Há 15 anos, Globo lançou 1ª protagonista negra em novela e quase nada mudou

Mais e mais a sociedade cobra a presença de negros em novelas, que ainda é escassa. É incrível que, depois de 15 anos da primeira protagonista negra na Globo, o assunto tenha estacionado, já que, de lá para cá, pouquíssimas novelas centraram suas tramas principais em personagens negros.

por Nilson Xavier no Blog do Nilson Xavier – UOL

Da Cor do Pecado, 2004 (foto- Acervo:TV Globo)

Há exatos 15 anos, estreou “Da Cor do Pecado“, novela de João Emanuel Carneiro, com Taís Araújo no papel de Preta. A atriz já havia protagonizado antes, mas fora da Globo: na novela “Xica da Silva“, na TV Manchete, em 1996-1997.

De “Da Cor do Pecado” para cá, foram ao ar quase 150 novelas pela Globo, SBT e Record, das quais apenas 13 tiveram papeis principais com atores negros: “Cobras e Lagartos“, “Viver a Vida“, “Cama de Gato“, “Rebelde“, “Cheias de Charme“, “Carrossel“, “Lado a Lado“, “Geração Brasil“, “Babilônia“, “Velho Chico“, “Malhação, Pro Dia Nascer Feliz“, “Escrava-Mãe” e “Malhação, Viva a Diferença“. (*)

Camila Pitanga e Lázaro Ramos em Lado a Lado (Foto- Acervo:TV Globo)

Da Cor do Pecado” foi também a primeira novela da Globo com um romance inter-racial como tema principal: o amor entre Preta (Taís Araújo) e Paco (Reynaldo Gianecchini), ela, uma moça negra e pobre criada no Maranhão, e ele, um rapaz branco, rico, criado no Rio de Janeiro.

A intenção do autor não era levantar polêmicas e discussões sobre o preconceito social e racial no país. João Emanuel Carneiro afirmou na época da estreia da novela: “Não estou fazendo uma coisa sociológica. Estou contando a história de dois personagens. Não é o meu objetivo criar polêmica.

Para a diretora-geral Denise Saraceni, o tema da novela não era o racismo: “A ênfase da novela está no relacionamento humano e em suas consequências. Mas, como a protagonista é negra, inevitavelmente ela passará por situações desagradáveis, refletindo o que acontece na nossa sociedade.

Sobre protagonismo, vale destacar Ruth de Souza na novela “A Cabana do Pai Tomás“, que a Globo exibiu entre 1969 e 1970. Apesar de mulher do protagonista Pai Tomás, Cloé, personagem de Ruth, não pode ser considerada protagonista da história. O branco Sérgio Cardoso (acusado de blackface pelo papel de Pai Tomás), era o protagonista absoluto da novela.

A Cabana do Pai Tomás | Carrossel | Escrava-Mãe (Foto- divulgação)

Em 1965, a TV Tupi levou ao ar a primeira novela da TV brasileira com um romance inter-racial como trama principal: “A Cor da Sua Pele“, estrelada pelo branco Leonardo Villar e pela negra Yolanda Braga.

Além de Taís Araújo (que depois protagonizou as novelas “Viver a Vida“, “Cheias de Charme” e “Geração Brasil“), também Camila Pitanga viveu papéis centrais (em “Cama de Gato“, “Lado a Lado“, “Babilônia” e “Velho Chico“), e Lázaro Ramos (em “Cobras e Lagartos” e “Lado a Lado“). Fora da Globo, Micael Borges em “Rebelde” e Gabriela Moreyra em “Escrava-Mãe“, da Record TV, e o então garoto Jean Paulo Campos, em “Carrossel“, do SBT. Ainda: na “Malhação“, Aline Dias na temporada de 2016-2017, e Heslaine Vieira, em 2017-2018.

Percebe que a maioria das novelas são com Taís, Camila e Lázaro… “Aparentemente, há apenas 3 atores negros no Brasil gabaritados para serem protagonistas“, salientou a amiga Bárbara Sacchitiello.

No ano passado, a Globo perdeu uma grande oportunidade (e foi criticada, com razão, por isso) de dar a um negro um dos papeis centrais da novela “Segundo Sol“, também de João Emanuel Carneiro, cuja trama se passava em Salvador. No elenco havia Fabrício Boliveira, como Roberval, mas o personagem nem era da trama central da novela.

Foto- Acervo:TV Globo.

Da Cor do Pecado

Era a estreia de João Emanuel Carneiro como titular na autoria de novelas. “Da Cor do Pecado” foi um sucesso, batendo recordes de audiência. A arrancada aconteceu no capítulo 27, quando entraram em cena os personagens infantis Raí (Sérgio Malheiros) e Otávio (Felipe Latgé), de grande apelo popular.

Uma arma do autor para cativar o público foi a comédia, principalmente por meio da família Sardinha, composta de uma mãe hiperprotetora, com métodos pouco ortodoxos de educação, e seus cinco filhos versados em artes marciais. Rosi Campos ficou para sempre marcada pelo papel de Edilásia – a Mamushka, como era carinhosamente chamada pela prole.

A trama central de “Da Cor do Pecado” remetia a duas outras novelas. Os gêmeos separados, um criado pela mãe e outro pelo pai, sem que um soubesse da existência do outro, lembra o mote central da novela “Baila Comigo” (de 1981, atualmente reprisada pelo canal Viva). Já os idênticos, em que um toma o lugar do outro após um acidente, remete à novela “O Outro” (1987).

A Família Sardinha (Foto- Acervo:TV Globo)

Em 2009, “Da Cor do Pecado” se tornou a novela brasileira mais exportada, com cem países como clientes. O ranking era liderado por “Terra Nostra” (de 1999-2000), seguida de “O Clone” (de 2001-2002) e a versão original de “Escrava Isaura” (de 1976-1977). Em 2013, foi a vez de “Avenida Brasil” (de 2012, do mesmo autor, João Emanuel Carneiro) ultrapassar essa marca.

AQUI tem tudo sobre “Da Cor do Pecado“: trama, elenco, personagens, curiosidades, trilha sonora.

(*) Em “Insensato Coração“, Lázaro Ramos e Camila Pitanga (de novo eles!)estavam em papeis importantes, mas a novela tinha apenas uma protagonista absoluta, Norma (Glória Pires), e seu antagonista, Léo (Gabriel Braga Nunes).
Micael Borges foi um dos protagonistas da temporada 2009 da “Malhação“. Porém, além de o programa ainda não ser considerado novela na época, o personagem de Micael acabou minguando na trama.
Inclui o Cirilo de “Carrossel“, mas ainda acho que a Professora Helena era a protagonista absoluta da novela. Aí foram me cobrar a Pata (Julia Olliver) de “Chiquititas“…  ¯\_(ツ)_/¯

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