MPT processa Pernambucanas e pede R$ 5 milhões por exploração de escravos

Autoridades tentaram negociar acordo após a libertação de 16 pessoas, mas empresa se recusou a colaborar

por Bianca Pyl

O Ministério Público do Trabalho (MPT) decidiu processar a Pernambucanas por conta dos dois flagrantes de trabalho escravo em oficinas que costuravam peças para a rede. A cadeia produtiva do grupo foi investigada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) de agosto de 2010 a março de 2011, quando auditores fiscais autuaram a empresa após a constatação de irregularidades graves. Ao todo, 16 trabalhadores foram libertados de condições análogas à escravidão em oficinas que fabricavam roupas de marcas do grupo. Com base na fiscalização, Valdirene Silva Assis, da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região (PRT-2), entrou com uma ação civil pública cobrando na Justiça o pagamento de R$ 5 milhões da Arthur Lundgren Tecidos S/A, nome de registro da Pernambucanas, a título de danos morais coletivos.

Esta é a primeira ação civil pública por trabalho escravo urbano, segundo a procuradora. Ela explica que, antes de decidir processar a Pernambucanas, o MPT tentou negociar a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). De julho do ano passado até o começo do ano, foram realizadas quatro audiências, mas a empresa se recusou a assumir a responsabilidade pela sua cadeia produtiva. “Em outros casos, as empresas aceitaram assinar o acordo, que contém os mesmos termos propostos à Pernambucanas”, explica a procuradora, referindo-se a acordos assinados por empresas como, por exemplo, a Zara. A cadeia produtiva da Pernambucanas conta com aproximadamente 200 fornecedores, segundo o MPT.

A ação foi ajuizada em 20 de janeiro e pede antecipação de tutela, ou seja, determinação judicial para que a Pernambucanas assuma imediatamente a responsabilidade por sua cadeia produtiva e se responsabilize pelo cumprimento das leis trabalhistas na produção das peças que vende. Apesar de o pedido já ter mais de um mês, a tutela ainda não foi apreciada. “Precisamos dar um retorno para a sociedade em relação a esses flagrantes de trabalho escravo. A Pernambucanas imagina se livrar de qualquer responsabilidade trabalhista ao delegar sua produção para terceiros”, defende Valdirene. Se a Justiça concordar com os R$ 5 milhões pedidos por dano moral coletivo, o valor deve ser destinado ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Flagrantes

Nos dois casos de trabalho escravo (em agosto de 2010 e março de 2011) – acompanhados pela Repórter Brasil -, foram encontrados trabalhadores, incluindo dois irmãos com 16 e 17 anos e uma mulher com deficiência cognitiva, em condições análogas à de escravos, a maioria deles vindos da Bolívia. Os grupos estavam costurando peças das marcas Argonaut e Vanguard, que pertencem a Pernambucanas.

Nas oficinas, a fiscalização constatou a degradação do ambiente, jornada exaustiva de trabalho e servidão por dívida, três traços que caracterizam a escravidão contemporânea. Foram constatados também indícios de tráfico de pessoas. Crianças circulavam entre as máquinas enquanto os pais trabalhavam. Em uma das oficinas, na Zona Norte da capital paulista, os trabalhadores não tinham direito a banho quente.

A ação pede que a Pernambucanas seja obrigada a não discriminar trabalhadores em razão de suas origens ou etnias (atitude que motivou um dos autos de infração); a não admitir a submissão a condições análogas à de escravo e degradantes; a garantir que tenham seus contratos de trabalho devidamente registrados em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS); a não admitir o trabalho de pessoas menores de 16 anos e proibir a permanência de crianças nos ambientes de trabalho; e a garantir meio ambiente de trabalho adequado, a segurança e saúde do trabalhador, entre outros prontos.

Responsabilização

Na avaliação dos integrantes da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP) que coordenaram as investigações, a responsabilidade trabalhista é da Pernambucanas. O MTE lavrou 41 autos contra a empresa – cada auto se refere a uma irregularidade constatada.

Na época do flagrante, Luís Alexandre Faria, auditor fiscal que coordenou a operação, disse que a Pernambucanas não pode alegar que apenas vende – e não produz – peças de vestuário. “Os atos diretivos e empresariais são da Pernambucanas. É a empresa que determina a tendência, faz o controle de qualidade de cada peça, estipula o preço e o prazo que as peças devem ser entregues”, acrescentou.

A Repórter Brasil entrou em contato com a Pernambucanas, mas a empresa não se posicionou até o fechamento desta matéria.

 

Fonte: Brasil de Fato

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