Homens e mulheres têm visões diferentes do processo eleitoral, por Fátima Pacheco Jordão

Há muitas novidades influenciando o cenário das eleições deste ano, desde as novas plataformas de comunicação na Internet –como o Twitter–, uma nova dinâmica no YouTube, novos sites acompanhando de perto pesquisas, análises de discursos por tags e outros fatos. Na mídia tradicional, uma cobertura mais ativa, sobretudo na imprensa, conferindo promessas de candidatos, promovendo debates e aprofundando entrevistas.

Nunca tantos eleitores inscritos, nunca tantas mulheres candidatas –eram 12% em 2006 e chegam a 20% atualmente. Ainda que abaixo da cota de 30% prevista para os partidos, pela primeira vez há duas mulheres competitivas concorrendo na faixa mais exclusiva, a da Presidência.

 

42% DOS ELEITORES NÃO CITAM NENHUM CANDIDATO

Portanto, parece perfeitamente compatível com o grau de informações disponíveis um dado da última pesquisa Datafolha, segundo o qual 42% dos eleitores não citam nenhum candidato quando perguntados em quem pretendem votar para presidente em 3 de outubro. Nesta mesma época na eleição de 2006, outra pesquisa Datafolha apontava 36% de eleitores que não tinham um nome pronto para citar.

Trata-se de um indício claro de que, neste ano de 2010, o eleitorado, mais cauteloso, ainda aguarda outras informações para se decidir. Entre as mulheres, são 51% as que não citam candidatos; entre os homens, 33% –uma diferença expressiva de 18 pontos percentuais.

Dados ainda não divulgados anteriormente pelo Datafolha –processados com exclusividade e analisados pelo Instituto Patrícia Galvão– trazem novas luzes para explicar estas diferenças. Seriam as eleitoras mais cautelosas ou menos informadas? Mais indiferentes à movimentação da cidadania? Mais distantes do processo eleitoral ou mais criteriosas na definição de seu voto?

 

EM TODOS OS SEGMENTOS, MULHERES SÃO MAIORIA DOS QUE NÃO DECLARAM CANDIDATOS ESPONTANEAMENTE

Os novos dados surpreendem e mostram que as diferenças entre eleitores e eleitoras, na declaração espontânea de voto, persistem nas diferentes regiões do país, nas capitais e interior (Gráfico 1). As diferenças são de 18 pontos no Sudeste, 17 pontos no Sul, 22 no Nordeste e 18 no Norte e Centro-Oeste. Nas capitais, 17 pontos; no interior, 21 pontos.

Há variações de menor impacto entre jovens e eleitores de escolaridade superior. No entanto, a tendência é a mesma: em todos os segmentos pesquisados, mais eleitoras do que eleitores não declaram candidatos de forma espontânea.

Entre os eleitores mais velhos, a diferença vai a 30 pontos; entre os mais jovens (16 a 24 anos), a diferença cai para 10 pontos, mas está presente; entre os eleitores de escolaridade baixa, é de 24 pontos; e para aqueles com ensino superior, 11 pontos.

Ou seja, a questão do amadurecimento da escolha eleitoral tem efetivamente um corte de gênero e, em diferentes graus, perpassa geografia, escolaridade e ciclos de vida. O Gráfico 1 nos mostra este fenômeno desdobrado em 14 diferentes segmentos e uma constante: as mulheres aguardam mais informações para se definir. Cresce, portanto, ao longo da campanha, o papel das eleitoras no processo de escolha de candidatos e candidatas.

Gráfico 1 – Datafolha/Agência Patrícia Galvão, 1º de julho de 2010. Reprocessamento inédito por sexo realizado com exclusividade para o Instituto Patrícia Galvão.
Amostra: 2.658 entrevistas.

 

VOTO FEMININO EM 2010: DECISÃO PASSO A PASSO

Segundo o Datafolha, 94% dos eleitores indicam algum candidato quando uma lista deles é apresentada e a escolha antecipada para o dia de hoje (“Se a eleição para presidente fosse hoje e os candidatos fossem estes, em quem você votaria?”).

No entanto, entre os que apontam candidato, 31% declaram que, até o dia 3 de outubro de 2010, podem mudar seu voto, sobretudo os jovens e os eleitores de escolaridade superior.

As diferenças entre homens e mulheres se atenuam, mas ainda permanecem em quase todos os segmentos da amostra. Ou seja, as mulheres, mais do que os homens, dizem de forma indireta que, no momento, sua decisão depende de outras informações e de outro patamar de convicção. As mulheres, mais que os homens, estão dispostas a um olhar mais crítico a cada estágio das eleições. Não se trata aqui de indecisão por parte das eleitoras, mas de cautela e meticulosidade na escolha.

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* Intenção de voto estimulada; mas entrevistados declaram que podem mudar. Representam 31% dos que declaram intenção de voto estimulado.
Gráfico 2 – Datafolha/Agência Patrícia Galvão, 1º de julho de 2010. Reprocessamento inédito por sexo realizado com exclusividade para o Instituto Patrícia Galvão.

 

VOTO FEMININO NO 2º TURNO: SERRA 54% E DILMA 37%

As diferenças de consolidação de votos acabam por ter impacto nas escolhas de candidatos. Tomando-se, por exemplo, as taxas de intenção de voto no segundo turno, os candidatos Dilma Rousseff e José Serra estão, segundo o Datafolha, empatados no conjunto dos eleitores. Dilma, no entanto, recolhe entre os homens 53% de intenção de voto, contra 40% de Serra –13 pontos de diferença. O candidato tucano tem 54% entre as mulheres e Dilma, 37% –17 pontos de diferença.

Tomando os vários segmentos, percebe-se que as diferenças de intenção de voto entre os sexos não são simétricas na comparação Dilma e Serra.

Dilma Rousseff (Gráfico 3) crava as maiores diferenças entre eleitores e eleitoras com ensino fundamental e os mais velhos (60 anos ou mais), em ambos 20 pontos de diferença; no Nordeste e entre eleitores de 35 a 59 anos, são 18 pontos.
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Gráfico 3 – Datafolha/Agência Patrícia Galvão, 1º de julho de 2010. Reprocessamento inédito por sexo realizado com exclusividade para o Instituto Patrícia Galvão.

As maiores diferenças para Serra (Gráfico 4) de intenção de voto entre os sexos estão no Sul e Sudeste (17 e 18 pontos percentuais), 45 a 59 anos (18 pontos percentuais) e escolaridade média (16 pontos percentuais).

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Gráfico 4 – Datafolha/Agência Patrícia Galvão, 1º de julho de 2010. Reprocessamento inédito por sexo realizado com exclusividade para o Instituto Patrícia Galvão.

GÊNERO NAS ELEIÇÕES: UM ASPECTO FUNDAMENTAL DE ANÁLISE

Estes novos dados mostram que a questão de gênero impacta efetivamente os resultados das eleições e que homens e mulheres têm visões diversas nos diferentes estágios do processo eleitoral. As análises de mídia e de articulistas têm deixado esta questão de lado, mas já se vislumbram novos enfoques, tendo em vista os dados empíricos que emergem das novas pesquisas e de dados do TSE.

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Análise realizada a partir de reprocessamento inédito da pesquisa Datafolha de julho de 2010. A produção de tabulações especiais foi realizada pelo Datafolha, com exclusividade para o Instituto Patrícia Galvão, aplicando um filtro por gênero para separar os dados de homens e mulheres para todos os segmentos da amostra.

 

 

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