Policiais serão indiciados, e população comemora; testemunha de detenção acusa polícia de forjar relatório sobre morte
Do O Globo
BALTIMORE – Quatro dias após o início da série de protestos mais dura nos EUA desde os anos 1960, a promotora Marilyn Mosby afirmou que a morte do jovem negro Freddie Gray foi um homicídio. Os policiais Brian Rice, Alicia White, William Porter, Garrett Miller, Edward Nero e Caesar Goodson serão indiciados por crimes como homicídio, agressão, má conduta e negligência. Eles tiveram pedido de prisão emitido.
— Os policiais responsáveis pela detenção de Freddie Gray não deram uma causa provável para a detenção de Gray. Ele foi ilegalmente apreendido. De qualquer maneira, deveriam cuidar de sua integridade. Mesmo informados de que ele estava ferido e precisava de cuidados médicos urgentes, nada foi feito — declarou a promotora estadual em coletiva. — Ele não respirava mais após o choque, e teve uma parada cardíaca. Foi uma grave negligência.
Outras acusações recaem sobre Caesar Goodson, o motorista da van. Ele foi considerado negligente em sua ação no comando do veículo, além de não ajustá-lo corretamente — ele é acusado de homicídio com dolo eventual (segundo grau, de coração depravado, o que indica intenção de atentar contra a integridade). Já a sargento Alicia White viu o suspeito inconsciente, após ele pedir ajuda médica duas vezes.
Responsável pela investigação independente do caso, Mosby afirmou que houve paradas não relatadas em locais, além de outra detenção efetuada e alegações que não batiam entre os policiais. De acordo com a promotora, houve paradas em seis ocasiões. A autópsia comprovou que a lesão ocorreu por uma pancada dentro do carro.
Mosby alegou que “ouviu os pedidos por justiça e paz”, e fez referência às origens familiares para agradecer pla diminuição na violência dos protestos. Negra, ela tem pais e avós policiais, e garantiu que a conduta dos seis policiais não pode ser “um retrato da corporação”.
— Venho de cinco gerações de policiais, mas às vezes é necessário impedir certas ações, o que vale para qualquer um que tenha ou não tenha uma insígnia no peito — disse ela à CNN.
Confira as acusações:
Barack Obama disse que “o que o povo de Baltimore mais quer é a verdade”. Para isso, ofereceu apoio logístico e afirmou que a nova secretária de Justiça, Loretta Lynch, está em contato com as autoridades locais.
— Estou grato que protestos construtivos e pensativos tenham tomado conta. São chamados claros pela justiça. Quero que nosso sistema legal funcione do jeito ideal. Continuaremos trabalhando com nossos esforços instaurados pós-Ferguson. Queremos restaurar a confiança entre polícia e população, e dar ainda mais esforços para promover maiores oportunidades para os jovens — declarou o presidente.
FESTA E PROTESTOS
As declarações de Mosby foram recebidas com muita festa na comunidade local, e muitos consideraram inesparada a declaração rápida. A CNN flagrou, minutos após o anúncio, um buzinaço perto do tribunal local.
— Me chamavam de patriota quando eu estava na Marinha, mas agora somos malditos bandidos? — gritou um morador local em direção a policiais montando guarda, pedindo que os protestos não parem até o caso ser julgado e os policiais do caso Gray acabarem condenados.
Gray sofreu uma pancada que resultou em uma lesão vertebral que o deixou em estado grave. Uma semana depois, morreu após uma cirurgia não conseguir ajudá-lo. Após seu funeral, na segunda-feira, manifestações, quebra-quebras e revoltas marcaram a cidade de Baltimore e outras, em crítica à discriminação racial aplicada pela polícia.
Novos protestos continuaram na quinta-feira, a quarta noite de manifestações em Baltimore. Desta vez, menos de 300 pessoas se reuniram na cidade. A Guarda Nacional e policiais muncipais, estaduais e de outros locais dão apoio para conter os ânimos. Mais de 270 já foram presas desde o início das manifestações, que promoveram quebra-quebras e saques no início.
ACUSAÇÃO DE FORJAR RELATÓRIO
O homem que foi detido em 12 de abril junto ao novo símbolo dos protestos contra a discriminação racial pela polícia afirmou que os oficiais mentiram em um relatório sobre sua morte. Num documento obtido pelo jornal “Washington Post”, Donta Allen afirmava que Gray parecia “bater nas paredes da van policial propositadamente para se machucar”. Ele negou.
— Estão tentando fazer parecer que eu disse isso, que Freddie Gray queria se machucar. Por que ele iria fazer isso? Não ouvi praticamente nada, só poucas batidas por uns quatro segundos — contou ele, que ficou separado de Gray por uma chapa de metal. — Isso é homicídio. Eu não trabalho para a polícia, eu não disse nada assim para eles.
Allen foi colocado no veículo 20 minutos após Gray ser detido. Apesar de ter entrado na van em bom estado, o jovem de 25 anos saiu com uma lesão na espinha que levou à sua morte. Segundo fontes policias ouvidas pelo canal ABC7, Gray sofreu um choque de sua cabeça contra um parafuso, o que teria desencadeado uma lesão vertebral que o matou.
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