISTE UMA ÚNICA MULHER NEGRA RACISTA?

Não. Conceitualmente a única posição da mulher negra em relação ao racismo é de vítima. Minha crítica questiona qual seu grau de aliança para com a cultura branca racista, os privilégios e os danos causados em função disso. O negro que administra a fazenda escravocrata em Django Livre é tão vítima quanto qualquer outro. Precisava sobreviver e ele escolheu muito mal seu método e seus aliados.

Muitos diriam que as mulheres (lindas, vitaminadas e absolutas) de Dark Girls também são racistas, vítimas de seu próprio preconceito por acreditarem nos discursos da branquitude racista. Basicamente, o problema não é todo um sistema que nos oprime mas a vítima. Primeiro o racismo te desnuda, te mantém continuamente despida e depois te acusa de não estar com a armadura correta. Bravo!

Não estou dizendo que não existem alternativas ou medidas legais devem ser deixadas de lado. Apenas que encontrar uma porta branca num ambiente completamente branco é tarefa complicada. É preciso contar com um golpe de sorte para encontrar a saída ou dar de cara com alguma rota que se encontra desobstruída. Infelizmente, muitos passarão toda uma vida ali dentro, sem perceber que um mundo colorido existe lá fora.

SUA VEZ: VOCÊ JÁ FOI ACUSADA DE SER MULHER NEGRA RACISTA?

P.S.: reconheço que deveria ter usado mil aspas. Mas não é assim que a vida funciona aqui fora. Decidi fazer o mesmo.

P.S.P.P.S.: em outras épocas eu diria – que diabos você está fazendo aqui? Faça uma favor pra humanidade e vaza! Respira fundo, recompõe. Mas esse tipo de argumento precisa ser respondido para que as pessoas entendam. E por ser um exercício intelectual sadio. Não, não estou de capa e espada escrevendo esse post, ainda! Agora, à oneirophanta do dia!

 

Deixar de ser racista, meu amor, não é comer uma mulata!

Existe racismo no Brasil? Faça o Teste do Pescoço e descubra

Blogueira enumera as cinco cantadas racistas mais comuns

Dennis de Oliveira: Sobre as cantadas racistas

Quantos negros para cada dez personagens?

 

Dark Girls

Fonte: Oneirophanta.org/

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