Justiça arquiva ação que julga PM acusado da morte de menino Eduardo

Crime aconteceu durante operação no Complexo do Alemão em abril de 2015

Por Antônio Werneck, Carina Bacelar Do O Globo

Foto: Geledés

Os desembargadores da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio, decidiram, por dois votos a um, arquivar a ação penal que acusa o policial militar Rafael de Freitas Monteiro de ser autor do tiro que matou o menino Eduardo de Jesus Ferreira, de 10 anos, no dia 2 de abril de 2015. Estudante do Ciep Maestro Francisco Mignone, em Olaria, a criança foi atingida na cabeça por uma bala de fuzil quando brincava na porta de sua casa, no Complexo do Alemão, com um celular. O PM foi denunciado em novembro de 2015 por homicídio simples.

A ação criminal estava em andamento na 4ª Vara Criminal, mas, como trancamento, o processo fica suspenso. Ainda cabe, entretanto, recurso do Ministério Público Estadual em instância

Policiais militares lotados na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) do Alemão, com apoio de policiais do Batalhão do Choque, realizavam uma operação no Complexo do Alemão. Os policiais alegam que o menino foi atingido durante troca de tiros com traficantes. Parentes de Eduardo negam. Segundo eles disseram que não haviam traficantes no local e que os policiais confundiram o celular que o menino brincava com uma arma. Depois que Eduardo foi atingido, moradores disseram que os policiais recolheram as capsulas do local.

A decisão dos dois desembargadores surpreendeu parentes do menino:

— Isso é um grande absurdo. Todos nós ficamos desolados. Meu filho estava na porta de casa brincando quando uma bala atingiu sua cabeça. Um tiro dado pelos policiais. Então não posso entender como a Justiça agora quer cancelar tudo. Estou muito triste, mas enquanto tiver vida vou lutar por Justiça. Para que os responsáveis paguem — afirmou Terezinha de Jesus, de 40 anos, mãe de Eduardo, que precisou se mudar do Complexo do Alemão temendo retaliações da PM. — Já são quase dois anos de luta, desde a morte do meu filho. Tenho muitos pesadelos e choro muito. Às vezes acordo pensando que meu filho está vivo, dormindo ao meu lado. Não sei o que vou fazer se ninguém pagar pelo que fizeram ao meu menino.

Na semana passada, a relatora do processo na 2ª Câmara Criminal, desembargadora Rosa Helena Penna Macedo Guita, aceitou os argumentos da defesa e foi favorável ao trancamento (encerramento) da ação. Seu voto foi seguido pelo desembargador Flávio Marcelo de Azevedo Horta Fernandes. Os dois consideraram que não há justa causa para o prosseguimento da ação, alegando ausência de conjunto mínimo de provas para a ação penal. A sessão acabou suspensa em razão do pedido de vista do desembargador Paulo de Tarso Neves. O julgamento foi retomado nesta terça-feira. Paulo de Tarso foi o único dos três desembargadores que votou contra o trancamento do processo.

A Anistia Internacional, por meio de nota, condenou a decisão dos desembargadores. O organismo internacional também criou um link para pressionar o Ministério Público a recorrer da decisão judicial. Renata Neder, assessora de direitos humanos da Anistia Internacional, disse que a decisão “é grave”:

— A decisão é grave e por isso a gente acabou de soltar uma ação de mobilização pedindo justiça pelo caso do Eduardo. A Anistia acompanha esse caso desde o inicio e é um dos casos que está documentado no relatório “Você matou meu filho”, que lançamos em agosto do ano passado. Em resumo, você tinha um menino de dez anos desarmado, na porta de sua casa, esperando a irmã chegar. Não havia tiroteio. Os policiais entram na rua, atiram, o Eduardo é atingido na cabeça e morre. Os policiais ainda tentaram alterar a cena do crime, impedindo que a perícia fosse feita. Uma morte dessa forma não pode ser considerada legítima defesa. E a sociedade brasileira aceitar que isso pode ser considerado legitima defesa, isso vai virar uma licença para a polícia matar em qualquer circunstância. É inaceitável.

O advogado de defesa do PM, Rafael Abreu Calheiros, disse que seu cliente, após ser transferido de unidade, não deixou de atuar como policial militar, mesmo respondendo ao processo. A alegação da defesa, segundo ele, é que a ação penal era “infundada”:

A defesa alega que é uma ação infundada. Não houve fundamentação suficiente pra fazer uma acusação dentro da lei. A parte técnica foi toda provada. A defesa da mãe do menino estava dizendo que não houve confronto, e foi provado que houve confronto. Não foi provado que foi do fuzil do policial (que partiu o tiro). A dinâmica do tiro poderia ter sido de uma pistola de 9mm de curta distancia que faria o mesmo estrago que um fuzil. As provas foram todas colocadas a favor do meu cliente — argumenta Calheiros.

 

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