Cerca de 300 milhões de pessoas ao redor do mundo sofrem com a depressão, segundo dados da Opas (Organização Pan-Americana da Saúde). Destas, quase 12 milhões são brasileiras, aproximadamente 6% da população do país. De acordo com o relatório “Depressão e outros transtornos mentais”, da OMS (Organização Mundial da Saúde), o Brasil lidera os casos na América Latina.
Esse silencioso desespero engolirá um a uma quem anda ao nosso lado ou até a nós mesmas? A pergunta que os gestores públicos deveriam estar respondendo nesse momento é: “Qual é o nosso plano, como país?”.
Faltam respostas e protocolos mais eficientes de atendimento, sobra uma dose perigosa de desinformação e preconceito. Com o cultivo cirúrgico de fake news e a ascensão de uma cultura de superficialização de temas complexos com fins de viralização, o futuro não parece muito promissor. Por isso mesmo é importante não desistir de falar sobre isso.
Duas, entre tantas crenças, fazem a conversa e o agir sobre o assunto ainda mais desafiadores:
A primeira é a de que a depressão alcança somente as classes sociais mais altas, empobrecidos não têm tempo para isso;
O segundo ponto é que —sim, existe e está na boca de muitas pessoas por aí— um homem de verdade não tem depressão.
Eu sei, você ficou com chocado com esse segundo ponto. Mas, acredite, essa ideia não apenas existe, como é mais comum do que se imagina.
Por conta do meu trabalho, eu tenho a chance de estar em conversas com muitas pessoas diferentes, de vários cantos dos Brasis. É uma sorte que desejo a todo mundo. Esses são momentos em que aprendo uma década em uma hora. Junto, busco entender como as coisas são conversadas ali no dia a dia, na rotina da vida de tanta gente.
Outro dia, embarquei numa conversa com um senhor de uns 60 anos que me dizia algo parecido com isso: nenhum dos amigos ou das pessoas que eu conheço teve depressão até hoje. Isso é coisa de gente desocupada.
Eu sei, é fácil cair na tentação de abrir um cardápio de julgamentos para o que ele trouxe. É o caminho mais fácil, é a cultura de resposta rápida que a internet nos convida, todos os dias. Mas façamos o exercício generoso de colocar uma lente no caminho de vida e na existência dessa pessoa, do nascimento até aqui.
Quantas vezes ele pôde conversar sobre como se sentia ou sentiu? Quantas vezes ele recebeu um atendimento especializado que foi investigando, semana por semana, os sinais que o seu corpo e a sua mente davam? Quantas vezes foi normalizado que buscasse apoio, ajuda, suporte, e que isso era a coisa mais natural do mundo já que ele era um ser humano, e seres humanos sofrem, adoecem, precisam dos outros para seguir? Quantas vezes ele escutou da boca de outros amigos, amigas, da própria família, que se precisasse contar para qualquer coisa, essas pessoas estariam ali para o que desse e viesse? A gente só consegue nomear o que sente se, um dia, aprendemos que essas coisas têm um nome.
Quase 6% da população brasileira está sofrendo com a depressão. Isso é muita coisa e deveria nos preocupar para além dos dias, das semanas que seguem a divulgação de pesquisas sobre o assunto.