Não há razão alguma em segurança pública para que Herus Guimarães Mendes, um office boy de 23 anos, pai de uma criança de dois anos, tenha sido executado com uma bala na barriga enquanto estava cometendo o (inexistente) crime de frequentar uma festa junina em Santo Amaro, região central do Rio de Janeiro.
Ninguém mais está seguro quando o Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), sob o comando do governador do Rio, Claudio Castro (PL), se sente autorizado a invadir atirando uma festa comunitária cheia de crianças.
Chamar o assassinato de Herus Mendes de morte em decorrência de intervenção policial é um eufemismo que mascara a realidade: trata-se de se um caso de execução extrajudicial, por agentes estatais armados que se sentem investidos de autoridade para matar. O que se seguiu à dita operação policial —o espetáculo macabro de entrar atirando em uma festa— foi o protocolo padrão da impunidade. A Polícia Militar justificou o ato por conta da “presença de diversos criminosos fortemente armados”, sem sentir que precisasse provar quais seriam estes (e mesmo se houvesse esperava-se que a polícia fosse menos amadora, porque não há pena sumária de morte).
A resposta político-judicial, a princípio, pareceu mais incisiva; apenas a princípio. Castro exonerou os comandantes das operações especiais e afastou policiais envolvidos no ato; e o Ministério Público do RJ iniciou investigação sobre o ocorrido. Deve-se olhar essa resposta com ceticismo. É comum que policiais sejam afastados até a poeira baixar, sem real responsabilização, e o MP-RJ, até ontem (fevereiro de 2025), sequer contava com um grupo de controle externo da atividade policial, sua função constitucional.
Em São Paulo a realidade é similar: o jornal Metrópoles mostrou que, em 2024, 85 vítimas letais da PM estavam sem arma de fogo e 47 foram baleadas pelas costas. Herus Mendes foi executado por uma política da morte que se sente autorizada a matar sem justificar e ainda amedronta, com tiros para o alto, quem ousa reclamar que está sendo executado em praça pública.
Thiago Amparo – Advogado, é professor de direito internacional e direitos humanos na FGV Direito SP. Doutor pela Central European University (Budapeste), escreve sobre direitos e discriminação