No intuito de conhecer melhor os alunos, uma professora norte-americana pediu que eles respondessem o que gostariam que ela soubesse. O resultado deste trabalho foi divulgado na edição de 17 de abril do jornal O Globo.
Por Luana Tolentino via Guest Post para o Portal Geledés
Há alguns dias, realizei a mesma experiência com alunos do 7º ano (11/12 anos), na escola em que trabalho, localizada em um dos municípios mais pobres da região metropolitana de Belo Horizonte/MG.
As respostas reforçaram a minha crença de que é necessário re-pensar a escola e propor algo que vá além do modelo homogeneizante vigente, que desconsidera os saberes, as habilidades e a trajetória de cada estudante. Tomando de empréstimo as palavras da intelectual e ativista negra norte-americana Bell Hooks, é necessário estar atento ao valor de cada voz individual. Ouvi-los é um exercício de reconhecimento, imprescindível na construção do saber.
Essa mudança somente será possível quando nós professores e toda comunidade escolar tivermos consciência de que mesmo com as políticas de universalização do acesso à educação, o ambiente escolar ainda é um espaço de exclusão e opressão. O que precisa ser mudado urgentemente.
Eu gostaria que a minha professora soubesse…
“Que eu fiquei muito triste quando os meus dois irmãos foram presos, e também quando a minha mãe se separou do meu padrasto. Porque ele não era só um padrasto pra mim, ele era um pai também.”
“Que eu sou um aluno dedicado, um aluno exemplar. O aluno que toda sala queria ter.”
“Que uma das coisas boas da minha vida foi quando o meu pai achou uma mulher bem legal comigo e com o meu irmão. Ela é uma boa madrasta. O nome dela é Valéria.”
“Que eu tenho um irmão deficiente. Ele não anda, nem fala. Mas eu amo ele mesmo assim.”
“Que a minha irmã Sheila morre de inveja de mim só porque sempre que a minha mãe vem na reunião da escola os professores me elogiam, e os professores da Sheila só reclamam dela.”
“Que ela é uma professora legal, nervosa e linda.”
“Que eu estou alegre por fora, mas ninguém sabe a dor que eu sinto por dentro.”
“Que eu gosto dela, não só porque temos o mesmo nome, mas porque ela é divertida, legal e educada.”
“Que o meu pai e a minha mãe estão presos. Minha vó é quem cuida de mim.
Ela é muito trabalhadeira. Quando ela recebe, ela me dá dois reais.”
“Que eu tenho muita dificuldade nas atividades. Ás vezes eu não faço as atividades não é porque eu não quero, mas porque eu não sei.”
“Que eu gosto muito dela, porque ela explica a matéria direito e não grita com os alunos. Até os meninos bagunceiros gostam dela. E também gostaria que ela soubesse que eu fico muito feliz quando ela me dá parabéns no caderno e fala que eu sou linda e inteligente.”
“Que eu sou inteligente, esperta e corajosa.”
“Que eu bagunço e atrapalho, mas sou uma ótima aluna.”
“Que o meu aniversário de cinco anos foi muito legal! Eu pude escolher meu bolo e a cor dos balões, Minha avó e o meu avô ficaram muito felizes, porque nesse dia todos os filhos foram na casa deles.”
“Que o meu sonho é que a minha mãe parasse de beber e voltasse para casa.”
“Que ela é uma ótima professora. Que ela é um exemplo de vida para todos
nós.”
“Que eu sou um garoto com o coração de ouro.”
“Que eu amo muito o meu irmão e espero que ele não passe pelas coisas que eu passei nessa vida, como sofrimentos, corpo roxo, palavras que machucam e falta de carinho.”
Luana Tolentino é Professora e Historiadora. É ativista dos movimentos Negro e Feminista.