“Para Onde Vamos” na TV – Tem uma revolução correndo nos nossos olhos

Enviado por / FonteECOA, por Anielle Franco

Entre a casa grande e a senzala, nossa via sempre foi o quilombo

(Vilma Reis, 2021)

Começo minha primeira coluna do mês de julho, o Julho das Pretas, referenciando a mulher que para mim vem sendo fruto de constante inspiração e aprendizado nos últimos meses e uma das personagens da minissérie documental “Para Onde Vamos”, que estreia na próxima quarta-feira (7), a ativista negra brasileira e socióloga Vilma Reis.

Vilma, Paula, Áurea, Elaine e eu, Anielle. Esses são os nomes das cinco personagens da nossa minissérie “Para Onde Vamos”. Com entrevistas e imagens dos bastidores da atuação de mulheres negras ao longo dos anos, suas histórias, disputas e vitórias, a minissérie documental “Para Onde Vamos” chega no mundo apresentando uma narrativa de ação, potência e perspectiva positiva que desconstrói e subverte os espaços marcados por exclusão e violência contra mulheres negras e visibiliza algumas das maiores representantes de uma verdadeira força de progresso e renovação política em nosso país atualmente.

Cartaz da série “Para Onde Vamos?” do Canal BrasilImagem: Divulgação

A minissérie, filmada durante a pandemia e com uma equipe totalmente feminina e majoritariamente composta por mulheres negras de cinco cidades diferentes, começou a ser pensada a partir da pesquisa realizada pelo Instituto Marielle Franco e o movimento Mulheres Negras Decidem, em 2020, e que contou com a participação de mais de 250 ativistas negras de todo o Brasil. O desafio em decidir quais histórias contar foi enorme, uma dessas histórias é a minha, que vocês que me leem aqui em Ecoa UOL há mais de um ano, já conhecem. Hoje, as histórias que quero contar são as das outras personagens que me acompanham nessa produção imperdível. São mulheres negras, mulheres de luta e que estão revolucionando seus territórios e o nosso país e que por isso, todos devem conhecer.

Vilma Reis é socióloga, doutoranda em Estudos Étnicos e Africanos no PosAfro da Universidade Federal da Bahia, UFBA e ocupou o cargo de ouvidora-geral da Defensoria Pública do Estado da Bahia de 2015 a 2019. É também uma feminista, defensora de direitos humanos, ativista do movimento de Mulheres Negras brasileiro, atua no Fórum Marielles da Bahia e na Coalizão Negra por Direitos, tendo sido pré-candidata com uma pré-campanha lindíssima e inspiradora para a prefeitura de Salvador pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Vilma, em 2020, liderou o movimento e campanha Agora É Ela, que envolveu centenas de ativistas negras do movimento de mulheres negras brasileiras em defesa de sua pré-candidatura. Na série, Vilma nos presenteia com importantes análises do papel das mulheres negras no fortalecimento da democracia brasileira e na construção de políticas públicas verdadeiramente capazes de dar soluções aos nossos problemas. Ela relembra a morte da minha irmã, Marielle, e reforça a ideia que defendemos desde o momento de sua morte ao afirmar que “Quando lançam nosso sangue sobre o chão, nós brotamos pois somos sementes!”

Elaine Ferreira do Nascimento é pesquisadora e coordenadora adjunta da Fiocruz-PI, responsável pela avaliação de serviços de saúde, doenças negligenciadas e determinantes sociais de saúde. Uma mulher negra que ocupa um espaço relevante da saúde pública no Brasil, na maior instituição de pesquisa biomédica da América Latina e uma das maiores do mundo, a Fundação Oswaldo Cruz. Como profissional que acompanhou de perto a pandemia de covid-19 e o impacto que essa pandemia teve na vida de milhares de brasileiros.

Como ativista e também uma mulher negra lésbica, em um dos episódios de nossa minissérie, ela reforça que a importância de amar outra mulher ao nos dizer que: “A política me torna revolucionária, a justiça social me torna cidadã, mas amar uma mulher é o que me torna humana”. Em suas produções científicas e trabalho na Saúde Pública e no SUS, consegue desenhar caminhos para a garantia do acesso à saúde para populações minorizadas e que, por vezes, as políticas públicas insistem em esquecer de suas especificidades, como é o caso de mulheres negras e lésbicas.

Já Paula Beatriz, outra personagem da série, é professora e diretora da Escola Estadual Santa Rosa de Lima, no Capão Redondo, na zona sul de São Paulo. Paula é um desses nomes que devemos sempre lembrar, pois foi a primeira mulher transexual a assumir a direção de uma escola pública em São Paulo. Em 2019, recebeu o Prêmio Ruth de Souza, oferecido pelo Conselho Estadual de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo (CPDCN), da Secretaria da Justiça e Cidadania pelo trabalho desenvolvido na área da educação. Na série, Paula nos lembra que “A educação é a promotora maior para um país crescer” e que portanto, essa deve ser a vida de mudança para a política de nosso país. Paula nos mostra os caminhos e aponta um novo movimento para a educação pública no Brasil.

Áurea Carolina, deputada federal pela qual tenho extrema admiração e respeito e nossa representante parlamentar na minissérie, tem uma importante trajetória de luta pelos direitos das mulheres negras. Foi a vereadora mais votada de Belo Horizonte (MG) nas eleições municipais de 2016, mesma eleição que minha irmã disputou. Áurea, assim como Marielle, promoveu uma verdadeira revolução feminista negra em sua cidade. Ela foi a mulher mais votada na história da cidade e a deputada federal com a quinta maior votação do estado em 2018. Na série ela reforça que “a gente vem reverenciando essas mulheres negras e sabendo que a gente tem um papel de continuidade”. Áurea é precursora de um movimento inovador na política brasileira: o Gabinetona, uma experiência de mandato coletivo. Hoje, como deputada federal, ela trabalha em defesa dos direitos das mulheres, da negritude, das juventudes, dos povos e comunidades tradicionais e contra a mineração predatória, tema de extrema relevância na política brasileira e que até então era discutido apenas por homens brancos.

Nossas histórias falam por si, e não tenho dúvidas da importância dessa produção para a reafirmação do lugar das mulheres negras frente ao avanço do fascismo e retrocessos que o Brasil enfrenta. A minissérie “Para Onde Vamos” pretende ser um processo de visibilização da atuação de mulheres negras frente ao atual contexto social, político e econômico em nosso país. Apresentamos o movimento das mulheres negras do Brasil através de histórias de ativistas que estão liderando verdadeiras revoluções no modo de pensar, agir e executar políticas públicas no país.

O primeiro episódio da minissérie documental “Para Onde Vamos” estreia nesta quarta-feira, dia 7 de julho às 19h30 na TV aberta para todo o Brasil, no Canal Brasil e online no Globoplay. Antes disso, teremos nossa pré-estreia com um bate-papo incrível com a diretora da nossa minissérie, Claudia Alves da Fluxa Filmes e todas as cinco personagens. Esse papo acontece a partir das 18h no canal do Youtube do Canal Brasil.

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