Que pesem os fatos. Esta terceira edição do Relatório Luz da Sociedade Civil sobre a implementação nacional da Agenda 2030 evidencia o acirramento das violações e o desrespeito aos direitos sociais, ambientais e econômicos em curso no Brasil.
Da Agenda 2030
A análise das 125 metas dos Objetivos de Desenvolvi-mento Sustentável (ODS) foi elaborada por experts e par-ceiros do Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para Agenda 2030 e, somada ao estudo de caso sobre Mariana-Brumadin-ho, indica o desmonte de programas estratégicos para o al-cance dos ODS. As iniciativas ultra liberais e aquelas base-adas em fundamentalismo religiosos ganham força, apesar de serem comprovadamente ineficazes e danosas, em nada contribuindo para responder às atuais crises econômica, ambiental e social que dominam o país.
O desafio não é pequeno. Temos 15 milhões de pes-soas em extrema pobreza, 55 milhões de pobres, 34 milhões sem acesso à água tratada, mais de 100 milhões sem serviço de coleta de esgoto e quase 600 mil domicílios sem energia elétrica. Quase 50% da flora está sob ameaça radical, o cam-po e a saúde se veem ameaçados pela liberação de 239 novos tipos de agrotóxico. O cenário é tenso, com desemprego alto (13 milhões de pessoas) e persistente1, mas o Governo Federal foca em propostas que agravam os conflitos e pioram, princi-palmente, a vida das mulheres negras, das quilombolas e das indígenas, sem apresentar soluções para pacificar o país.
Paralelamente, cresce a (o)pressão sobre a sociedade civil organizada e as universidades. No mês de abril, por ex-emplo, os colegiados da administração pública federal cria-dos por decreto foram extintos ou tiveram sua composição modificada, sem que nenhuma justificativa técnica tenha sido disponibilizada ao público. Neste bojo eliminou-se, in-clusive, a Comissão Nacional dos ODS2. O governo também cortou orçamento e tem desqualificado institutos produ-tores de dados que, ao longo de décadas, foram responsáveis por informar e alimentar as políticas nacionais.
A situação é grave e, com menos transparência e es-paços de diálogo, a tendência de judicialização se firma como estratégia para garantir direitos, na tentativa de proteger profissionais da imprensa e defensores(as) de direitos, de bar-rar violações nos territórios indígenas e de impedir ataques às áreas de conservação. No entanto, este não é um caminho fácil. Como mostra a análise sobre o ODS 16, nossa ‘justiça’ é desigual, mantém uma cultura de privilégios e enfrenta denúncias de parcialidade em julgamentos que fragilizam ainda mais a confiança da população em sua efetividade3.
Com a manutenção das antigas e a criação de novas políticas contrárias à Agenda 2030, o Relatório Luz 2019 apresenta um Brasil que se afasta de um futuro sustentável, o que exige forte atuação das instituições fiscalizadoras na-cionais e alinhamento dos governos locais e do parlamento aos ODS. Juntos, eles têm papéis decisivos para institucio-nalização de um desenvolvimento centrado nas pessoas e sensível ao meio ambiente, de um crescimento econômico inclusivo e sustentável, territorializando políticas pautadas pela Constituição Federal. Juntos eles podem atuar para ga-rantir o respeito à nossa diversa e plural população, princi-palmente das pessoas mais pobres, à margem da sociedade e já esquecidas pelo Estado.
Para reverter a tendência de aumento das desigual-dades e das violências que os dados oficiais aqui indicam, é necessário que as autoridades do Brasil respeitem as leis, as responsabilidades de suas funções e respeitem a história do país ao qual servem. A paz, a equidade de gênero e raça e o desenvolvimento sustentável, tão essenciais para nos-so futuro, são mais que nunca, demandas urgentes para o Brasil. Mas, somente será possível de fato sanar a pobre-za, a fome, o trabalho não-digno, incluindo o trabalho e exploração infantil, a emergência climática, por exemplo, com a participação das juventudes, das populações afeta-das pelos problemas e das organizações da sociedade civil, na definição das soluções.
Tais transformações são possíveis e esperamos que as mais de 150 recomendações apresentadas neste RL 2019 contribuam para construção desse país próspero e pacífico, que queremos ter no presente e no futuro. Por isso, nós que fazemos o GT Agenda 2030 agradecemos às nossas parce-rias e apoiadores, reafirmando que seguimos junt@s e in-cansáveis na defesa da justiça socioambiental, da democra-cia e de um Brasil verdadeiramente sustentável.
Alessandra Nilo
(Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero)
Carolina Mattar
(IDS – Instituto Democracia e Sustentabilidade)
Co-facilitadoras do GT Agenda 2030