Precisamos falar sobre a saúde mental das mães

“Filhos são as criaturas que mais amamos no planeta, mas que drenam cada gota de energia que temos”, diz a colunista Cinthia Dalpino

Por Cinthia Dalpino, da Revista Crescer 

Foto @_WILLPOWER_

Já se passaram cinco anos, mas sempre me lembro como se fosse ontem.

Eu, uma recém-nascida no colo e uma filha de 3 anos, sentadas no consultório do pediatra por causa de um assunto relacionado à saúde das meninas e o olhar deste mesmo pediatra direcionado a mim. Um olhar que me salvou, que me perguntou o que eu precisava naquele momento, que me fez perceber o quanto eu estava exausta. O que me fez perceber que, até então, eu mal conseguia pensar.

Aquela cena se repetiu na última semana, enquanto eu estava na poltrona diante da tela de cinema, assistindo ‘Tully’, um filme que mostra um assunto sobre o qual não damos a menor atenção: a saúde mental das mães.

Todos sabemos como é exaustivo gerenciar dezenas de tarefas diariamente. Somado a isso, temos os filhos, que são sim as criaturas que mais amamos no planeta e nos abastecem de amor, mas que drenam cada gota de energia que temos. Para uma criança ser minimamente bem cuidada, são necessários olhares, braços e cuidados relacionados à higiene, alimentação, saúde. Isso sem citar a parte emocional. Cuidados pelos quais todos acreditam que é a mãe a responsável. Nascemos com esse “chip” e, quando algo dá errado, é batata: a ‘culpa’ é sempre da mãe.

No filme, Marlo, a personagem principal, sente a sobrecarga depois do nascimento do terceiro filho. Não é sobre o número de filhos, mas das pequenas atividades cotidianas, que estamos falando. Ela leva na escola, vai nas reuniões, dá banho, faz o jantar, acorda na madrugada. Aquele filme do qual toda mãe conhece o enredo.

A questão é que estamos tão acostumados à sobrecarga materna, que poucos de nós se dão conta de que a saúde mental das mães precisa de atenção. Sem entrar no mérito da divisão de tarefas com os pais, que deveria ser regra, mas é exceção, temos uma legião de mulheres sofrendo em silêncio.

Uma vez, uma amiga disse, em tom de brincadeira, que as redes dos apartamentos são colocadas para as mães e não para impedir que os filhos caiam. Uma outra confidenciou que durante várias vezes se trancou na varanda pra fumar seu cigarro e esquecer aquela loucura toda de maternidade que estava dentro de casa. Nestes momentos, pensava em fugir.

Uma vez, estive no Cacá, nosso pediatra, e só tinha uma filha – estava grávida da segunda. Eu contei a ele toda a minha angústia da época e em determinado momento ele disse:

– Por que você não sai um pouco com ela para se distrair?

Eu respondi:

– E deixar a casa de ponta cabeça?

Ele veio com a solução:
– Prioridades… a sua saúde mental é uma prioridade.

Mesmo sabendo disso, há oito anos caio em ciladas. Sempre me vejo priorizando outras coisas, que não a minha saúde mental.

No filme, quando Tully, a babá noturna, diz a Marlo que ela deve sair um pouco, ela questiona algo do tipo:

– Sair pra beber em Manhattan é a saída?

A babá responde algo como:

– Ok. Talvez no Brooklin.

A questão é que sempre que paramos para priorizar nossa saúde mental, somos julgadas. Não é a toa que temos tantas mães sofrendo silenciosamente com depressão, síndrome do pânico, transtornos de ansiedade, entre outros. Eu, pelo menos, conheço várias.

Basta você dizer que precisa de um respiro, que as pessoas que não se levantam para oferecer ajuda, mas estão prontas para apontar os dedos em sua direção quando você cair, farão com que você se sinta culpada por ter tido um momento de autocuidado.

Acredite: cuidar da sua saúde mental é sim, prioridade e deveria ser todos os dias. Não precisamos chegar ao ponto de adoecer para pedir ajuda. Não precisamos cuidar dos outros, sem cuidar de nós mesmas. Cuidar de si mesma deve ser regra. Cuidar da saúde mental não é frescura. É vital.

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