O poder grisalho é só para quem tem coragem e teimosia

Por: Fátima Oliveira

Entrei para as fileiras do “gray power” (poder grisalho). Há quase dois meses, sou uma cabeça grisalha com uma invejável sensação de liberdade. Desde o ano passado decidi deixar a natureza seguir o seu curso sobre meus cabelos. Isto é, já tenho mais que uma coroa de cabelos brancos (a fronte grisalha), pois eles começaram a “pintar” desde por volta dos meus 30 anos. É, faz um tempão!

Enjoada da trabalheira para deixá-los pretos, radicalizei: chega! Era agosto de 2009. Há dois meses, não tingia a coroa e o aspecto não era dos melhores. Ouvi zilhões de coisas, desde que estava com ar desleixado até que parecia bem mais velha. Como faria uma viagem, e sabendo que eu queria ficar com cor natural dos meus cabelos, meu filho foi ao supermercado e comprou, por sua conta e risco, o xampu tonalizante que eu usava. “Ah, pode se virar, não vai viajar assim, não! Coisa mais feia, mãe!” Foi tão engraçado que cedi. Foi a última vez em que usei o tal xampu.

Minha aparência era cada vez mais estranha: a coroa de cabelos brancos e o resto dos cabelos pretos. Infernizei o Dell, meu cabeleireiro há muito tempo, que aplicou uma química que retira tinta, não sem dizer, inúmeras vezes, que eu precisava ser paciente para ficar com os cabelos que queria, mas se eu insistia… Adquiri cabelos de várias tonalidades: grisalhos, vermelhos, amarelados… Tal como o Dell vaticinou.

Resumo da ópera: assumi ficar daquele jeito até a natureza finalizar a sua obra. Em casa, desassossego completo. A filharada buzinando em minha cabeça o tempo todo. No hospital, havia uma corrente orquestrada pela volta dos meus cabelos pretos. Até uma enquete fizeram. Os cabelos pretos ganharam no primeiro turno. Os colegas eram os mais impertinentes, até os grisalhos! Foi um período que gerou quilômetros de discussões. Temperada para peitar adversidades e, encarando como brincadeira, segurei firme. No máximo, indagava: “Por que homem pode e mulher não?”

Suportei por mais de seis meses carregar um arco-íris na cabeça até os cortes mensais sumirem com ele. Confesso que em alguns momentos quase sucumbi… Aprendi muita coisa, até a dizer que só mulheres poderosas podem ostentar cabelos brancos. E seguia de nariz empinado.

Teimoooooooosa de nascença, em alguns dias aquele enfrentamento dava um cansaço profundo. Na época, estava escrevendo o meu romance “Então, Deixa Chover” (no prelo), e o assunto ficou tão impregnado em meu cotidiano que acabou sobrando para a personagem Maria. Eis um trecho:

– “‘Desculpe-me, mãe. Seus cabelos, embora bonitos, não são do meu agrado… Não adianta, cabelo branco não foi feito pra mulher’.

Todo mundo riu bastante, inclusive eu, acrescentando que ele precisava se acostumar porque eu acabara de assumir meus cabelos brancos para sempre, pois perdi a paciência para usar tintura, e estava querendo ter meus cabelos conforme o meu rosto, isto é, com as marcas da minha idade. Pedro, que ouvia atentamente, emendou:

– ‘Filhos sempre querem comandar a vida dos pais. É elegante e distinta com os cabelos como estão. E o corte Chanel caiu muito bem na senhora. Dou o maior dez pra mulheres que não escondem as marcas do tempo e que exibem os cabelos grisalhos, como coroa de poder. Num mundo em que a juventude é o modelo do belo, é muita coragem da mulher que entra para as fileiras do gray power porque o preconceito ainda existe. Só para mulheres, pois homens grisalhos são considerados charmosos, desde sempre'”.

Fonte: O Tempo

+ sobre o tema

Obama afirma que reanimar a economia é sua tarefa mais urgente

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, considera que...

Tribunais são enviesados contra mulheres e negros e não fazem justiça, diz advogada da OAB

Os Tribunais de Justiça são enviesados e, por isso,...

O tal “panelaço” tem cara, grife, cor e endereço, nobre, diga-se de passagem

O tal "panelaço", importado da Argentina, de que  grande...

O silêncio da mídia diante da denúncia de golpe do fotógrafo brasileiro ganhador do Pulitzer

Dez dias atrás, o fotógrafo Mauricio Lima foi festejado pelos grandes meios...

para lembrar

Ana Paula Xongani estreia no GNT e se torna primeira brasileira com dreads em campanha de cabelos

A influenciadora digital fez os dreads durante uma viagem...

Entrevista – Fábio Mesquita: “Talvez a solidariedade nos leve a viver em um mundo melhor”

“Este ciclo vai passar… e talvez esse momento tão...

Precisamos reconhecer nossa palmitagem

Muito se tem discutido sobre a solidão da mulher...

Polícia ocupa Mangueira para instalar UPP

Numa operação tranquila a Polícia Militar ocupou mais...

Eu, mulher negra…

EU, MULHER NEGRA…Eu, mulher negra…Tenho orgulho de quem sou e de onde vim.Tenho orgulho da mulher que me tornei.Aprendi desde muito cedo, a amar...

Poesia: Ela gritou Mu-lamb-boooo!

Eita pombagira que riscaseu ponto no chãoJoga o corpo da meninade joelho num surrão. Grita ao vento seu nomeComo se quisesse dizerQue mulher tem que...

A mulher negra no mercado de trabalho

O universo do trabalho vem sofrendo significativas mudanças no que tange a sua organização, estrutura produtiva e relações hierárquicas. Essa transição está sob forte...
-+=