Todo dia é dia

ONU escolheu o 20 de março como a data internacional da felicidade. Ideia é lembrar que bem-estar não é só dinheiro

Por Flávia Oliveira, do O Globo

Foto: Marta Azevedo

A sexta-feira já ia longe quando a ficha caiu. Era Dia Internacional da Felicidade. Se não fui feliz, será que dá tempo? E o pensamento voou. Tudo culpa da ONU. Foi a Organização das Nações Unidas que, três anos atrás, plantou a caraminhola mundo afora. Em 2012, numa reunião com os 193 países-membros, o Butão sugeriu e a data vingou. O pequeno país asiático localizado entre a China e a Índia já se ocupava do tema havia quatro décadas. Foi pioneiro em sobrepor o bem-estar à riqueza financeira. O rei Jigme Singya Wangchuck decidiu, em 1972, que crescimento econômico não deveria ser o único objetivo de uma sociedade. Faltavam à equação variáveis psicológicas, sociais, culturais, ambientais e também espirituais. Nasceu assim o conceito de Felicidade Interna Bruta (FIB), sob as bênçãos do Pnud, agência da ONU para o desenvolvimento. A semelhança com o Produto Interno Bruto (PIB) não é mera coincidência.

Para o Dia da Felicidade, a ONU montou até trilha sonora. O secretário-geral, Ban Ki-moon, escolheu a canção “Signed, sealed, delivered”, de Stevie Wonder, e convidou a humanidade a fazer o mesmo, sob a hashtag #HappySoundsLike (“Como soa a felicidade”, em tradução livre). Djavan, Flávio Venturini, Geraldo Azevedo e Maria Rita foram alguns dos artistas brasileiros que convidaram fãs a aderirem à campanha.

A ONU já lançou duas edições do Relatório Mundial de Felicidade (WHR, na sigla em inglês), a primeira, em 2012. “Ranqueou” 156 países, com base numa pesquisa aplicada pelo Gallup. A Dinamarca encabeça a lista do Relatório 2013; Togo fecha; o Butão entrará na próxima edição. O Brasil aparece em 24ª, na frente da França. É país mais rico que feliz, já que está entre as dez maiores economias do planeta. Tem mais felicidade que desenvolvimento humano. É que o Brasil figura em 79º no IDH, termômetro de bem-estar criado pelo indiano Amartya Sen, Nobel de Economia em 1998. O indicador tem como base estatísticas de renda, escolaridade e esperança de vida.

O FIB é mais ambicioso. Leva em conta, além do padrão financeiro, indicadores de saúde, educação, cultura, meio ambiente, governança, bem-estar psicológico e uso do tempo. Este último nunca fez tanto sentido no Brasil, em particular no eixo Rio-São Paulo. Não dá para ser feliz com tanto engarrafamento e tão pouca qualidade nos transportes de massa.

Dois economistas da FGV-SP, Fabio Gallo Garcia e Wesley Mendes da Silva, trabalham desde 2012 na criação de um índice de bem-estar para o país (WBB, do inglês Well Being Brasil). Na primeira pesquisa, em 2013, consultaram 786 pessoas na capital paulista. A satisfação média com a vida atual, numa escala de um a cinco, ficou em 3,69. Àquela altura, o otimismo era maior com o futuro, que marcava 4,19. A intenção é estender o levantamento a outras regiões.

Conceitos e métricas à parte, felicidade é matéria subjetiva. Varia de irmão para irmão. Os economistas já sabem que, sem uma quantidade mínima de dinheiro, é impossível ser feliz. Mas também confirmaram que todo o dinheiro do mundo não traz felicidade. É meta diária, incessante. A colunista aqui, faz tempo, jurou que viverá tentando. Até a noite derradeira. A ONU estabeleceu o 20 de março como Dia da Felicidade e o 21 como Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial. Caiu ontem. Mas cada amanhecer é pretexto para ser feliz e combater o preconceito. A data é sempre hoje.

 

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