Nosso Lar?

Por: Rogério José

 

Fui assistir ao filme “Nosso lar’ e me decepcionei um pouco. Seguindo o clichê da maioria das produções cinematográficas brasileiras, a impressão que tive foi a de um mundo espiritual majoritariamente branco. O filme tem um “q” de Manoel Carlos, pois reproduz mimeticamente a situação do negro no Brasil: apenas alguns negros ascendem espiritualmente (no Brasil seria socialmente).

Nas partes em que a fotografia do filme privilegia multidões, fica explícita a ausência de negros. O mesmo pode ser verificado no núcleo duro de atores do filme, embora o ator negro Rodrigo Santos o integre parcialmente, com algumas falas e aparições ao longo da história. O referido ator protagoniza uma cena, em que ao seu lado estão membros de sua família.

No entanto, essa aparição, no conjunto geral da obra, serve mais para justificar a brancura do mundo espiritual, no olhar do diretor Wagner Assis, do que para estabelecer um diálogo sincero com a diversidade. A esta lacuna, soma-se o silêncio aos povos indígenas ,que como os negros, também fazem parte do DNA brasileiro.

Não falo aqui do mundo espiritual, mas sim da representação cinematográfica desse mundo e dos impactos que estas representações têm nos telespectadores. O espiritismo e suas mensagens são plurais, assim como o público espírita, cergar-se a isso e render-se aos ditames comerciais, estéticos e raciais da sociedade de consumo é macular a mensagem de fé, libertação e fraternidade defendida por tal religião.

No entanto, o filme tem seus méritos. As mensagens relatadas por André Luís, no livro “Nosso lar”, (mesmo que rapidamente, dado o dinamismo cinematográfico) nos toca profundamente.

Talvez, o medo de errar possa ter restringido alguns atores, pois, em alguns momentos, falta algo na interpretação que dê mais vida ao que está sendo contado. Deve ser difícil mesmo: achar o equilíbrio para filmar, dirigir e atuar em uma história de algo que não conhecemos (ou não nos lembramos mais), mas que julgamos ser verdade.

Temos um documento escrito que atesta a sua veracidade, mas que caminha no limite da ficção. Temos a fé que legitima esta experiência, que por vezes é encarada, mais como o medo que o homem tem de ser finito, do que um caminho que nos leva libertação.

Na semana em que teremos a caminhada contra a intolerância religiosa e em épocas de racismo, desilusão, desesperanças, aquecimento global etc, que a seqüência de filmes sobre espiritismo nos desperte para o amor ao próximo, a fraternidade, a amizade, a utopia, a revolução, a igualdade de gênero, de raça.

Estes últimos, como todos os outros, de suma importância e fundamentais para que os próximos filmes sobre religiosidade não “carreguem” para o mundo espiritual problemas humanos, que nós teremos que resolver aqui na Terra.

 

Fonte: Afropress

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