Pesquisa revela como racismo e transfobia afetam população trans negra

Enviado por / FonteECOA, por Eduardo Carvalho

Uma pesquisa inovadora do Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (Fonatrans), intitulada “Travestilidades Negras”, lança, nesta sexta-feira, 7/2, luz sobre as complexas intersecções de raça, gênero e outras opressões que afetam a população trans negra no Brasil. Coordenada por Jovanna Baby e com pesquisa de Jessyka Rodrigues, além de ter contado com os trabalhos de Edmar Ferreira, Ana Paula de Deus e Cris Lacerda, o estudo revela dados alarmantes e destaca a importância do movimento social organizado e da criação de políticas públicas inclusivas.

A pesquisa adotou uma metodologia que valoriza a interseccionalidade. Segundo Jessyka Rodrigues, que coordenou a pesquisa pela Fonatrans, a abordagem interseccional é crucial para “compreender a conexão do racismo e transfobia, isso no contexto da população trans negra”. Ela acrescenta que essa população “sofre racismo e transfobia mutuamente”, com atravessamentos de gênero, raça e outros eixos de opressão, incluindo o capacitismo.

O impacto da violência

Os dados demográficos da pesquisa revelam que a maioria dos respondentes está em idade produtiva, com 23,43% entre 18 e 25 anos e 26,65% entre 25 e 30 anos. Quanto à identidade de gênero, 42% se identificam como travestis, 34% como transexuais e 12% como homens trans. A maioria dos participantes se declara negra (55,67%), seguida por parda (42,89%) e indígena (1,44%). Além disso, 47,82% se declaram de matriz africana.

Um dado que preocupa é o de que 70,14% dos respondentes diz ter sofrido violência por racismo e transfobia, o que evidencia a urgência de ações para combater essas formas de discriminação. A pesquisa também revelou que 52,07% dos participantes abandonaram os estudos por dificuldades financeiras e 28,79% por transfobia.

Desafios e urgências

Para Jessyka Rodrigues, a publicação considera-se um reflexo do “excelente trabalho do movimento acerca do letramento racial”. Ela também destaca o fato de que a maioria das travestis e transexuais não injetam silicone industrial no corpo, demonstrando os resultados do trabalho de conscientização realizado pelo movimento.

Um dos maiores desafios enfrentados foi o tempo limitado para a realização da pesquisa, apenas cinco meses. Apesar disso, a equipe conseguiu entregar um trabalho inédito e de excelência. Jessyka Rodrigues ressalta que não basta apontar ações urgentes pontuais. ”Estamos falando de transformação social de sentimento de pertencimento”. Rodrigues enfatiza que a população trans negra tem o status de cidadania negado em diversas instâncias sociais.

A pesquisa também aborda a questão da evasão escolar, revelando que 52,07% dos participantes abandonaram os estudos por dificuldades financeiras. Segundo a coordenadora da pesquisa, este é mais um sintoma de que a população trans negra é marginalizada por instituições como a escola, a família e a religião, o que dificulta seu acesso à educação e ao mercado de trabalho. Além disso, a falta de apoio familiar, com apenas 9% dos respondentes afirmando ter esse apoio, agrava a situação de vulnerabilidade dessa população.

Aquilombamento e políticas públicas

A amostragem coloca visibilidade no conceito de aquilombamento como forma de resistência, destacando sua importância para a criação de políticas públicas inclusivas. Jessyka Rodrigues afirma que “aquilombamento é uma navalha ancestral que serve para abrir caminhos e contribuir para políticas públicas inclusivas, a partir de novas narrativas”.

A pesquisa aponta que as políticas públicas devem inserir outros modelos de famílias para além da família cisnuclear, fomentando a construção de redes de apoio. Também é necessário que as políticas públicas sejam integrais, ou seja, que não se foquem apenas na empregabilidade, mas também na educação e no acolhimento. E, ainda, segundo Jessyka, é essencial que sejam consideradas as especificidades da população trans negra, levando em conta as diversas opressões que essa população enfrenta.

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