Com as urnas apuradas, Fernando Haddad, do PT, é o novo prefeito de São Paulo. Irá administrar a maior cidade do País, mas viveu momentos de extrema dificuldade e angústia antes de conquistar um triunfo histórico; leia a reportagem de Marco Damiani
Nascido no dia do aniversário de São Paulo, Fernando Haddad é o novo prefeito da maior cidade do País. Com as urnas já apuradas, ele obteve 56% dos votos, contra 44% de José Serra. Leia, abaixo, o relato de Marco Damiani sobre os bastidores da conquista.
O bordão “não é por mal” saiu sem querer da boca de Fernando Haddad, no comício em Parelheiros, na Zona Sul, como expressão corriqueira, mas pegou bem. Despertou aplausos entre as cerca de duas mil pessoas que assistiam aos discurso.
Ao deixar o palanque, Fernando Haddad, que a havia acabado de pronunciar, telefonou para o marqueteiro João Santana: “Eu falei uma frase que as pessoas gostaram. Vamos usá- la mais”.
Dali para a frente, dedicando-se a descontruir quem considerava seu principal adversário naquele momento, Haddad passou a iniciar sua crítica ao adversário Celso Russomano com o “não é por mal, mas ele não sabe o que está falando” – e, paralelamente, começou a subir nas pesquisas.
Estas e outras histórias foram recolhidas por 247 agora que, já aponta a boca de urna, e enquanto os votos eletrônicos vão sendo contados, com números finais prometidos para perto de 19h30, o candidato cumpriu sua missão impossível.
Fernando Haddad é o prefeito eleito da maior cidade da América Latina, São Paulo.
Uma alegria madura, sem euforia e excessos, toma conta do salão de eventos do Hotel Intercontinental, em São Paulo, onde Fernando Haddd e o ex-presidente Lula são festejados como “os caras”.
“Começamos a campanha com Lula doente, o mensalão nas manchetes e a impossibilidade de mostrar Haddad como candidato”, lembra um dos integrantes do alto comando da campanha.
– Mas como, afinal, ele conseguiu? Sempre confiou ou esmoreceu? Qual foi sua maior fonte de irritação durante a campanha? E grande alegria? Quando percebeu que poderia ganhar? Onde se deu o chamado ponto de inflexão, em que a campanha derrotada passou a ser vitoriosa?
Setembro, o mês considerado mais importante da campanha eleitoral, começou péssimo para Haddad. Depois de patinar na rabeira das pesquisas nos oito meses anteriores do ano, finalmente ele avançou para a casa dos 8%, lado a lado com Gabriel Chalita, do PMDB, pouco a frente de Soninha Francini, do PPS, mas nem perto da poeira de José Serra e Celso Russomano, estourados. O problema era que de 8% Haddad não conseguia passar. Sentia-se empacado. Cumpria agenda de ponta a ponta, servia-se a de Lula e do marqueteiro João Santana, em telefonemas diários, como conselheiros e orientadores, mas nada que eles formulavam mudava a situação. O PT, daquele jeito, entraria na última semana da eleição, em outubro, com o primeiro turno marcado para o dia 7, em terceiro lugar. O sonho do segundo turno estaria desfeito. Cada uma de um jeito, as três cabeças da campanha rolariam na crítica dos adversários, nas análises da mídia e no atestado em si da falta de votos suficientes para cumprir a tarefa.
Foi quando, no final de setembro, a partir de um escorregão de Russomano, que Haddad, antes de Lula e Santana, encontrou sua chance.
– A proposta de bilhete único proporcional de Russomano vai prejudicar quem passa mais tempo nos ônibus, quem mora longe do trabalho. Vamos bater.
Juntando o bordão “não é por mal” com a crítica ao bilhete único de preço variável com a distância percorrida, Haddad, finalmente, conseguiu alvejar Russomano. O desequilíbrio do adversário, que não soube se explicar, acabou sentenciando o momento, para Haddad, mais importante da eleição.
Há, ainda, um ponto importante sobre a situação. Não havia clareza, dentro do PT, sobre qual era o principal adversário em primeiro turno. O ex-ministro José Dirceu registrou em artigo que o eixo da campanha estava errado ao atacar Russomano. Para ele, quem deveria ser focado era José Serra.
“Haddad, que sempre achou que tinha de bater em Russomano, e não em Serra, especialmente, para sair do lugar, estava certo”, conta um integrante do núcleo duro da campanha.
“Dali para frente, crescemos de maneira constante. Ganhos nas duas últimas semanas do primeiro turno”.
Haddad, na segunda volta, administrou a vantagem novamente a partir dos erros do adversário, agora José Serra, que optou por uma linha ultraconservadora e repetitiva, com mensação e kit gay como carros-chefes. As piores lembranças estão ainda no primeiro turno. Haddad ficou bastante magoado com Marta. Ele tomou como um golpe pessoal o discurso da então senadora e hoje ministra da Cultura na Câmara Municipal, quando ela respondeu a Lula sobre “pessoas novas”:
– O importante não é ser novo, mas ter idéias novas, disse ela, na frase que machucou o candidato. A ferida só se abriu mais quando Marta não compareceu à convenção do PT.
– Maggou, diz um integrante da campanha.
O mal estar foi parcialmente superado quando, finalmente, Marta, ao ganhar seu cargo em acordo fechado diretamente com o ex-presidente Lula, avançou ao lado de Haddad pela periferia.
– Com Marta não tem desfaçatez, disse o candidato internamente. Ele é sincera, a gente vê se ela está dentro ou fora, e agora entrou.
Haddad é visto pelos seus colaboradores como uma surpresa no corpo a corpo com os eleitores. Idéias captadas nas ruas foram divididas com o marqueteiro João Santana, para aproveitamento nos programas eleitorais. Além disso, Haddad mostrou-se um político atencioso.
Nascido no dia do aniversário de São Paulo, Fernando Haddad é o novo prefeito da maior cidade do País. É o que atesta a pesquisa de boca de urna feita pelo Ibope. O petista teve vinte ponto mais do que o rival José Serra.
Aos 49 anos, ele cumpre uma tarefa que parecia impossível, no início da campanha. Enfrentou dificuldades internas, como a resistência de Marta Suplicy, e externas, como o julgamento da Ação Penal 470.
De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, todas as urnas em São Paulo, e nas outras cidades que têm segundo turno, terão sido apuradas até 21h30.
Fonte: Brasil 247