The Favela is Here! Por Mauricio Pestana

Por Mauricio Pestana

Historicamente, o racismo no Brasil sempre foi confundido com questões econômicas, embora vários estudos comprovem o contrário. Ainda é comum ouvirmos a frase: “Se tiver dinheiro no
bolso, não existe racismo”.

O futebol é um exemplo de que isso não é verdade. No inconsciente coletivo a discriminação primeiramente se faz pela raça e, depois, pela questão social. A história do futebol no Brasil foi marcada por casos de discriminação.

No início do século 20, várias agremiações não admitiam negros. Times que hoje gozam de grande prestígio popular, inclusive com a população negra, obrigavam seus jogadores negros a passarem pó de arroz no rosto para parecerem mais brancos em seus agrupamentos.

Contrapondo a essa discriminação, surgiram na época clubes populares que passaram não só a admitirem negros, mas também a ter uma forte identificação com operários e começaram a se diferenciar dos clubes da elite branca.

Num conflito não estabelecido que misturava questões raciais e sociais, surgiu também neste período (consciente ou inconscientemente), nas massas de torcedores, a associação desses clubes mais
populares entre os pobres, os trabalhadores e a periferia menos afortunada, como clubes dos torcedores pretos.

Não por um acaso que clubes como o Flamengo – que tem como mascote o urubu – e mesmo o Corinthians, que tem o mosqueteiro como sua mascote, foram constantemente associados a um torcedor favelado, sem educação e negro.

Isso ganhou força da metade para o fim do século 20. No caso corintiano, a marca e a simbologia de torcedor preto, da periferia e sem educação são usadas, inclusive, em piadas discriminatórias, personagens humorísticos e também na crônica esportiva para diferenciá-lo de Palmeiras e São Paulo,
seu maiores arquirrivais.

O primeiro seria ressaltado sua origem italiana, o famoso Palestra Itália. O segundo ficaria marcado por sua sede no Morumbi, tradicional bairro da elite branca paulistana. Do Corinthians foi esquecida sua influência na colônia espanhola, pois o importante é associar o clube à periferia, aos pretos e nordestinos da cidade.

O preconceito evidenciou-se em parte da crônica esportiva na forte oposição que o setor fez quando da decisão da construção e abertura da Copa do Mundo, em Itaquera (região periférica da cidade onde está sendo construído o futuro estádio do timão).

As críticas foram das mais pesadas e preconceituosas ao clube e ao bairro no qual se concentra o maior conjunto habitacional da América Latina, a Cidade Tiradentes, considerado um dos bairros mais negros da cidade. Essa discriminação também foi evidenciada na campanha presidencial de 2002, quando a pouca escolaridade e a origem nordestina do candidato Lula foram também associadas ao clube de coração do presidente, o Corinthians.

Na última campanha contra José Serra, sempre foi ressaltada por esses setores a origem do “psdebista” e suas fortes ligações com o Palestra, uma demonstração de preconceito.

Da mesma forma que os torcedores mais populares do Palestra Itália renegaram a simbologia imposta por sua história e assumiram o porco (apelido dado por torcidas rivais) como seu símbolo, a torcida corintiana assumiu a favela, o estilo maloqueiro e preto como suas marcas, suas origens, reforçando aí a garra e a determinação corintiana.

Neste início de século 21, em que a periferia entrou em moda, em que o primeiro operário (por sinal, corintiano), se tornou o presidente do País, em que um negro se tornou o primeiro presidente dos Estados
Unidos, foi também o período em que o clube corintiano conquistou os títulos mais importantes de sua história.

A faixa erguida no Japão pelo técnico corintiano Tite – “_ e favela is here” (A favela é aqui) – marcou não só uma postura que há décadas o time e a torcida das mais populares do mundo vêm assumindo, mas também um novo momento em que e o planeta mostra que a distância entre a favela e a mansão, o preto e branco, o Brasil e o Japão não é mais tão grande.

E que em 2013 esses caminhos continuem se encurtando política e socialmente.

*Maurício Pestana é diretor executivo da RAÇA BRASIL.

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