A edição anual do Globo de Ouro, uma das mais tradicionais premiações do audiovisual nos Estados Unidos, acontece neste domingo (9) em Los Angeles, sem celebridades, tapete vermelho e transmissão na TV americana. Além de manter a segurança de todos em meio ao aumento de casos de covid-19, a intenção também seria evitar protestos durante a premiação após um período de críticas e boicotes contra a Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood por conta da falta de diversidade histórica envolvendo o evento.
Em meio a polêmicas, a HFPA anunciou neste domingo nova estrutura e membros. “Temos trabalhado incansavelmente para se transformar em uma estrutura que permita o crescimento da organização ao mesmo tempo em que adiciona vozes representativas e exclusivas de jornalistas de todo o mundo que trabalham em qualquer lugar nos Estados Unidos”, diz o comunicado da associação.
E informaram: “Há um novo Conselho de Administração (que consiste de 2/3 mulheres e 1/3 pessoas negras) com a adição de três membros externos, um Diretor de Diversidade pela primeira vez e um novo CEO externo”.
A HFPA anunciou que adicionou 21 novos membros. “Jornalistas diversificados, elevando nosso número de membros para 103 com direitos de voto imediatos para o Globo de Ouro; afiliação com organizações além da Motion Picture Association para incluir qualquer outra organização jornalística, como a National Association of Black Journalists, a Asian-American Journalists Association, a National Association of Hispanic Journalists e o National Press Club, entre outras”.
Polêmicas e boicote
A Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood, responsável pela organização do Globo de Ouro, se viu obrigada a fazer mudanças nos seus processos internos após um ano de críticas endossadas por agências publicitárias e produtoras internacionais.
Os protestos começaram em fevereiro de 2021, pouco antes da última cerimônia transmitida, quando o Los Angeles Times publicou uma reportagem criticando a falta de diversidade do evento e apontando que o júri, constituído por cerca de 80 jornalistas culturais, não conta com a presença de nenhum crítico negro, por exemplo.
Além disso, Maher Tatna, ex-presidente da Associação, teria afirmado que o grupo não contava com profissionais negros desde 2002, de acordo com a Variety. Em abril de 2021, o presidente Phil Berk foi expulso após o envio de um e-mail em que se referia ao movimento Black Lives Matter, que luta contra a violência policial contra a população negra nos EUA, como um “movimento de ódio racista”.
A publicação da Variety também acusou integrantes de receberem presentes em troca de indicações, apontando conflito de interesses. Entre elas estaria a série Emily In Paris, que recebeu duas indicações após a Netflix ter supostamente arcado com viagens de dois membros do júri para a capital francesa.
Tanto os tradicionais grandes estúdios como novos players, Netflix e Amazon, anunciaram boicote à Associação, afirmando que não trabalharão mais em conjunto com a organização até que mudanças significativas sejam feitas no quadro de júri.
Celebridades também se pronunciaram sobre as polêmicas. Scarlett Johansson acusou a organização de sexismo em depoimento ao Entertainment Weekly. “É a razão exata pela qual eu, por muitos anos, me recusei a participar de suas conferências. A AIEH é uma organização que foi legitimada por nomes como Harvey Wieinstein”, declarou em trecho. A atriz se refere ao antes superpoderoso produtor condenado por assédio, agressão e estupro, num caso que ajudou a alavancar o movimento #MeToo.
De acordo com a Variety, Tom Cruise chegou a devolver os três prêmios que recebeu no Globo de Ouro ao longo dos anos de carreira. Mark Ruffalo usou seu Twitter para se pronunciar sobre o assunto. “Como um vencedor recente do Globo de Ouro, não posso me sentir orgulhoso ou feliz por receber este prêmio. Agora é a hora de intensificar e corrigir os erros do passado”, disse.
Apesar de oficialmente a HFPA dizer, justificadamente, que o avanço da pandemia, e especialmente da variante Ômicron, requer uma cerimônia fechada, a entidade teria tentado, sem sucesso, trazer celebridades para a transmissão.
Promessa de mudança
A expulsão de Phil Berk veio pouco após a primeira atitude tomada pela empresa para responder ao pedido de diversidade na indústria. Em março de 2021, a Associação contratou um novo consultor de diversidade estratégica com a promessa de ter pelo menos 13% de membros negros no júri.
Após o email de Berk ser divulgado pelo Deadline, a Associação anunciou novas medidas. Em maio, prometeu que aumentaria o número de membros em 50% nos próximos 18 meses como uma forma de incluir mais críticos negros no júri.
Além disso, a organização lançou “novas políticas envolvendo presentes, viagens e conflito de interesses” em julho. Os membros do júri estão proibidos de “aceitar materiais promocionais ou outros presentes de estúdios, publicitários, atores, diretores ou outras pessoas ligadas a filmes e programas de TV”.
“A HFPA continua dedicada à mudança transformadora que descreveu em seu plano de reforma e cronograma em maio. Ontem, a organização estabeleceu novas pautas-chave para avançar com a reforma”, declarou o grupo em comunicado enviado À AFP.
Mesmo assim, Hollywood e a crítica especializada se mostraram céticas a respeito de uma possibilidade de renovação da premiação que até pouco tempo estava atrás apenas do Oscar em termos de prestígio.
“No momento, a maioria em Hollywood não está prestando atenção ao Globo de Ouro. Se Hollywood não está reconhecendo a premiação de forma alguma, qual é o seu significado? Acho que nenhum”, declarou o editor da Variety, Marc Malkin, sobre a edição deste ano.