Preconceito a gente vê por aqui – por Marcelo Carvalho

Sem motivo algum aquele policial militar ordenou que eu encontasse na viatura, me revistou e solicitou meus documentos, eu nada respondi, mas sentia meu sangue subir a cabeça e o vexame de ser abordado em pleno centro da cidade.

– Policial o que está acontecendo aqui? – perguntei.

– Procedimentos de rotina. – disse ele, com um sorriso irônico.

– Mas a rotina é revistar somente a mim, o meu amigo não? – eu respondi, e olhei para o rapaz caucasiano que estava comigo e observava a cena juntamente com as demais pessoas que chegavam para ver o que estava acontecendo.

Durante minutos travamos um dialogo silencio, o policial e eu. Não dissemos nada um ao outro, mas de meus olhos ele poderia ver muita raiva, constrangimento e as primeiras lágrimas que teimavam em escorrer pelo um rosto. O policial sorria e olhava com orgulho para as pessoas que se aproximavam. Não segurei a dor e a raiva e o encarei com mais força. Ele se aproximou e mandou-me desencostar da viatura, pois poderia suja-la.

Naquele momento desejei ainda estar no tempo da escravidão, pois tenho certeza que lutaria com ele até a morte, ou a minha ou a dele, mas nada fiz. Minutos depois chegou outra viatura com uma mulher dentro. Ela desceu, me olhou e informou aos policiais que não fora eu que havia a assaltado.

O policial me liberou e o circo que havia sido montado se defez. Eu não fui embora sentei ali mesmo num banco da praça e chorei. Com a cabeça entre as mãos, perdi as forças e pensei nos meus pais, nos meus irmãos e em todos os negros que conheço, também os que não conheço e concordei com os Racionais MC´s que um dia cantaram: “Enquanto você sossegado foge da questão. Eles circulam na rua com uma descrição. Que é parecida com a sua. Cabelo, cor e feição. Será que eles veem em nós um marginal padrão.”

Queria eu encontrar mais pessoas negras como eu na minha sala de aula, nos programas de Tv, nos comerciais, nas livrarias como autores.

Queria eu não precisar pedir que a política de cotas saia do papel, não desejar pedir direitos iguais e respeito por minha cultura.

Quero lembrar para sempre de Zumbi dos Palmares e da Semana da Consciência Negra, lembrar que no passado foi preciso lutar por respeito, mas enquanto esse dia não chega quero lutar para que meu futuro filho não passe por esse constrangimento que eu passei.

Enviado por Marcelo Medeiros Carvalho

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