Lima Barreto: um gênio negro e o reconhecimento tardio – Por Davi Nunes

 

Por Davi Nunes Do Portal Sotero Preta

No próximo ano, 2017, Lima Barreto será homenageado na 15ª Festa Literária Internacional de Paraty, que acontecerá entre 26 e 30 de Julho. É uma homenagem tardia ao autor, mas necessária, pois ele só teve a sua obra minimamente reconhecida 30 anos após o seu falecimento e foi totalmente, em vida, destroçado pela crítica, cujo viés teórico fora sempre racista.

Lima Barreto (1881-1922) escritor brasileiro, nascido no Rio de Janeiro, tendo o subúrbio da cidade como cartografia afetiva, escreveu em sua obra póstuma, Diário Íntimo, publicada em 1953, o plano de um romance que dá conta de sua genialidade e afrocentricidade latentes como elemento, signo para criar uma obra prima, segundo o autor.

“Veio-me à ideia, ou antes, registro aqui uma ideia que me está perseguindo. Pretendo fazer um romance em que se descrevam a vida e o trabalho dos negros numa fazenda. Será uma espécie de Germinal negro, com mais psicologia especial e maior sopro de epopeia. Animará um drama sombrio, trágico e misterioso, como os do tempo da escravidão.Como exija pesquisa variada de impressões e eu queira que esse livro seja, se eu puder ter uma, a minha obra-prima, adiá-lo-ei para mais tarde.”

O autor estava com apenas 23 anos quando traçou essas linhas. O jovem Lima tinha a mania de escrever para si no futuro, isto é, mais velho com 30, 40, 50 anos. Sabemos que ele morreu com 41 anos e não conseguiu por em prática a escrita dessa obra idealizada, visto que o racismo estrutural da sociedade brasileira o adoeceu, levou-o á loucura etílica e muitas internações no hospício, o que entravou a sua glória em vida.

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No entanto, Lima Barreto conseguiu realizar e publicar outras obras geniais e destaco aqui Recordações do Escrivão Isaías Caminha, pois nesse romance ele faz uma crítica ferrenha, cheio de sarcasmo, sátira e ironia aos jornalistas, críticos literários, à elite intelectual branca, que o escritor via como medíocres e “pomposos” racistas.

Depois desse romance publicado, ele recebeu muitas críticas: desde contestarem a qualidade literária, de chamarem de mau panfleto sua obra, até de tentarem colocá-lo num lugar intelectualmente inferior por ser negro.

Tática usual que os intelectuais brancos utilizam até hoje para desprestigiar, desclassificar e não premiar as obras escritas por escritores e escritoras negros no Brasil.

Um gênio que viveu o underground da sua época no Rio de Janeiro. Era visto como boêmio, louco, anarquista que perambulava o centro do Rio de Janeiro, bebendo e ironizando as rodinhas intelectuais da época – homens de óculos e bigodes.

Fico imaginando o que ele diria da crítica atual, das festas literárias e academias semelhantes às do seu tempo, penso que seria: “são os mesmos, mesma tez de bico de tucano, mesmo eurocentrismo desenxovado e atrasado; mesmo racismo, mas que agora não tem mais como impedir o meu gênio”. Depois disso, imagino-o tomando uma boa Paratiana e dizendo: axé.

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