Genealogia do ódio: Os direitos humanos e os indivíduos marginalizados (parte 1)

Um efeito contínuo que tem perpetrado debates violentos e furiosos é a revolta para com o papel atual, ou o que acreditam ser, dos defensores e ativistas dos direitos humanos.

Por , do Brasil Post 

Segundo o conceito popular, e igualmente depreciativo, a ação dos direitos humanos é de proteção dos indivíduos criminosos, os párias da sociedade que escolheram a vida dita como fácil, roubando e matando tudo e todos que se atrevam a passar em seu caminho, destruindo famílias e lesando toda a sociedade.

Muitos gritam palavras de ódio ou termos de inferiorização buscando externar toda a sua raiva justificada unicamente na crença do suposto prejuízo social.

No entanto, o primeiro erro que ocorre é interpretar o termo marginalizado com equivalência do sujeito que não se adapta aos princípios sociais burgueses impostos e busca repouso fora do que chamamos de sociedade, não respeitando leis ou aqueles que preenchem nichos no qual não se encaixa.

O conceito de marginalizados emerge de uma compreensão do local da pessoa que está forçadamente à margem da sociedade, aquele excluído socialmente que não consegue, ou não usufrui de meios, para evoluir e se tornar o que muitos chamam decidadão pleno de direitos e deveres.

Tal conceito é confrontado diretamente com a Constituição Federal brasileira e o princípio da isonomia, já que todos são — ou deveriam — ser iguais, ao menos perante a lei.

Antes de se proceder com qualquer análise aprofundada, é necessário entender a origem de tal preconceito para aqueles que buscam defender os cidadãos menos favorecidos e qual fator histórico marcou diretamente todos os brasileiros para enraizar tamanho preconceito.

Ainda em 1964, com a implementação do golpe militar ocorrido no Brasil, diversas medidas foram impostas, trazendo o desrespeito por parte do Estado para com determinadas parcelas da população, que sofria com perseguições e ameaças, principalmente os líderes sindicais, estudantis, políticos e muitos outros que não aceitavam o dito novo poder implementado.

E aqueles que buscavam resguardar e proteger os direitos das pessoas ameaçadas eram tachados de “defensores de bandidos” — exatamente o mesmo termo que comumente se utiliza nos dias atuais.

O conflito de ideologias surgia quando o Estado estava impondo medidas abusivas (como torturas, agressões, reclusão sem fundamento, restrições de direitos civis e individuais etc) na justificativa de se proteger de lesões que poderiam impactar diretamente na segurança do governo.

Dessa maneira, os direitos humanos não tentavam defender os perseguidos, mas sim resguardar todo cidadão de ser injustamente prejudicado, seja ele culpado ou não.

Esse ódio injustificado fora nutrido pelos militares no poder e pela própria população que defendia a gestão militar golpista.

Mesmo com a dita implementação efetiva da democracia, tais rótulos persistiram de maneira equivocada, visto que é incontestável que um criminoso deve ser reeducado e reinserido socialmente.

Mas o que acontece desde o ato do crime até a efetiva condenação deve ser supervisionado por terceiros não interessados nos procedimentos, caracterizando um julgamento justo, restaurando como a sociedade se encontra antes de o dano ser causado.

O ponto principal, que quase nunca é debatido ou muito menos citado, é que a efetividade dos direitos humanos não está vinculada à defesa de criminosos, visto que a busca é de resguardar o sujeito passível de uma ação depreciativa pelo Estado.

A atuação dos direitos humanos de maneira alguma é um antagonismo às forças policiais. Quem difunde tal pensamento são aqueles que desconhecem ou buscam enganar a sociedade como um todo, expandindo esse pensamento preconceituoso por inúmeros motivos pessoais de crescimento individual, com ação deliberada para que parcelas do meio social não tenham acesso aos direitos fundamentais, já que as principais vítimas neste País são negros, pobres e jovens.

Segundo dados do IBGE e da Anistia Internacional, 50,7% da população brasileira é negra, assim como também são 77% das vítimas de homicídios.

O Índice de Vulnerabilidade – Violência e Desigualdade Racial também confirma a ligação direta entre a cor da pele e os riscos a que estão expostos os jovens.

Tais dados corroboram a afirmação de como indivíduos do subúrbio são diretamente afetados por um Estado e uma sociedade que os reconhecem apenas como subcidadãos.

A compreensão dessa problemática é vital para entendermos de maneira sóbria em qual contexto se insere e o que provoca tamanho ódio contra as pessoas que se opõem ao Estado opressor, que de maneira injustificada se tornou um verdadeiro e impiedoso abatedouro de indivíduos determinados por sua cor, classe, gênero e escolaridade.

Muitas vezes tais sujeitos não chegam a reconhecer sua real sina, uma vez que a sociedade se encarrega de docilizar seus comportamentos, minando qualquer possibilidade de resistência e extinguindo qualquer outro caminho que poderia existir.

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