por Sérgio Martins
Já faz um bom tempo que não me atenho em programas de televisão aberta ou fechada; tenho vivido um período de introspecção e mudança de hábitos, utilizando a internet para atualizar minhas informações diárias, abandonando o hábito de assistir os telejornais.
Outra razão de perda de contato com os programas televisivos foi a rotina de trabalho que incluía aulas noturnas que se encerravam por volta das vinte e duas horas.
Apesar deste distanciamento costumo observar a tendência dos programas humorísticos, hoje com menos qualidade, mas ainda resistente nas grades das emissoras. Um traço comum perpassa todas as propostas humoristas, a condição periférica dos comediantes negros e negras. Bom, o que não é novidade em se tratando da composição dos interlocutores nos programas de televisivos que exibem uma sociedade imaginária composto de brancos e pessoas embranquecidas como se ta imagem corresponde-se ao real contexto da sociedade brasileira. A invisibilidade dos negras e negras nos meios de comunicações sociais é vexatória, denunciando a nítida falta de oportunidade e seleção discriminatória que os profissionais negros e negras estão sujeitos.
Isso se manifesta desde a invenção do Pânico da TV, passando pelo consagrado modelo da Praça é Nossa ao Zorra Total.
Nós chamamos atenção, quando este sistema extremamente excludente, ainda lança a mão de artifícios cínicos para caricaturar um personagem negro, usando um ator branco pintado de negro para desenvolver uma paródia sobre os negros. A Adelaide do Zorra Total em termos de qualidade imaginária e humorística, se afasta e muito do famoso Azambuja, o malandro carioca e suas armações interpretado por Chico Anysio.
O personagem Adelaide do Zorra Total não é humor.
Trata-se de alguma coisa criada por mentes racistas que utiliza um conjunto de estereótipo historicamente construído pela sociedade brasileira para representar negros e negras. Isto fica claro no dialeto e nas interações sugeridas pelos quadros exibidos.
Um personagem feminino caótico,confuso em suas estórias familiares, tendo como contradição o acesso à tecnologia e sua condição de pobre e negro.
Tudo isto em um programa, onde raramente há participações de atores negros, e quando aparecem são atores históricos, tais como, Tony Tornado, Paulo Silvino, Milton Gonçalves, que participam de outros núcleos na emissora, sendo os demais meramente figurantes.
O que de lamentável é ainda nossa tolerância com tais abusos. Quando contestamos a música publicada pelo cantor humorista,hoje deputado Tiririca, quase toda sociedade se levantou para defender seu modelo centenário de racismo. Nós ganhamos, na justiça e na disputa na sociedade, porém eles sempre voltaram, e se não fizermos nada, tudo fica parecendo normal.
Entre nós, a liberdade de expressão assim como quaisquer esferas de liberdade está sujeitas ao crivo do respeito à dignidade humana.
Manter este valor em uma sociedade de origem escravocrata é um desafio permanente.
Manifeste sua indignação perante a emissora.