Segunda temporada de Atlanta tem olhar afiado sobre o racismo

Disponível na Netflix, série idealizada e protagonizada por Donald Glover dribla clichês para abordar a vida dos negros norte-americanos

Por  Ângela Faria, Do Uai

Sena da série "Atlanta", onde aparece Earn (Donald Glover) e Paper Boi (Brian Tyree Henry) sentados em um sofa
Earn (Donald Glover) e Paper Boi (Brian Tyree Henry) ‘descobrem’ a América numa boate (foto: Quantrell Colbert/ divulgação)

– Você não pode sair por aí gastando notas de 100, negão – diz Paper Boi.

– Por que não? É dinheiro americano legítimo – responde Earn.

– Olha pra você, cara! Nem se parece com traficante… Eu também acharia que a nota é falsa – argumenta Paper Boi.

– Você disse que a única coisa de que eu precisava para dominar a cidade é dinheiro – reage Earn.

– Dinheiro é uma ideia, cara! Olha, tem um motivo pro cara branco, vestido igual a você, poder entrar no banco e pegar um empréstimo, enquanto você não pode nem gastar a sua nota de US$ 100. Você tem de começar a agir como se fosse melhor do que os outros negões. Só assim eles vão começar a te tratar melhor – aconselha Paper Boi.

A segunda temporada de Atlanta, agora disponível na Netflix, é mais contundente que a primeira, que levou o Globo de Ouro de melhor série de comédia em 2017. Estão lá o mesmo humor caustico, o roteiro sem clichês maniqueístas a respeito do racismo, o olhar perspicaz sobre o cotidiano dos niggas americanos.

No episódio Alguém com grana, Earn (Donald Glover) – o jovem desencantado que abandonou a Universidade de Princeton e virou empresário do rapper Paper Boi (Brian Tyree Henry) – recebe um bom dinheiro. Finalmente, pode levar a namorada para a balada.

Pobre Earn. Sua nota de US$ 100 é recusada no cinema. A caixa diz que não há troco, embora aceite uma igualzinha do branco, que exibe o revólver assim que o jovem negro reclama. Depois, Earn e sua garota vão a um bar cool. Pagam, entram, mas o dono (negro) os expulsa, alegando que a nota é falsa. Earn argumenta, está cheio de razão. O policial (negro) o obriga a sair. Lá fora, o guarda confessa: todo mundo sabe que o dinheiro dele é de verdade.

Resta chamar Paper Boi para curtir num clube de strip. Earn até consegue trocar seus US$ 100 em notas de US$ 1 (pagando comissão de 20%). É praticamente extorquido para se divertir, cobram dele US$ 200 por uma garrafa de tequila… Cabe ao pragmático Paper ensinar regras do “american way of life” ao amigo. Dinheiro tem cor. E aquele nigga sabe muito bem como são as coisas na “terra das oportunidades”.

Donald Glover, criador e protagonista de Atlanta, também sabe das coisas. Tanto sabe que, em fevereiro, pôs água no champanhe da festa do Grammy. Nem se deu ao trabalho de buscar os quatro prêmios que seu alter ego, o músico Childish Gambino, ganhou pelo clipe This is America, um petardo contra o racismo.

Pra lá de tardio, o reconhecimento só veio agora quando empoderamento virou “mainstream”, depois de o rap negro ser esnobado, anos a fio, nas principais categorias da festa pop. Finalmente, Earn – ou Donald “Gambino” Glover – foi à forra. E não deixou barato.

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