Em um texto emocionante, a editora sênior Paola Deodoro narra as aventuras da gestação depois dos 40, escolha cada vez mais comum no Brasil
Por PAOLA DEODORO, da Revista Marie Claire
“Tenho 42 anos e estou entre o quinto e o sexto mês de gravidez (depende do dia em que você estiver lendo esse texto!) do meu primeiro filho. Não tive muito enjoos, mas tenho muito sono, fico louca tentando achar uma roupa para vestir de manhã, passo uns 12 tipos de hidratantes diferentes para evitar estrias, estou viciada em frutas, sinto falta daquele vinhozinho desestressante sem dia certo, quando chego em casa, sigo fazendo aulas de dança, pratico ioga e acho que até aqui estou indo bem na tarefa de preparar uma pessoinha. Pode ser que você não tenha percebido (provavelmente percebeu, né), mas lá no iniciozinho eu digo que tenho 42 anos, com chances de comemorar 43 na maternidade, já que completo 40 semanas de gestação dois dias antes do meu aniversário. E apesar de tudo estar correndo na mais perfeita ordem, incluindo tradicionais crises de mau humor, a idade ainda gera polêmica quando digo que estou grávida – afinal de contas, uma gravidez após os 40 anos ainda é considerada de risco pela comunidade médica por conta de possíveis problemas como diabetes gestacional, hipertensão e parto prematuro. O que justifica (e muito) a preocupação e as sobrancelhas levantadas dos meus amigos.
Mas como a minha idade sempre foi bastante polêmica – tenho a genética boa e a pele ótima ;) – e sou meio molecona, sempre pareço bem mais nova mesmo. Agora, quarentona e grávida? Ah, essa história já está indo longe demais!
Recapitulando…
Sempre fui apaixonada por crianças. Sempre. Do tipo que jamais passa incólume por uma. Se for um bebezinho, quero pegar no colo, estimular um sorriso, fazer dormir (amo ninar bebês). Com os maiores eu adoro brincar, mas gosto mesmo é de bater papo. O mundo infantil me encanta tanto. Tenho seis afilhados (!), cada um representa uma fase da minha vida e são extremamente importantes para mim.
Em função disso, fui muito questionada sobre ter ou não ter filhos. Sério, devo ter respondido a essa pergunta mais de 500 vezes na vida. Fiz até uma conta assim meio por alto para contextualizar e é por aí mesmo. E o mais intrigante é que passei muito tempo sem ter certeza do que responder. Nem durante o meu primeiro casamento, ou em namoros mais longos, eu sabia exatamente o que dizer. Isso vai soar um pouco como conversa de autoajuda, mas vamos lá: sempre tive uma sensação forte de que a maternidade faria parte da minha história, só não sabia exatamente o caminho. Achava que precisava cumprir algumas etapas ainda, que o tempo e as experiências me ajudariam a construir coisas em mim que eu não tinha e que, virginiana que sou, precisava que estivessem sólidas. Mas imagina explicar isso para aquela tia-avó que em todo Natal dizia que ainda tinha esperanças em mim.
Mas ó, sou tão teimosa que nem meu relógio biológico me pressionou. O que foi sempre claro para mim era que: 1) eu não engravidaria a qualquer custo ou de qualquer parceiro – e olha que o destino já me colocou em situações tentadoras; 2) não deixaria coisas importantes de lado para viver isso sozinha. E por mais que eu tivesse essa sensação de que, a seu tempo, ou a ciência ou a fila de adoção me dariam esse cargo, viver sem ser mãe não me parecia um problema absurdo.
Como bem escreveu a Laura Ancona, diretora de Marie Claire e autora da coluna Mãe (in)Comum, a vida sem filhos também é boa. É injusto pensar que sem a maternidade uma mulher é incompleta, que nunca vai conhecer o amor incondicional. Amar é um ato tão particular que é muita pretensão nossa querer categorizar. Meus sobrinhos, por exemplo, são meus amores incondicionais. Mesmo morando longe, penso neles o tempo todo e faço – sempre farei – tudo o que puder por eles – Mikaella, Murilo e Caio, uns anjinhos. Acho que acreditar nisso real/oficial me deu, inconscientemente, uma certa leveza em relação ao tema. E isso me trouxe até aqui, de coração aberto, no tempo que, nas minhas convicções, é o ideal. E na companhia mais perfeita que eu poderia sonhar (nem tinha referências históricas para saber que podia ser assim, tão lindo, tão incrível).
Mas aos 42, menina?
Sim, engravidei naturalmente, na primeira tentativa, aos 42 anos. Eu e meu (agora) marido tivemos uma conversa definitiva em um mês. Baixei um app de controle de ovulação e no mês seguinte estava grávida. Parece mágica, mas é raro, viu? Apostava no combo básico da quarentona: tentar free style uns seis meses, fazer estimulações e talvez chegar a uma inseminação. Então, sim, foi improvável. Mas o ginecologista e obstetra João Antônio Dias Jr., coordenador do Centro de Reprodução Humana do Sírio-Libanês, lembra que a raridade não está na concepção já na primeira tentativa. A probabilidade no primeiro e no 12º mês é a mesma (as chances diminuem depois de um ano). A questão é a faixa etária: dos 20 aos 30 anos, a chance de engravidar é de 25% ao mês. Já aos 40, essa possibilidade cai para 8% ao mês. E nessa fase o indicado é procurar um especialista depois de seis meses de tentativas.
Soma-se à idade o fato de eu ter o útero abaulado – quase bicorno, que altera o formato e pode dificultar a aderência do embrião – e uma miomectomia feita há 5 anos. Dessa cirurgia removi dois miomas, um deles com 8 centímetros, que deixou uma cicatriz profunda no útero.
A ginecologista e obstetra Karina Tafner, do ambulatório de Reprodução Assistida da Santa Casa e especialista em Endocrinologia Ginecológica e Reprodução Humana pela Santa Casa, lembra que o que dificulta a concepção é a presença do mioma, e não a cicatriz da remoção. Mas a incisão fragiliza o útero, criando risco de ruptura durante o trabalho de parto – o que torna a cesárea a melhor opção.
Bom, se isso é sorte, retribuição do universo ou mercúrio progressivo eu não sei dizer. Mas vocês precisam concordar que meu feelling sobre o tempo funcionou. E podia não ter funcionado! Muitas amigas da minha geração passaram por momentos difíceis até engravidar. Algumas seguem tentando. Nem todo mundo pode esperar. Nem eu sabia se podia. Não tinha congelado óvulos nem feito exames de fertilidade. E, no final das contas, estava tudo bem. Estou aqui, me sentindo um broto, só um pouco obcecada por vitaminas e me recuperando do nervoso do exame morfológico, que analisa a possibilidade de doenças cromossômicas – mais comuns em mulheres mais velhas. Mas também despertando sentimentos ímpares nas pessoas. Posso dizer que mais da metade chorou quando eu contei que estava grávida. Teve choro de ‘ufa, a hora dela chegou!’ e teve choro de ‘já passei dos 35 e ganhei tempo com essa info, amiga’. Também teve choro de ‘eu te amo e vou estar sempre por perto para o que você precisar’. O meu choro é de ‘obrigada, tempo, por ter respeitado o meu ritmo. Farei de tudo para não decepcionar.”
A nova pirâmide etária
Nos últimos 20 anos, o número de mulheres que teve filhos entre 40 e 44 anos cresceu 50% no Brasil. Já entre os 35 e os 39 anos teve um aumento de 71%, segundo um levantamento da Folha de S.Paulo com dados do Ministério da Saúde em janeiro deste ano. “A maior barreira nessa faixa etária é a redução da fertilidade. Mas depois de confirmada a gestação, um pré-natal bem-feito pode diagnosticar e tratar possíveis problemas para a mãe e para o bebê”, afirma a ginecologista e obstetra Tânia Regina Schupp, que tem tese de doutorado na USP sobre gravidez a partir dos 40 anos.
BELEZA: DANIELE DA MATA COM PRODUTOS NARS, LAURA MERCIEr E URBAN DECAY