O que o papa diria sobre o caso do bispo que se livrou de um padre que foi vítima de racismo?

O papa Francisco já manifestou por mais de uma vez seu ponto de vista condenando o racismo, mas parece que o bispo Dom Luiz Antônio Cipolini não atende aos recados do sumo pontífice.

por :   Do: DCM

Bispo de Marília, Dom Luiz encarou o caso de racismo sofrido por um padre negro tomando a atitude mais cômoda: tirar a vítima da paróquia.

O fato ocorreu na cidade de Adamantina, interior de São Paulo. Wilson Luís Ramos, padre da principal paróquia da cidade, afirma ter sofrido rejeição de alguns fiéis por ser negro e atuar em favor dos mais pobres. Em entrevista ao Estadão, ele disse que ouviu mulheres dizendo que deveriam trocar o galo no topo da igreja por um urubu.

Dom Luiz, alegando que a paróquia está dividida, com “grave prejuízo ou perturbação à comunidade eclesial”, decidiu tirar o padre do lugar, apesar dos protestos de parte da população pela manutenção do pároco. Na nota em que informa e justifica sua ação não há nenhuma referência à discriminação racial sofrida pelo padre.

Na entrevista ao Estadão, o bispo confirma que houve discriminação racial, porém nega que este tenha sido o motivo do afastamento. “O padre Wilson tem sofrido com essa questão. Houve preconceito por parte de fiéis, mas o padre foi vencendo e o que está em jogo agora não é o preconceito, mas sim a divisão que ele causou na paróquia”.

A atitude do bispo Cipolini lembra a do personagem Willian Ford, de “12 Anos de Escravidão”. Fazendeiro benevolente e temente a Deus, compra o escravo Solomon Northup, personagem principal do filme. Solomon é torturado e quase morre nas mãos de capatazes da fazenda, que o espancam contra a vontade do patrão. Willian, em vez de repreender os capatazes para impedir os maus-tratos a Solomon, decide resolver a situação vendendo o escravo. Para usar um termo bíblico, “lavou as mãos”.

O que o papa Francisco acharia disso? Certamente a indiferença do bispo a respeito do racismo sofrido pelo padre não soaria bem para um pontífice cuja primeira viagem oficial foi à ilha de Lampedusa, ponto de chegada de imigrantes ilegais na Europa – a maioria deles negros africanos.

Embora retrógrado e mais próximo das ideias de Ali Kamel que das do papa Francisco, o pensamento do bispo de Marília encontra eco nas atitudes do padre mais famoso do país, Marcelo Rossi. Para o padre cantor, a Igreja deve ficar longe da política, como ele afirmou em entrevista à Folha de São Paulo.

É essa distância seletiva da política que faz com que o padre Marcelo escreva um artigo rasteiro falando que umas das causas da violência seria “a falta de Deus na vida das pessoas”. Motivos palpáveis, como a guerra às drogas e a desigualdade social, para ele, devem ser coisas inventadas pelas Comunidades Eclesiais de Base – comunidades da Igreja Católica ligadas a movimentos sociais nas áreas mais pobres.

Pelo que tudo indica, o padre Ramos está no lado oposto. Fez a opção por uma Igreja Católica voltada para questões sociais e mais próxima do povo. Sem a espiritualidade alienante da “aeróbica do senhor” ou as convocações para que os fiéis “sentem no colo de Jesus” em busca da solução para os seus problemas.

Consequentemente, sua transferência foi uma vitória das forças conservadoras, empenhadas em liturgias e dogmas porém sem qualquer compromisso com o avanço da sociedade. Exatamente na contramão do pensamento do papa Francisco.

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