E ela só é mal amada porque é mulher. Sou uma delas e posso dizer que sou, sim, muito mal amada.
por Luíse Bello no HuffPost Brasil
O título alarmante é pra chamar atenção mesmo e dizer que eu concordo com este que é o argumento mais batido daqueles que querem atacar o feminismo. É verdade. Toda feminista é mal amada. E ela só é mal amada porque é mulher. Sou uma delas e posso dizer que sou, sim, muito mal amada.
Sou mal amada porque, se eu não casar até uma certa idade, ninguém mais vai me querer
Certamente não sou amada por uma sociedade que me condena se eu preservar a minha sexualidade (Puritana! Fresca! Cu doce! Sonsa!) e me condena se eu vivê-la livremente (Puta! Vagabunda! Piranha!); não sou amada por homens cada vez mais exigentes em aparência física e que dão notas de 0 a 10 para o meu corpo, analisando se sou digna ou não de sua afetividade; não sou amada pelas mulheres que, vítimas dessa realidade, me veem como ameaça, como inimiga, como alguém que está com inveja do que elas têm ou são ou, pior, como alguém que quer roubar o companheiro delas; não sou amada por uma conjuntura social em que as minhas roupas são vistas como determinantes da minha personalidade; não sou amada numa cidade sitiada por tarados, na qual devo evitar ruas, roupas e horários para não ser atacada; não sou amada por aqueles que culpam as mulheres em caso de assédio ou estupro contra elas.
Nem se eu engordar, nem se eu emagrecer demais, nem se eu for muito poderosa (porque isso ~assusta~), nem se eu for muito submissa, nem se eu for muito inteligente, nem se eu for muito burra
Sou mal amada porque, se eu não casar até uma certa idade, ninguém mais vai me querer! Nem se eu engordar, nem se eu emagrecer demais, nem se eu for muito poderosa (porque isso ~assusta~), nem se eu for muito submissa, nem se eu for muito inteligente, nem se eu for muito burra, nem se eu não me depilar, nem se eu falar palavrão, nem se eu gostar de sair à noite, nem se eu quiser compromisso sério, nem se eu não quiser compromisso sério. Não sou amada quando querem que eu, solteira, namore (só por namorar, só por ter alguém, só pra ter um homem que me ~assuma~); namorando, que eu case; casada, que tenha filho; com um filho, que tenha mais; com mais, que eu tome cuidado pra não embarangar e perder o marido. Não sou amada quando me dizem pra ter cuidado, hein, senão ele arranja outra!!!
A publicidade, então, me odeia! Afinal, não me vejo nos anúncios e sempre me pedem para mudar, seja meu cabelo, meu carro, minha cerveja, meu absorvente, minha barriga, meu molho de tomate, meus sapatos, meu hálito, meu refrigerante, meu provedor de internet, sempre me lembrando de que, assim, eu vou ficar mais gostosa, mais atraente, mais feliz, mais segura, mais tranquila -e menos eu. Porque, não adianta, eu nunca tô 100%. Eu nunca sou suficiente. Como, então, posso me sentir amada?
Não sendo o caso, sou mal amada e, sendo assim, só me resta ser feminista.
Se eu fosse amada (veja bem, não digo nem BEM amada, o que seria muito melhor. Só amor já ajudaria!), não reclamaria; não me sentiria feia, nem gorda, nem deslocada, nem magra, nem incapaz. Poderia circular livremente pelas ruas da minha cidade vestindo o que eu bem entendesse, sem que ninguém se sentisse no direito de opinar sobre o meu corpo ou me dissesse o que gostaria de fazer com ele. Ah, se eu fosse amada, seria valorizada em qualquer setor que eu desejasse trabalhar. E leria publicações femininas que falassem mais sobre mim, e menos sobre o que querem os homens. Se eu fosse amada, realmente, em todos os aspectos da minha vida, eu definitivamente não precisaria ser feminista, nem lutar por condições mínimas de liberdade para a mulher.
Não sendo o caso, sou mal amada e, sendo assim, só me resta ser feminista.