O salário de uma mulher negra no Brasil é, em média, 26,5% menor que o de uma mulher branca. E tem uma redução de 56,4% frente à remuneração de um homem branco. “Homens brancos com curso superior ganham, em média, R$ 6.590. O salário médio das mulheres brancas é de R$ 3.915. Já as mulheres negras têm a menor renda entre as trabalhadoras com ensino superior. A renda média delas é de R$ 2.870, enquanto os homens negros com curso superior ganham R$ 4.730”, diz o presidente do instituto Locomotiva, Renato Meirelles, que fez o estudo.
Lorena Cristina Souza, 29, é desenvolvedora Java, especialista em geoprocessamento, e percebe as diferenças de tratamento no mercado de trabalho. “No meu primeiro emprego em Belo Horizonte, trabalhava com 20 homens, e começaram a fazer cortes. Fui a primeira a ser cortada, a única mulher desenvolvedora. E eu entregava tão bem quanto os rapazes, entregava até mais do que alguns. Foi em 2012, quando comecei a entender o peso de ser mulher”, relata. Ela conta que também sentiu a questão racial na carreira. “Existe sim, existem mulheres brancas que tiveram mais oportunidades. O que eu fazia era tentar me parecer mais com mulheres brancas: ter os cabelos escovados, usar terninho, até chegar na ThoughtWorks. Foi uma estratégia para sobreviver e cavar as oportunidades”, afirma a profissional.
Lorena trabalha desde 2016 na ThoughtWorks (TW), uma multinacional de tecnologia com escritório na capital mineira e políticas internas de inclusão de mulheres e pessoas negras. Segundo a diretora de justiça social e econômica da empresa, Renata Gusmão, 32% dos funcionários da empresa no país são negros. “Temos um grupo de mulheres negras que está direcionando os principais objetivos para a questão racial dentro da ThoughtWorks”, afirma Renata. No que se refere a salários, ela diz que a empresa considera a realidade da contratada. “O fato de sabermos o que acontece no mercado nos dá insumos para medidas mais intencionais a fim de minimizar possíveis desigualdades. Se considerarmos só o salário atual, vamos estar cometendo uma injustiça, já que os salários são menores (no caso de mulheres negras)”, explica.
Para a presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos em Minas Gerais (ABRH-MG), Eliane Ramos, as empresas devem se responsabilizar pela promoção da igualdade e da diversidade. “É papel da empresa criar políticas e métricas para saber quantos homens e mulheres são contratados e promovidos. É necessário que a cabeça da empresa, o presidente, os recursos humanos estejam comprometidos”, afirma.
Segurança
“As empresas apoiarem as minorias é muito importante. (Na TW) me sinto mais segura, mais empoderada e, consequentemente, mais produtiva. Não preciso ter vergonha do meu cabelo, do meu corpo, da minha roupa. Ter um público diverso aqui faz com que a gente pense tecnologia de uma maneira mais ampla.”
Lorena Cristina Souza / Desenvolvedora
Para a fundadora do movimento de valorização da mulher na tecnologia She’s Tech, Ciranda de Morais, o maior problema do setor não é de salário, mas de representatividade. “Nesse setor existem disparidades salariais com em todos os outros, mas nele a falta de mulheres é o pior”, afirma. Segundo a Unesco, só 17% dos programadores no Brasil são mulheres. Para Ciranda, o problema começa na escola. A Sociedade Brasileira de Computação diz que elas ocupam só 15% das vagas em cursos como ciências da computação e engenharia.
“É um problema cultural que vem da infância, desde os brinquedos de meninas, que são ligados a afazeres domésticos, e os dos meninos, voltados para profissões e exploração do mundo. Uma pesquisa recente mostrou que, até os 10 anos, as meninas vão melhor em matemática; depois o cenário se inverte. Isso acontece por falta de incentivo”, avalia.
“Percebi (a ausência de mulheres) desde a faculdade. De 40 alunos, duas eram mulheres”, afirma a desenvolvedora Lorena Souza. “Vem da sociedade não enxergar a mulher como apta para as exatas, mas isso é mentira. As mulheres podem estar onde quiserem”, completa