Reitoria segue ocupada, e UFSM instaura sindicância para investigar racismo

Na última semana, foram observadas em uma sala de aula do curso de Ciências Sociais mensagens racistas, o que já havia acontecido em setembro. Alunos pedem medidas.

Do G1

A sede da reitoria da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) segue ocupada na tarde desta segunda-feira (27) por estudantes em protesto contra as pichações racistas registradas neste ano. No domingo (26), por meio de nota divulgada no Facebook, a universidade informou ter instaurado uma sindicância para investigar os casos.

Mensagens racistas foram descobertas em paredes de curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa Maria (Foto: Vanessa Backes/RBS TV)

“A UFSM instaurou um processo administrativo investigativo para apurar a autoria dos deploráveis atos racistas, de intolerância e de ódio ocorridos nos últimos meses, ao mesmo tempo em que acompanha e colabora intensamente com a investigação criminal conduzida pela Polícia Federal. Os autores, uma vez identificados, serão responsabilizados e punidos na forma da Lei e dos regulamentos internos”, diz trecho da nota.

Na última semana, foram observadas em uma sala de aula do curso de Ciências Sociais mensagens racistas com desenhos de suásticas. Em setembro, pichações racistas já haviam sido localizadas na sala do Diretório Acadêmico Livre do curso de Direito, no Centro da cidade. A universidade instalou câmeras no local.

A sede da reitoria foi ocupada na última sexta-feira (24), quando alunos colaram na porta de entrada cartazes com manifestações, pedindo que a reitoria adote medidas referentes aos casos. Nesta segunda, apenas funcionários terceirizados tiveram permissão para entrar no prédio.

Faixas de protesto pedem ação da universidade frente às mensagens racistas deixadas na sala do DCE da Universidade (Foto: Maurício Rebelatto/RBS TV)

Além de pedir o acompanhamento da reitoria na apuração e punição imediata dos suspeitos, os alunos pedem a implementação de disciplina obrigatória sobre cultura e história afro-brasileira em todos os cursos, a reserva de vagas para negros em cursos de pós-graduação e a criação de um centro de referência ao estudante negro.

Na nota, além de informar sobre a sindicância, a universidade diz que organizará nos próximos dias um evento para debater questões raciais e o combate a preconceitos, e que a ouvidoria passará a ter atendimento especializado em denúncias contra racismo, preconceito, discriminação, discursos de ódio, assédio e violência contra a mulher.

A instituição destaca também que tem uma política de ações inclusivas, que um sistema de reserva de vagas de pós-graduação está em análise e que as cotas já são adotadas na contratação de funcionários. Diz ainda que já adota disciplinas que tratam de relações étnico-raciais, e que “mantém o maior e mais completo programa de assistência estudantil da América Latina”.

Leia a nota na íntegra:
Nota oficial sobre reivindicações dos Estudantes Negros e DCE – UFSM

Diante das importantes pautas apresentadas, a Reitoria da UFSM informa o seguinte:
1. A UFSM instaurou um processo administrativo investigativo para apurar a autoria dos deploráveis atos racistas, de intolerância e de ódio ocorridos nos últimos meses, ao mesmo tempo em que acompanha e colabora intensamente com a investigação criminal conduzida pela Polícia Federal. Os autores, uma vez identificados, serão responsabilizados e punidos na forma da Lei e dos regulamentos internos. As notas oficiais emitidas pelo Gabinete do Reitor, repudiando veementemente estes ataques covardes, podem ser acompanhadas nas páginas oficiais da UFSM – Universidade Federal de Santa Maria e do do Gabinete nas redes sociais; os pronunciamentos do reitor à imprensa estão disponíveis no repositório UFSM na Mídia.

2. A UFSM construiu e aplica uma política de ações afirmativas (Resolução nº 11/2007 que institui o Programa de Ações Afirmativas de Inclusão Racial e Social) que é, também, referência nacional em inclusão de estudantes negros, indígenas, quilombolas, estudantes oriundos de escolas públicas e estudantes com deficiência. A partir da Coordenadoria de Ações Educacionais (CAED) e seu Núcleo de Ações Afirmativas Sociais, Étnico-Raciais e Indígenas, a UFSM acompanha e monitora o acesso, a permanência e a aprendizagem dos estudantes cotistas, visando sugerir ações e melhorias no atendimento ao Programa de Ações Afirmativas, baseando-se no princípio da redução das desigualdades educacionais e sociais, incluindo as ações de caráter homoafetivo e do etnodireito.

3. Quanto à implantação da reserva de vagas no âmbito das ações afirmativas na pós-graduação, nos termos da Portaria Normativa MEC n. 13 de 11 de maio de 2016 a UFSM vem fazendo consultas à Capes, tendo sido informada que o assunto está na presidência para análise das formas de implantação. Mesmo assim a UFSM, precavendo-se sobre a necessidade de discutir internamente, já apresentou a demanda às Coordenações de PG e está trabalhando num cronograma de discussões sobre o tema.

4. A resolução 02/2015 prevê a inserção de conteúdos sobre relações étnico-raciais, educação e diversidade, direitos humanos, educação ambiental e cidadania. Disciplinas que tratam, especificamente, das relações étnico-raciais já constam em todos os currículos dos cursos de bacharelado, na forma de Disciplina Complementar de Graduação (DCG). Para os cursos de Licenciatura, estas temáticas são obrigatórias diante das novas diretrizes doa MEC. Os cursos que já reformularam seus Projetos Pedagógicos de Curso (PPC) têm estas temáticas incluídas em disciplinas obrigatórias (até o momento, 5 cursos). Aqueles que estão em processo de reestruturação do PPC aguardam a inclusão definitiva nos respectivos currículos. Além disso, a Reitoria está negociando, junto ao MEC, vagas para docentes para trabalhar os temas transversais junto aos cursos de graduação, especificamente nas temáticas de direitos humanos, questões de gênero, étnico-raciais e meio ambiente. A UFSM também vem trabalhando no sentido de reforçar a inserção da extensão nos Cursos de Graduação onde, por intermédio da criação e implementação de projetos, as questões sociais possam ser vivenciadas e debatidas de forma mais intensa nos currículos dos cursos de graduação, com ações extensionistas de integração às comunidades.

5. Para contratação de servidores, a UFSM segue a Lei nº 12.990, de 9 de junho de 2014 que reserva aos negros 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas.

6. A Reitoria organizará nos próximos dias um evento dirigido a estudantes, servidores e gestores em todos os níveis, visando promover o debate sobre questões raciais e o combate aos preconceitos. Neste evento será constituído um comitê permanente com a participação de representação de servidores e estudantes negros e negras e lideranças da comunidade negra para discutir propostas de prevenção ao preconceito racial, bem como políticas de inclusão, dando suporte à gestão em todos os níveis, aos servidores e aos profissionais que atendem diretamente a tais demandas.

7. A Ouvidoria da UFSM passará a contar com um atendimento especializado em denúncias contra racismo, preconceito, discriminação, discursos de ódio, assédio e violência contra a mulher.

8. O processo administrativo nº 23081.018318/2016-65 é o que trata do Código Disciplinar Discente a ser proposto ao Conselho Universitário. Este código constituirá um conjunto de normas com foco em direitos e deveres dos estudantes, regulamento ainda não existente na UFSM e que, uma vez aprovado, oferecerá proteção e segurança ao direito de toda a comunidade acadêmica. Representantes da Casa do Estudante e do DCE já agregaram contribuições à minuta, que ainda recebe sugestões. Esta minuta está disponível na página oficial da UFSM. A Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (PRAE) permanecerá em diálogo com a comunidade, buscando a construção de um documento adequado à instituição e seu corpo discente.

9. A UFSM mantém o maior e mais completo programa de assistência estudantil da América Latina, tendo investido em 2016 R$ 27.000.000,00 (R$ 20.294.000,00 do PNAES e R$ 6.706.000,00 de recursos orçamentários). Além dos programas de bolsas de assistência, das 2.200 vagas na moradia estudantil gratuita, os 5 restaurantes universitários servem 8.000 refeições por dia a um custo médio de R$ 8,00 por refeição. Dos 30.000 estudantes, 4.000 se enquadram no perfil do BSE (benefício sócio-econômico) e tem suas refeições gratuitas. Portanto, um programa abrangente, inclusivo, estratégico e com volume expressivo de recursos que exige responsabilidade e racionalidade no seu uso. Na contramão disto os indicadores apontam que nos RUs são desperdiçadas, pela impossibilidade de programação precisa do número de usuários por dia, 150.000 refeições todo ano. Número alarmante, que vem exigindo ações de combate efetivo ao desperdício, seja pela responsabilidade com o uso do recurso público ou pelas questões humanitárias e de segurança alimentar geradas pela fome no Brasil e no mundo. Campanhas de conscientização vêm sendo desenvolvidas há dois anos, com participação efetiva da representação estudantil, buscando o comprometimento dos usuários com o agendamento voluntário sem, contudo, gerarem o resultado esperado. A atual campanha pode ser visualizada nas páginas da UFSM, do Restaurante Universitário UFSM e do Gabinete do Reitor.

10. Reitera, por outro lado, sua permanente disposição ao diálogo como a solução mais adequada ao atendimento das demandas da sua comunidade, colocando-se nova e permanentemente à disposição para as interlocuções necessárias.

Santa Maria, 26 de novembro de 2017
Gabinete da Reitoria – UFSM

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