Fonte: O Tempo
É preciso desnudar coisas impensáveis e indizíveis na RHA
Por Fátima Oliveira
A prisão por acusações de atentados violentos ao pudor, abusos sexuais e estupros e a suspensão do registro médico de Roger Abdelmassih, 65 anos – originalmente urologista, dono de uma das mais famosas clínicas de bebê de proveta do mundo, a Clínica e Centro de Pesquisa em Reprodução Humana Roger Abdelmassih, em São Paulo -, é a ponta do iceberg para desnudar coisas impensáveis e indizíveis, tanto técnicas quanto éticas, na Reprodução Humana Assistida (RHA).
Quando um(a) médico(a) é acusado de práticas que ferem normas de convivência social, provoca ira coletiva. Desde Hipócrates, há uma conduta a respeitar sempre: a relação médico-paciente, alicerçada na confiança da sociedade nas mãos de quem entregamos o bem mais precioso, a própria vida.
Desde quando uma ex-funcionária do dr. Roger declarou ao Ministério Público de São Paulo que ele a beijou à força (18.04.08), muita água já rolou: até o inquérito sumiu! Foi encontrado no banheiro do Fórum! Em 9.1.09, a “Folha de S.Paulo” veiculou matéria dizendo que o médico estava sendo investigado. Apareceram cerca de 65 mulheres relatando crimes cruéis, de abusos sexuais a estupros. Afirmaram que os fatos ocorreram no consultório do médico, exceto um, há quarenta anos, quando a atendida por ele num plantão em Campinas foi convidada a fazer sexo e teve de aturar um pênis passeando pelo seu corpo – depoimento lapidar para que o MP pedisse a prisão dele, no último 17 de agosto, sob o argumento de que pratica crimes sexuais compulsivamente há quarenta anos. Logo, é perigoso, tanto quanto seu carimbo pessoal: “Feito pelo Dr. Roger”.
Sempre que um médico(a) é acusado(a) de desdenhar do cumprimento do dever, seja no aspecto médico ou qualquer outro, como na esfera sexual, a apuração deve ser exemplar. A categoria médica não pode pagar por crimes cometidos por sociopatas. Que as autoridades cumpram a sua parte, inclusive o Conselho Regional de Medicina de São Paulo que, por dever de ofício, cabe se antenar para a declaração de um dos médicos da equipe do dr. Roger.
O dr. Vicente Abdelmassih, filho do acusado, indagado sobre a decisão do MP de investigar procedimentos médicos irregulares no país, mas realizados pela equipe, a exemplo da escolha de sexo de bebês e o “turbinamento de óvulos” (injetar 10% de citoplasma de óvulo jovem em óvulo em senescência), respondeu: “Não é irregular. No Brasil não temos nenhuma lei que regulamenta os procedimentos de reprodução assistida. O que a gente tem é uma norma do Conselho Federal de Medicina, de 1992, que tem algumas diretrizes. Mas não fala nada a respeito disso”. O entrevistador insistiu: “Mas vocês chegaram a fazer”? “Sem dúvida. Chegamos a fazer. É um procedimento técnico, mas é cada vez menos utilizado porque em termos de resultado estatístico não melhora muito” (FSP, 21.8.09).
O “procedimento técnico” foi vendido aqui como algo testado e aprovado para rejuvenescer óvulos. Jacques Cohen, do Institute for Reproductive Medicine and Science of Saint Barnabas, inventor da técnica (1998), disse que era “o primeiro caso de modificação do código genético humano que resultou no nascimento de uma criança saudável (2001)”. Não há mudança de genes, mas “mistura” de duas fontes de DNA mitocondrial: uma quimera!
De fato a RHA, um campo minado de procedimentos experimentais e inseguros, no Brasil ainda é terra de ninguém. É abusivo que o Ministério da Saúde não tenha elaborado uma norma técnica sobre RHA até hoje.
Matéria original:Sociopatas não são doentes, seus crimes devem ser punidos