“Aquela mais escurinha” foi o termo utilizado pelo secretário para se referir à servidora
Por Jamerson Miléski Do GC Noticias
O secretário interino de Saúde da cidade de Sinop, Marcelo Klement, deverá apresentar nos próximos dias uma retratação, com uma justificativa e o pedido de desculpas pela forma como tratou uma das enfermeiras que ocupa um cargo de coordenação na secretaria de Saúde. O episódio ocorreu na segunda-feira (15), durante uma reunião na Câmara de vereadores, marcada para que Marcelo apresentasse a equipe. Após pontuar o nome e a função de cada servidor, o secretário apontou para uma das integrantes da equipe dizendo: “aquela mais escurinha” também faz parte da equipe.
O fato foi presenciado pelos vereadores que estavam na reunião. Hedvaldo Costa (PR), relatou o caso para a equipe do GC Notícias. “O secretário entrou na sala de reuniões com a equipe e começou a apresentar o pessoal, quando usou essa expressão de muito mau gosto. Do fundo do meu coração, não entendi aquilo como racismo, mas como uma brincadeira infeliz. Até falei na hora que isso era racismo [em tom descontraído], para reprender a sua fala, mas não entendi dessa forma”, comentou Hedvaldo.
Para a servidora que também está gestante, a “brincadeira” teve um pouco mais de impacto. Ainda na sexta-feira (19) ela encaminhou uma notificação extrajudicial ao secretário interino, pedindo uma retratação pela expressão ofensiva utilizada na reunião, em frente aos seus colegas e vereadores. Com medo de represálias e querendo evitar um clima ainda mais tenso dentro do ambiente de trabalho, a servidora não quis gravar entrevista. Informou apenas que a relação que possui com o secretário não tem intimidade suficiente para que essa expressão fosse utilizada sem ser ofensiva.
Marcelo falou com o GC Notícias, reconhecendo que foi uma expressão infeliz. O secretário disse que a reunião teria uma hora de duração, mas começou atrasada, faltando 20 minutos para o início da sessão da Câmara. Na pressa, acabou se referindo de forma errada à servidora. “É uma brincadeira interna nossa aqui da secretaria que eu jamais poderia ter levado pra lá, mas infelizmente cometi a gafe. Infelizmente acabou tomando essa proporção, que na minha opinião é desnecessária”, comentou Marcelo.
O secretário disse que já conversou com a servidora. Quanto a notificação extrajudicial movida pela servidora, Marcelo disse que pretende responder ainda hoje para que o inconveniente seja resolvido ainda esta semana, com um entendimento legítimo entre o ofensor e a ofendida. “Agora o clima está meio tenso, mas acredito que assim que as coisas forem colocadas as claras, tudo voltará a normalidade”, complementou.
O assunto foi repercutido durante a sessão da Câmara desta segunda-feira (23). O vereador Adenilson Rocha (PSDB), que não estava na reunião, disse que, caso o fato tenha ocorrido, o mínimo que se espera é o desligamento do servidor da função de secretário.
A expressão utilizada por Marcelo para se referir a servidora pode ser enquadrada como injúria racial – artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal – que estabelece a pena de reclusão de um a 3 anos e multa, além da pena correspondente à violência. De acordo com o dispositivo, injuriar seria ofender a dignidade ou o decoro utilizando elementos de raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. Em geral, o crime de injúria está associado ao uso de palavras depreciativas referentes à raça ou cor com a intenção de ofender a honra da vítima.
Já o crime de racismo, previsto na Lei n. 7.716/1989, implica conduta discriminatória dirigida a determinado grupo ou coletividade e, geralmente, refere-se a crimes mais amplos. Nesses casos, cabe ao Ministério Público a legitimidade para processar o ofensor. A lei enquadra uma série de situações como crime de racismo, por exemplo, recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou às escadas de acesso, negar ou obstar emprego em empresa privada, entre outros.