Imagens que mostram crianças com rostos pintados de preto em escola são criticadas, no RJ

Imagens de duas atividades promovidas dentro de uma escola em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, por conta do Dia da Consciência Negra, comemorado nesta segunda-feira (20), viralizaram na internet e estão sendo criticadas por diversas pessoas. O motivo é o uso da técnica “blackface”, quando é usada tinta no rosto para imitar a pele negra.

Por Ana Clara Veloso, do Extra 

Criança negra foi pintada Foto: Reprodução/Facebook

Na primeira imagem, três alunas aparecem com um painel ao fundo, escrito “Menina bonita do laço de fita”, título de um livro de Ana Maria Machado. No centro, uma menina branca está com o rosto pintado. Na segunda foto, que foi mais divulgada — uma das publicações tem mais de 1 mil compartilhamentos —, um grupo aponta para uma criança negra, também com tinta no rosto, em frente ao título “O cabelo de Lelê”, livro escrito por Valéria Belém. As duas histórias encenadas abordam a valorização da beleza negra, embora o “blackface” tenha raízes justamente opostas.

A dona da escola Telma Corrêa Dantas considerou um “grande erro” a repercussão nas redes.

— Foi uma atividade em aula, mas os detalhes eu não sei, pois a orientadora pedagógica está viajando. Nós entramos em contato com ela, prestará esclarecimentos na terça-feira, na página (do Facebook) da escola. Nossa escola existe há quase 20 anos e a gente nunca teve problema nenhum. Os pais todos apoiam muito a escola, nossa escola é uma escolinha de bairro, que vai até o Ensino Fundamental I. Está havendo um grande erro por parte das pessoas, pois não nos conhecem — afirma Telma, que diz estar recebendo apoio dos pais dos alunos: — Estão entrando em contato para falar, nos defender, pois é uma grande calúnia. Inclusive, a mãe da menina (negra) que está na foto é nossa amiga particular, nos conhece há anos, desde que a escola abriu. A filha mais velha já estudou aqui. Então, as pessoas entenderam de forma errada e não nos procurou para perguntar, nos dar direito de defesa. Mas estaremos esclarecendo tudo isso na terça-feira, se Deus quiser.

Pesquisadora de questões raciais, Joice Berth vê situações como essa se repetirem muito ainda. Para ela, as pessoas “ainda não entenderam que não precisam pintar ninguém de preto”. E explica a razão da técnica de pintura de rostos ser condenada pelo movimento negro.

Criança branca foi pintada Foto: Reprodução/Facebook

— Eu acho que é interessante e legal ter essa motivação de discutir questões raciais dentro da escola. Os professores são fundamentais na luta antirracismo. Fico feliz quando vejo esse esforço. Mas eles precisam se inteirar do assunto e ouvir o movimento negro para que esse tipo de equívoco não ocorra. Existe um histórico de desumanização da figura da pessoa negra e uma das técnicas é justamente fazer uma caricatura, forçando os traços, pintando com tinta preta, usando bombril no lugar do cabelo — afirma Joice.

Ela lembra que para não contratar pessoas negras, redes de televisão chegaram a pintar brancos com tinta preta no início das produções.

— Nas primeiras novelas, ao invés de usar um ator negro, pintavam um branco, colocavam algodão no nariz para aumentá-lo. Isso é extremamente desumanizador — continua ela, fazendo o paralelo com a atividade escolar: — Se existe uma criança negra na turma, ela não precisa ser pintada. E se não existe, as crianças brancas têm que desenvolver a empatia com as pessoas negras sem ter que usar essa técnica historicamente racista. Pois recorrer a ela é como continuar com o hábito da distorção da pessoa negra. É preciso buscar informação, tentar compreender e se colocar no lugar.

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