O governo detalhou as medidas do pacote fiscal que foram anunciadas na noite de quarta-feira pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Entre elas estão idade mínima para aposentadoria dos militares e mudanças nos parâmetros de reajuste do salário mínimo. A estimativa oficial é de impacto de R$ 70 bilhões em dois anos. Até 2030, economia prevista é de R$ 327 bilhões. O mercado reagiu mal ao pacote e o dólar atingiu a marca de R$ 6 nesta quinta-feira.
Em paralelo, o governo anunciou a isenção de Imposto de Renda para quem recebe R$ 5 mil e o aumento da alíquota efetiva do IR para quem tem renda superior a R$ 50 mil mensais, incluindo salário, aluguel e dividendos, por exemplo.
O governo planeja enviar todas as propostas para o Congresso até o fim desta semana. Na parte de contenção dos gastos, serão uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), um projeto de lei complementar e um projeto de lei ordinária. A reforma da renda, com isenção e compensação, constarão em um projeto de lei ordinário, também a ser enviado até o fim desta semana.
Veja como foi a coletiva de imprensa:
O governo vem sendo cobrado por medidas estruturais que sinalizem compromisso com as regras fiscais, considerando que muitas despesas obrigatórias crescem em velocidade acima da permitida pelo limite de gastos. O teto tem aumento real entre 0,6% e 2,5% ao ano.
Salário mínimo
Para alcançar essa adequação, a principal medida do pacote é a limitação da valorização real do salário mínimo à mesma regra do arcabouço fiscal. No ano passado, Lula retomou a regra que reajusta o piso nacional com a inflação do ano anterior e a variação do PIB de dois anos.
No ano que vem, esse percentual seria de 2,9%. Com a proposta, ficará limitada a 2,5%. Em 2025, o impacto é de cerca de R$ 3 bilhões.
— Isso vai dar conforto para o (Ministério do) Planejamento elaborar a peça orçamentária com mais previsibilidade e de manter as despesas discricionárias, no mínimo, no nível atual ou, se tiver boa gestão, aumentar para investimentos. O objetivo dessa medida é circunscrever as despesas obrigatórias ao arcabouço fiscal — disse Haddad em entrevista coletiva.
Abono salarial para menos pessoas
Além disso, o governo quer alterar a regra de acesso ao abono salarial, espécie de 14ªº salário pago hoje para quem ganha até dois salários-mínimos (R$ 2.824). A ideia é pagar o benefício para trabalhadores com renda de até R$ 2.640 no primeiro ano de vigência da nova regra. Nos anos seguintes, a regra de acesso seria reajustada apenas pela inflação até chegar a 1,5 salário mínimo.
Pente-fino no BPC e no Bolsa Família
O governo também vai ampliar o pente-fino no Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e deficientes de baixa renda, e no Bolsa Família. No caso do Bolsa Família, haverá as seguintes mudanças:
- Biometria obrigatória para inscrição e atualização cadastral
- Atualização obrigatória para cadastros desatualizados há 24 meses
- Restrição para municípios com percentual de famílias unipessoais acima do disposto em regulamento
- Inscrição ou atualização de unipessoais deve ser feita em domicílio obrigatoriamente
Idade mínima para militares
O pacote também conta com medidas que afetam os militares, como a instituição de uma idade mínima de 55 anos para a reserva (com transição) e a limitação de transferência de pensões. Haddad já tinha dito que a previsão é de economia de cerca de R$ 2 bilhões. Segundo o secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, essa previsão considera R$ 1 bilhão em despesas e a outra metade em receitas.
Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, a transição para a idade mínima de 55 anos deve durar até o fim desta década.
Pé-de-meia e auxílio-gás
O programa educacional Pé-de-meia, que prevê pagamentos mensais e uma poupança para estudantes do ensino médio de baixa renda, deverá entrar no Orçamento a partir de 2026, afirmou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Hoje, os recursos para a política vêm do Fundo de Garantia de Operações (FGO), que está fora das regras do arcabouço fiscal.
Haddad também disse que o governo vai apresentar ao relator do projeto de lei que reformula o auxílio-gás, Hugo Leal (PSD-RJ), um substitutivo no texto para evitar um possível “drible” nas regras fiscais. As mudanças já foram alinhadas com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou o ministro.
Mudanças no Fundeb
O pacote prevê destinar até 20% da complementação da União ao Fundeb para a criação e manutenção de matrículas em tempo integral.
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) é um fundo especial, de natureza contábil e de âmbito estadual (um total de vinte e sete fundos), composto por recursos provenientes de impostos e das transferências dos estados, Distrito Federal e municípios vinculados à educação.
Os recursos do Fundeb podem ser usados, por exemplo, para pagar salários de professores, diretores, orientadores pedagógicos e funcionários da rede pública, transporte de estudantes, compra de equipamentos e material didático e mantimento de escolas.
Isenção do IR para até R$ 5 mil
Junto com o pacote, o governo também anunciou a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês. O transbordamento será limitado a quem ganha até R$ 7,5 mil. Ou seja, esses contribuintes terão isenção na parcela da renda de até R$ 5 mil e pagarão imposto sobre o restante.
Já para as pessoas que recebem acima de R$ 7,5 mil, a isenção só vai ser aplicada até o valor de dois salários mínimos, R$ 2.824 atualmente.
O recolhimento do Imposto de Renda é feito por faixas. Hoje, até R$ 2.259,20 do salário de todos não é tributado. Desse valor até R$ 2.826,65, cobra-se 7,5%.
A escadinha segue até que ganhos acima de R$ 4.664,68, que recolhem alíquota de 27,5%. Além disso, há deduções que fazem a alíquota efetivamente cobrada variar.
IR maior para quem recebe R$ 50 mil
A isenção de IR para quem recebe até R$ 5 mil vai custar de R$ 35 bilhões e será compensada com três medidas.
A principal delas é a imposição de um imposto mínimo para contribuintes com renda mensal superior a R$ 50 mil (R$ 600 mil). Vai entrar nessa conta todos os rendimentos da pessoa, como salários e alugueis, inclusive as não tributáveis, como dividendos.
Isso será verificado na Declaração Anual do Imposto de Renda. Ou seja, ao final do ano, o contribuinte vai somar todos os seus rendimentos. Se for superior a R$ 600 mil anuais, estará sujeito ao imposto mínimo. Mas a alíquota efetiva vai variar de próximo de zero a 10%, a depender da renda. A taxa de 10% será imposta a quem ganha mais de R$ 1,2 milhão por ano (R$ 100 mil por mês).
Essa medida responderá por um pouco mais da metade da compensação da ampliação de isenção do IR. O restante será neutralizado com o fim da isenção para quem tem doenças graves e ganha mais de R$ 20 mil mensais. Além disso, haverá travas para impedir planejamento tributário e elisões fiscais.
Não haverá medida específica para tributação de dividendos, que, em geral, continuarão isentos, segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan.
A ideia, segundo Haddad, é manter a neutralidade tributária, ou seja, não levar nem reduzir a arrecadação. Será encaminhado um projeto de lei com essa mudança ao Congresso.
— Um projeto de lei com a reforma da renda pressupõe neutralidade tributária. Não se trata de mexer com o nível de arrecadação. Trata-se se buscar justiça tributária. O Congresso vai ter o seu tempo para analisar (o projeto) para que a proposta entre em vigor em 1º de janeiro de 2026.
IR para fins de saúde
O governo vai limitar a possibilidade de isenção do Imposto de Renda por razões de saúde a quem ganha até R$ 20 mil mensais. É o caso de pessoas com câncer, por exemplo, que hoje são isentas do imposto, independentemente de quanto ganham e de que gastos têm com saúde.
A limitação não vai se aplicar a gastos com planos de saúde ou consultas particulares fora do plano. Nesses casos, as despesas continuarão dedutíveis na sua integralidade para todas as faixas de renda.
Se uma pessoa gasta R$ 20 mil com plano de saúde por ano ou se tem despesas com terapia (sessões com fonoaudióloga e psicóloga, por exemplo), esses gastos poderão ser deduzidos do IR a ser pago ou serão restituídos, caso o contribuinte tenha direito a restituição.