Com 467 anos, a cidade de São Paulo tem muita história para contar. Porém, por causa da elite e do racismo estrutural, algumas delas foram apagadas, como a do bairro do Bixiga, no centro da capital. Hoje conhecido pela culinária italiana, o local era o Quilombo da Saracura, em alusão ao rio que passa pelo bairro. Assim como o bairro da Barra Funda, na zona oeste, antigamente chamado de Largo da Banana. Atualmente ele é apresentado como bairro de operários europeus, e não pela tradição afro-brasileira.
Foi para promover e contar a história de São Paulo com seus heróis e heroínas que resistiram e lutaram na época da colonização que surgiu o Projeto de Lei (PL) 47/2021: São Paulo é solo preto e indígena. A medida também visa a substituir monumentos e homenagens a escravocratas ainda mantidas na cidade.
Memória
“Há muito tempo o movimento negro brasileiro fala da importância de termos símbolos que têm relação com o nosso povo e de questionarmos os símbolos de violência contra nós, que hoje são completamente naturalizados”, avalia a vereadora Luana Alves, líder da bancada do Psol na Câmara Municipal.
“É uma forma de violência profunda. E falarmos sobre essas estátuas, homenagens, é não só questionar o que aconteceu, mas colocar um recado muito claro de que no futuro não aceitaremos, que é não é natural esse tipo de processo”, completa.
Antirracismo
Simone Nascimento, integrante do Movimento Unificado Negro (MNU), uma das entidades que assinou uma carta entregue aos demais vereadores para a aprovação do PL, comenta que essa atitude de ressignificar nomes de praças, ruas e mudar os monumentos é uma ação que vem acontecendo em outros países. O projeto também alinha o patrimônio da cidade com debates sobre memória e antirracismo. Assim como exige que as leis 10.639/2003 e 11.645/2008, que tornam obrigatórios o ensino de História Indígena, da África e da cultura afro-brasileira, sejam de fato cumpridas.
“Tem a ver com o lugar de pertencimento e a construção da identidade. Muitas vezes as formações de identidades brasileiras só levam em consideração a questão europeia no processo de colonização e ignoram a contribuição dos povos originários e dos povos africanos que foram escravizados em nosso país. É importante para que descendentes de negros e indígenas possam construir um processo e reconhecimento da sua cultura, mas também para que o Brasil passe a valorizar essa visão de um país que foi construído a partir desses povos também”, observa Simone.
“Não conhecer a sua própria história é estar fadado a um processo de esvaziamento, ignorância e invisibilidade. Esse processo de reconhecimento e estudo faz com que a gente valorize uma cultura”, acrescenta.
Tramitação do PL
O PL já foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e no Congresso de Comissões da Casa. E agora irá para votação em segundo turno no plenário. O pleito será definitivo para a sua aprovação. A vereadora Luana Alves destaca que toda a viabilidade do projeto já foi reconhecida.
“Antes de apresentarmos essa versão, que é a versão final do projeto, nós já conversamos com o Departamento de Patrimônio Histórico (DPH), já vimos a viabilidade do projeto. Qualquer voto contrário a ele nessa altura é na verdade um voto ideológico, não se trata de viabilidade, porque é viável. Conversamos com o DPH e agora o que está faltando é refazer a conversa com os colegas vereadores para conseguir aprovar em segunda votação”, ressalta a parlamentar.