José Maurício Nunes Garcia Júnior: presença negra na medicina do RJ imperial

Conheça a história do negro formado médico em 1831 e foi patrono da Academia Nacional de Medicina (1836)

Por Solange Rocha e Antonio Novaes, Do Brasil de Fato

Foto antiga, em preto e branco, de José Mauricio Nunes Garcia Júnior- homem negro, de pouca barba- sentado em uma cadeira
(Foto: Imagem retirada do site Brasil de Fato)

Intelectuais negr@s existiram no período da escravidão no Brasil? Afinal, sempre aprendemos que pessoas negras eram escravizadas, sem ou com baixa capacidade intelectual. Felizmente, estudos produzidos nas universidades têm mostrado muitas histórias de mulheres e homens que conseguiram superar a sua condição de escravizado, tornando-se liberto, vivenciaram uma ascensão social e puderam ocupar algum espaço de destaque na sociedade escravista. Destacamos que a marca do Brasil escravista era a hierarquia, exploração e dominação da maioria da gente negra e poucos conseguiram romper com as barreiras jurídicas e sociais.

Entre os que ultrapassaram os limites da escravidão destacamos membros da família Nunes Garcia, em especial José Mauricio Nunes Garcia Júnior (1808-1884) que se formou médico pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, então capital do Brasil, no ano de 1831. Segundo dados organizados por F. C. Lange (1950) e da Academia Nacional de Medicina, Nunes Garcia Júnior se destacou na profissão, tanto como professor da mesma Faculdade em que se formou, no período de 1839 a 1857, como patrono da Academia Nacional de Medicina (1836) e recebeu homenagens pelo seu intenso combate à uma terrível doença da época, a febre amarela. Entre seus escritos, formados por artigos em jornais e o livro “Curso Elementar de Anatomia ou Lições de Antropometria” (1855).

Importa salientar que Nunes Garcia Júnior era filho de um famoso padre e músico do qual herdou o nome e também aprendeu as primeiras letras. Seu pai, José Maurício Nunes Garcia (1767-1830) teve cinco filhos com sua mãe, Severianna Rozza de Castro, parda e livre. Em dados sobre seu parentesco paternos, ficamos sabendo que seu genitor tinha como pai Apolinário Nunes Garcia, liberto e filho de Ana Correa do Desterro, crioula de Guiné e do lado materno, a liberta Vitória Maria da Cruz (filha de Joana Gonçalves), em Oliveira (2014).

Apesar dessas poucas linhas sobre a família Nunes Garcia, procuramos mostrar que pessoas negras que viveram em diferentes períodos da escravidão, na colônia e no império brasileiro, buscaram caminhos de socialização – família, educação, igreja, etc. – e conseguiram conquistar algum espaço social para o seu desenvolvimento de suas capacidades intelectuais. Para conhecer mais sobre intelectuais negr@s indicamos a leitura do Dossiê Intelectuais Negros e Negras, organizado por Petrônio Domingues e Flávio Gomes (Revista ABPN, 2018), livro organizado por Ana Flávia M. Pinto e Sidney Chalhoub (Pensadores Negros, Pensadoras Negras, 2016), entre outros.

Referências

APONTAMENTOS BIOGRÁFICOS de Jozé Maurício Nunes Garcia Júnior, com notas de LANGE, Francisco Curt. Estúdios Brasileños. Revista de Estúdios Musicales, n. 1-3, p. 176-9, 1950. Disponível: http://www.josemauricio.com.br/pdfs/em_p_JMNGJr_apontamentos.pdf . Acesso em: 13 set. 2019.

Página da Academia Nacional de Medicina. Disponível – http://www.anm.org.br/conteudo_view.asp?id=1772&descricao=Jos%C3%A9+Mauricio+Nunes+Garcia+Junior . Acesso em: 13 set. 2019.

OLIVEIRA, Anderson J. M. Trajetórias de clérigos de cor na América Portuguesa:Catolicismo, hierarquias e mobilidade. Andes, v. 25, junio, 2014. Disponível:https://www.redalyc.org/pdf/127/12735596002.pdf?fbclid=IwAR0ihjP4dL2kzo1G9La1uTYFLntWRDTHoOm5wxrCgyMwoddoVDBruAk_Y7c. Acesso em: 13 set. 2019.

+ sobre o tema

Nath Finanças entra para lista dos 100 afrodescendentes mais influentes do mundo

A empresária e influencer Nathalia Rodrigues de Oliveira, a...

Ministério da Igualdade Racial lidera ações do governo brasileiro no Fórum Permanente de Afrodescendentes da ONU

Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, está na 3a sessão do...

Crianças do Complexo da Maré relatam violência policial

“Um dia deu correria durante uma festa, minha amiga...

Concurso unificado: saiba o que o candidato pode e não pode levar

A 20 dias da realização do Concurso Público Nacional...

para lembrar

A Medicina USP Ribeirão já formou Sócrates, hoje formará misóginos, racistas e estupradores?

Sócrates foi um jogador talentoso, no panteão dos melhores do...

O Blackface e a questão racial: reflexões sobre um debate na Unicamp

Embora, sejam minorias, há negros hoje nos teatros brasileiros,...

A polêmica racista

A gritaria sobre os “comitês raciais” revela a disposição...
spot_imgspot_img

Conversas sobre o luto: quando uma mãe preta retorna ao mundo das encantadas

O encantamento é uma das principais heranças deixadas por África no coração dos africanos do solo ancestral e na diáspora. Trata-se de uma atitude...

De mal a pior

Todo ano a mesma chuva. Certas como a morte — não raro, trazendo-a — são as tempestades de verão no Rio de Janeiro. E,...

Retrospectiva Negra de 2023

Começamos o ano de 2023 recuperando a esperança em avanços na área de direitos humanos. Depois de quatro anos de conservadorismo opressor, negacionismo científico,...
-+=