Morre, aos 73 anos, o professor de literatura José Roberto da Silva

“Ei, você já sorriu hoje?”. Era assim que o professor de literatura José Roberto da Silva, ou apenas Zé, recepcionava os alunos, e é essa a lembrança que ele vai deixar em familiares, amigos e alunos. O docente morreu na noite de quinta-feira (26/7), em decorrência de um acidente vascular cerebral (AVC) sofrido em janeiro de 2016. Desde abril, após uma crise de convulsão, precisou ser internado na unidade de terapia intensiva de um hospital particular de Brasília.

Nascido na Bahia, em 1945, foi criado no Rio de Janeiro e veio para Brasília na década de 1960. Zé se formou em Letras pela Universidade de Brasília (UnB) e trabalhou em escolas como Notre Dame, Visão e diversos cursos pré-vestibulares. Ele deixa um casal de filhos, uma neta, amigos e incontáveis alunos. José Roberto militava pela valorização da cultura afro-brasileira e era apaixonado pelo escritor Guimarães Rosa.

O amigo de longa data, professor de história Erik Surjan, 37 anos, trabalhou com Zé em colégios e pré-vestibulares de Brasília. Desde 2009, os dois dividiam as salas de aula, mas foi em 2000 que Erik teve o primeiro contato com Zé. “Ele me deu aula. A literatura era o seu forte e as aulas que ele ministrava eram as mais fantásticas que existiam”, destaca.

Ele lembra ainda que o amigo era sinônimo de simpatia e de simplicidade. “A gente ia para o bar juntos, visitava um a casa do outro. O Zé ensinava todo mundo a como se tornar uma pessoa humilde”, relembra Erik.

O professor de educação física Charles Soares Pereira, 41, também trabalhou com Zé. Eles realizavam eventos multidisciplinares. “Eu era professor de capoeira, então a gente fazia batizados de dentro dos eventos relacionados à consciência negra”, lembra.

A amizade dos dois também saiu do espaço de trabalho e ganhou a vida íntima. “Ele frequentava a minha casa, a gente fazia churrasco e conversávamos muito. Vou sempre me lembrar dele como uma pessoa de muita sabedoria. Ele era único.”

Valorização do aluno

A estudante Marjorie Beatriz Alves de Sousa Melo, 19, teve aula com Zé Roberto de 2014 a 2015, no Sigma. Ela lembra com carinho dos projetos que o professor realizava. “Ele queria sempre que os alunos dessem o melhor de si como seres humanos. Ele prezava pelo amor e a valorização da cultura negra”, recorda. Marjorie destaca ainda características marcantes de Zé. “Na verdade, ele não foi só um professor, ele enxergava além e valorizava o aluno”, relata.

O estudante de medicina Jônatas Ferreira de Barros, 19, estudou com o professor em 2014, quando cursava o 2º ano do ensino médio. “Ele era uma pessoa além do tempo dele”, destaca.

Jônatas lembra que Zé foi um dos únicos professores negros que ele teve. “Sempre me incentiva e se empenhava em saber como estava o aluno. Ele é um personagem que vai ficar em história”, relata.

A última escola onde o docente trabalhou foi o Colégio Visão. Ele estava afastado do trabalho em decorrência da saúde fragilizada. Em nota, a instituição diz que ele deixa um legado na educação brasiliense e na literatura. “O colégio se solidariza com os familiares e amigos que hoje sentem esta tão grande perda”, diz a nota.

O velório do professor será no sábado (28/7), às 14h30, e o sepultamento, às 15h30, no cemitério Campo da Esperança, na Asa Sul), Capela 3.

* Estagiária sob supervisão de Mariana Niederauer 

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