Taís Araújo sobre racismo: “As pessoas não percebem nossa dor”

Em depoimento emocionante durante o evento Mulheres na Mídia, em São Paulo, a atriz lembrou o abismo social e racial presente em nossa sociedade

Foto: Mariana Pekin/CLAUDIA

Por  Isabella Marinelli Do Claudia

Às vésperas do Dia Internacional da Mulher, nesta terça-feira (07), CLAUDIA apresenta o Mulheres na Mídia: evento com cinco paineis para debater a representatividade e presença feminina em diversas áreas da comunicação, com patrocínio da Seara.

No terceiro quadro, abordamos o papel da mulher no entretenimento. Nossa diretora de redação, Tatiana Schibuola, conversou com Daniela Mignani, diretora do GNT; Maria Clara Spinelli, atriz; Patricia Kamitsuji, managing director na Fox Warner Brasil; Taís Araújo, atriz; e Vera Egito, roteirista de cinema.

Durante sua fala, Araújo reacendeu a discussão sobre o racismo no Brasil e a dificuldade de se combater os preconceitos que continuam perpetuados dia após dia.

“Eu sou o Brasil. Eu sou a exceção que só serve comprovar a regra. [Me sinto sozinha] Totalmente. Eu fui pinçada, escolhida para ocupar esse espaço. Quando olho para trás, vejo que não tem o mesmo investimento. Na minha empresa [Globo], dentro da Editora Abril. Não tem o mesmo investimento nas minhas colegas, assim como que tem em mim. Só eu faço as capas das grandes revistas. No fim do ano passado, até fiz um post com todas as meninas negras, dizendo que queria vê-las nas capas também. Se não, meu trabalho não tem valor.

Ver que existem outras meninas [nesses espaços] é ver que meu trabalho valeu.

O grito é fundamental, é necessário. É igual ao Oscar. [No ano passado, a premiação sofreu duras críticas por não haver candidatos negros]. O Oscar deste ano é resultado da quizumba que aconteceu no ano passado. Quantos “Moonlights” devem ter sido feitos e nem ficamos sabendo? Para os padrões deles, foi um barato de se fazer e é o filme mais lindo que já assisti na minha vida. Por isso grito é fundamental.

Quando eu fiz [a novela] Chica da Silva, as pessoas faziam o que queriam comigo. Eu era um fantoche. Não fui educada nem preparada para falar, ou me expor. Eu fui silenciada a minha vida inteira. E olha que eu fui uma menina que morou na Barra da Tijuca (bairro nobre do RJ).

Não ter “pares” é muito ruim e é um reflexo disso. Meu filho não tem pares na escola dele. Lá,  oferecem três cores de camisa: verde, azul e cinza – os funcionários usam cinza. O Lázaro decidiu comprar a cinza, porque as outras sujam demais. Meu filho virou e disse: eu estou igual ao funcionário da escola. Aí, pensamos: ‘Meu Deus, e agora?’. O Lázaro, então, comprou uma camisa cinza da escola. Vestiu e, quando meu filho questionou, ele disse que era para provar que a roupa usada por uma pessoa não define quem ela é.

Meu filho já percebeu a dureza que é esse país, aos 5 anos de idade. Ele já percebeu dizem o tempo todo que o lugar dele não é no é no banco da escola – ao menos, não naquela escola.

As mulheres brancas não percebem o que acontece com a gente, e não é maldade. Existe a questão do privilégio branco, mas também uma isenção em pensar nas nossas causas. Quem inventou o racismo e o perpetuou, não fomos nós. E só se pergunta de racismo para a gente.

Lanço essa reflexão para as mulheres brancas: está tudo bem para vocês viver em uma sociedade tão diferente para a gente e para vocês? Está bacana?

A mudança tem que vir. Então, mulheres que são sensíveis às nossas causas, eu convido vocês a militarem com a gente, a saber e reconhecer que há um abismo entre nós.”

Assista ao painel:

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