Vamos celebrar o Dia do Professor

Expansão excessiva do EaD aprofunda problemas de formação já existentes

Frase pintada pelo coletivo 'Nós Artivistas' em Heliópolis no Dia do Professor de em 2021, centenário do nascimento de Paulo Freire - Ricardo Yamanoto/Divulgação

A primeira professora que lembro ter me marcado foi a do 3º ano do ensino fundamental. Tia Gabi nos tratava com muito carinho e dedicação. Eu gostava especialmente das suas aulas de matemática. Foi com ela que aprendi a escrever cheque, habilidade obsoleta agora, quase três décadas depois.

Ela foi a primeira, mas não a única professora a deixar marcas na minha trajetória. Muitas foram positivas e influenciaram minhas escolhas profissionais; outras foram negativas, com experiências que prefiro esquecer.

Na terça-feira (15), celebramos o Dia do Professor, momento em que homenagens inundam as redes sociais. A docência é uma profissão com impacto profundo na formação dos indivíduos e na construção da sociedade. No entanto, essa profissão, muitas vezes vista como vocação altruísta, ainda passa por desafios estruturais para ser reconhecida como profissão, não heroísmo.

A formação inicial é um desses desafios. Na última década, dobrou o percentual de concluintes de cursos voltados para a formação docente na modalidade a distância (EaD). Essa expansão excessiva contribuiu para aprofundar problemas já existentes. A modalidade compromete a qualidade da preparação docente por não comportar a prática em sala de aula, essencial para a profissão. Vale a pena ampliar o acesso ao ensino superior se não estão sendo formados profissionais capazes de exercer a profissão?

Para enfrentar a situação, o MEC homologou em maio novas diretrizes curriculares para pedagogia e cursos de licenciaturas. A resolução limita o EaD a no máximo 50% da carga horária dos cursos de formação de professores. Instituições que apostaram exclusivamente no modelo a distância criticaram a decisão, alegando que pode gerar um apagão de profissionais.

Mas a realidade é que o déficit está mais relacionado à baixa atratividade da carreira e à evasão nos cursos, que chega a 70%, do que à falta de vagas. Apenas um terço dos licenciados realmente ingressa na carreira docente. O verdadeiro desafio não está na quantidade de formandos, mas na falta de profissionais qualificados e motivados a permanecerem na profissão.

A formação de professores exige um equilíbrio entre teoria e prática, o que dificilmente se alcança em um curso predominantemente a distância. Formar docentes é complexo: a prática supervisionada e a vivência em sala de aula são indispensáveis. Ao garantir que pelo menos 50% da carga horária seja presencial, o MEC busca melhorar a qualidade da formação e aproximar a preparação dos futuros professores das demandas reais do ensino básico.

A implementação das novas diretrizes do MEC é um passo importante, mas não suficiente. A solução para o apagão de professores qualificados passa por uma transformação estrutural na carreira docente que precisa ir além de limitar o EaD. É necessário criar um ambiente que atraia, prepare e retenha os melhores talentos na sala de aula.

Afinal, sem professores preparados e valorizados, não há futuro para a nação. A valorização tem de ir além do post na rede social para que todas as professoras e professores deixem marcas positivas em seus alunos.


Priscilla Bacalhau – Doutora em economia, consultora de impacto social e pesquisadora do FGV EESP CLEAR, que auxilia os governos do Brasil e da África lusófona na agenda de monitoramento e avaliação de políticas

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