Por Cidinha da Silva
O advogado de defesa do réu confesso empenha-se em provar sua culpa. Parece confuso, mas é só aparência. A intenção é transparente. Em uma “torcida organizada”, tudo é possível!
O acusado é menor de idade, tem 17 anos e se auto-declarou culpado, exclusivamente culpado, no caso da morte do adolescente boliviano, Kevin Espada, vítima do disparo de um sinalizador marítimo, originado na torcida do Corinthians em jogo da Libertadores. Brasil e Bolívia têm acordo de extradição em casos de investigação policial, mas isso não se aplica a menores, é tema sob o guarda-chuva da ONU. A cena parece estar montada para sacrifício de um bode expiatório. No crime organizado é comum que laranjas sejam escolhidas para assumir determinadas culpas, por terem infligido alguma norma da ética criminal, por deverem algum favor para os chefes, e nessa toada conseguem preservar a própria vida.
Na Bolívia, dos 12 torcedores suspeitos e presos, quatro tinham sinais de pólvora nas mãos. Foram apreendidas outras mochilas com artefatos mortíferos, além daquela supostamente abandonada pelo garoto acusado nas arquibancadas. Foram vários os sinalizadores disparados e um deles atingiu Kevin Espada de maneira letal. Os deuses Aimará devem ter impedido uma tragédia de proporções maiores.
O ex-jogador Casagrande foi muito feliz ao lembrar que as pessoas gostam de tratar o que acontece no futebol e em torno dele como algo especial, singular, e não se trata disso. O mundo do futebol, como qualquer outro braço do negócio do entretenimento deve estar submetido às leis que organizam a sociedade como um todo.
A justiça se encarregará de definir a natureza do homicídio (culposo, doloso), mas houve um homicídio, fato cabal, e existem leis para puni-lo. Este é o aspecto criminal do episódio. O homicídio ocorreu entre torcedores de futebol, durante uma competição esportiva, logo, os envolvidos no espetáculo (torcida, time da torcida agressora e responsáveis pela segurança do estádio e controle de multidões) devem ser investigados e punidos. Há que haver responsabilização pela morte de Kevin também no plano desportivo, sob pena de banalizar mortes evitáveis e passíveis de prevenção como “fatalidade.” E a OAB deverá investigar esse advogado de defesa devotado a provar a culpa do cliente.