Gritaram: negra! E elas responderam com narrativas ofuscantes

“De repente umas vozes na rua me gritaram negra!” – Victoria Santa Cruz

Por Daniela Luciana Do Afro Latinas

Keila filma. Stephanie escreve. Kiusam dança. Rubia trança.

Seria tudo tão simples se elas fizessem só isso que emergiu mais notoriamente quando lhes gritaram negras. Cada uma faz mais que isso e nos revelam ousadia e capacidade em diversas atividades. As facetas expostas nos interrogam, elas rasuram e reescrevem a própria caminhada para fazer mais que o visível imediatamente.

Em diferentes gerações e fazeres, as quatro mulheres desta mesa transcendem suas atividades mais notórias e nos indagam sobre nós mesmas ao apresentar caminhadas múltiplas em movimento, onde só o que pode ser constante é a reorganização de metas e resultados.

E as pessoas continuam a gritar NEGRA, das mais diversas formas, na maioria das vezes negativamente, as instituições continuam a gritar NEGRA no cotidiano, dentro e fora da família, como também ouvimos nós, na rua, na escola, no trabalho, na universidade, na vida.

As suas existências e possibilidades diversas nos perguntam: o que nós não podemos fazer mesmo? E a resposta bem pode ser, contra todas as circunstâncias e contextos históricos: apenas o que não quisermos, apenas o que o tempo adiar para o momento certo, apenas o que não couber em luta e vontade.

Pois, a que trança também escreve e ensina. A que filma também fala e produz. A que escreve também organiza outras mulheres, cria e mantém espaços de divulgação de outras falas. A que dança também oferta orientação espiritual, escreve, é doutora, conta histórias, e, na nação-mãe ketu, é sacerdotisa.

Keila e Rubia do Norte, Kiusam e Stephanie do Sudeste, brasileiras pretas que rasgam o estereótipo porque sim. E por que não?

Essa é a mesa em que as mulheres-narrativas são e nos apresentam interrogações, questionamentos, trânsitos de mídias e suportes, aprendizados construídos com trabalho individual e compartilhados no coletivo para que cada uma de nós pense o tanto que pode ser, fazer, contribuir. O corpo é uma mídia, assim como o cabelo, as redes sociais e a câmera na mão ou num tripé.

Para que nos vejamos em espelhos multi-facetados de mulheres que ao ouvir que lhes gritarão negras… ofuscaram a quem não estava pronto/a ou considerasse confortável apenas uma resposta. E elas ainda estão respondendo, não fecharam questões, seguem usando habilidades diversas e instigando pensar e fazer por onde passam.

Não sairemos ilesas dessas narrativas e nem queremos, certo? Pois os limites já não nos cabem e estão aí algumas que romperam nos que lhes deram, assumiram suas trajetórias para que nos fecundemos ainda mais de possibilidades. Dos espelhos de várias faces, vamos fazer luz e reflexão.

Daniela Luciana, integrante da Irmandade Pretas Candangas e do coletivo literário Ogum´s Toques, mantém o blog Caleidoscópio Mutante.

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