Justiça de SP ouve aluno da FGV que chamou colega negro de ‘escravo’

O jovem é réu pelos crimes de injúria racial e racismo. Caso aconteceu em março de 2018.

Por Beatriz Borges, do G1

Foto compartilhada por aluno da FGV; ele foi acusado de racismo e suspenso da faculdade — Foto: Reprodução/Redes sociais

A Justiça de São Paulo deve ouvir nesta segunda-feira (16) o jovem que tirou uma foto de um colega negro da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e compartilhou em um grupo de WhatsApp com a frase: “Achei esse escravo no fumódromo, como o G1 revelou. Quem for o dono avisa!”. Ele é acusado pelos crimes de injúria racial e racismo.

O caso aconteceu em março de 2018. Na época, o autor da postagem, Gustavo Metropolo, era aluno do 4º semestre do curso de Administração de Empresas da FGV. Ele chegou a ser a ser suspenso da faculdade por três meses.

O G1 não conseguiu localizar a defesa de Metropolo para comentar o assunto.

A vítima, João Gilberto Lima, também era aluno da instituição e foi informado sobre a publicação através da coordenação do seu curso (Administração Pública). O aluno registrou um boletim de ocorrência por injúria racial no 4º Distrito Policial da Consolação, na região central de São Paulo.

“A importância de um caso como esse é estimular as pessoas a irem atrás de fazer a denúncia. Como eu falo, é algo recorrente que acontece bastante no Brasil tanto que a mídia agora está trazendo à tona. É importante as pessoas não ficarem caladas e buscarem os seus direitos, é o que fica. Eu não tenho pretensão de acabar com o racismo, infelizmente, eu não tenho esse poder de acabar com o racismo, de acabar com o preconceito em si. Racismo não é mais brincadeira, racismo é um crime”, disse ele em entrevista ao G1.

O estudante disse ainda que recebeu muito apoio dos colegas e amigos. “Eu continuei cursando eu tive bastante apoio, principalmente, do coletivo, do diretório acadêmico e outras entidades que também me deram apoio, além da coordenação do meu curso que é administração pública”, disse.

Na ocasião, a FGV enviou uma nota em que afirmou que ante “possível conotação racista da ofensa” “aplicou severa punição ao ofensor, que foi suspenso por três meses”. A Faculdade não quis se manifestar.

A Polícia Civil indiciou o autor da publicação pelo crime de racismo e injúria racial. Na visão do DHPP (Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa) a publicação não atingiu apenas João Gilberto, mas toda população negra, por isso, o crime de racismo.O Ministério Público também ofereceu denúncia acusando o jovem de ambos os crimes.

O entendimento da promotora Luciana Frugiuele é de que, por ter praticado a discriminação em um grupo de WhatsApp, o acusado cometeu os dois crimes: racismo por meios de comunicação social e injúria racial. De acordo com a denúncia, o autor da publicação praticou racismo, pois praticou o preconceito e discriminação contra a raça negra e injúria racial, pois ofendeu a honra subjetiva de João Gilberto Lima.

Em maio do ano passado, a Justiça de SP aceitou a denúncia do MP-SP e o autor da publicação virou réu por ambos os crimes. Caso seja condenado, a pena de reclusão pode chegar a cinco anos.

“Eu estou tranquilo e um pouco aliviado que está se encaminhando para um desfecho. Provavelmente, ainda vamos esperar outra decisão mais para frente, mas pelo menos nessa primeira instância”, disse João Gilberto sobre o julgamento.

Outro caso

Em março de 2017, alunos da FGV denunciaram professores de economia e administração por declarações racistas e machistas durante as aulas. Segundo o Diretório Acadêmico, uma comissão de ética da coordenadoria da faculdade foi aberta para apurar as denúncias e definir punição para os docentes.

Em um grupo do Facebook exclusivo para alunos da FGV, uma aluna relatou que um professor declarou que “mulher só faz o trabalho quando enche ela de porrada. Não tem que tratar mulher com beijo e mimimi! Tem que tratar com tapa, tem que mostrar que quem manda é o homem”. O texto, postado em 8 de março, Dia Internacional da Mulher, termina com a aluna dizendo que as palavras foram “proferidas a risos por um professor da EAESP [Escola de Administração de Empresas] Feliz Dia das Mulheres!”

Na ocasião, a FGV afirmou que disse desconhecer as postagens com denúncias de alunos, mas que “rechaça qualquer tipo de discriminação ou preconceito”. A instituição informou, ainda, que “em nenhum momento foram formalizados [pedidos para apurar denúncias], oficialmente, perante a direção da instituição”. “Por outro lado, a opinião pessoal divulgada em redes sociais, através de canais particulares, é de exclusiva responsabilidade de seus autores, não podendo ser atribuída à FGV”, declara a instituição na nota.

 

 

Leia também:

FGV suspende aluno por 3 meses após ofensa racista

“Não temos dono”: Estudantes da FGV pedem expulsão de aluno que chamou colega de “escravo”

Alunos denunciam professores da FGV por declarações racistas e machistas

Discriminação racial em evento esportivo motiva nota de repúdio da FGV

+ sobre o tema

Versace processada por preconceito racial

Um ex-funcionário de uma loja outlet da Versace em...

Campanha por uma infância sem racismo é premiada em Cannes

A campanha sobre os impactos do racismo na infância,...

Violência Policial: A história se repete, até quando?

Morrem mais de 42 mil pessoas assassinadas por ano...

para lembrar

Douglas Silva revê sua trajetória

Depois de integrar o elenco de 'Cidade de Deus',...

Escalação de atores negros em “Jogos Vorazes” causa polêmica

  Volta e meia isso aparece internet afora....
spot_imgspot_img

Brasil: Relatório sobre Justiça Racial na Aplicação da Lei

Este relatório contém as conclusões do Mecanismo Internacional de Especialistas Independentes para o Avanço da Igualdade e Justiça Racial na Aplicação da Lei (EMLER,...

Jovens negros carregam traumas de reconhecimento fotográfico injusto

Em 2018, o porteiro Carlos Alexandre Hidalgo foi a uma delegacia para registrar um boletim de ocorrência por conta de um crime virtual que...

Casos de racismo aumentaram no futebol brasileiro; veja relatório

O Observatório da Discriminação Racial no Futebol divulgou nesta quinta-feira (26) o 10º Relatório da Discriminação Racial no Futebol, que é baseado em dados de 2023....
-+=