‘Vim chorar aqui’: Índios fazem ato no Ministério da Justiça contra revogação de demarcações

Aos 56 anos, o cacique guarani-kaiowá Farid Mariano, do Mato Grosso do Sul, perdeu a conta de quantas vezes veio a Brasília, de ônibus, em busca de confirmações sobre demarcações das terras onde nasceram seus tataravós.

Por Ricardo Senra Do BBC

“Nós estamos acampados há oito anos. Só falam que vão demarcar e não demarcam. Viemos aqui conversar com esse novo governo federal para ver se dão alguma solução para a nossa comunidade.”

Junto ao cacique, um grupo de 60 indígenas do povo guarani-kaiowá protestou, na manhã desta quarta-feira, em frente ao Ministério da Justiça, onde despacha o novo ministro Alexandre de Moraes.

Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, Moraes afirmou que irá rever “demarcações de terras indígenas que foram feitas, se não na correria, no apagar das luzes”.

Ele se refere a decretos assinados pelo governo da presidente Dilma Rousseff dias antes de seu afastamento pelo Senado, onde agora é alvo de um processo de impeachment.

O despacho mais recente aprovava estudos para demarcação em uma área de 55.590 hectares, na região de Dourados, no sul do Mato Grosso do Sul, tradicionalmente ocupada pelos guarani-kaiowá.

Segundo a Funai, estudos antropológicos identificaram ali quatro territórios tradicionais – Javorai Kue, Pindo Roky, Urukuty e Laguna Joha. Atualmente, mais de 50 mil guarani-kaiowás vivem em uma área equivalente a 0,2% do território do MS e ainda aguardam sua regularização.

_89734616_indiobrasilia

Carta

À BBC Brasil, Teresinha Maglia, porta-voz do Ministério da Justiça, disse que protocolou uma carta entregue ao ministro pelos indígenas.

“O documento foi recebido e acabei de protocolar no protocolo do ministro. Ele ainda não respondeu se receberá os indígenas amanhã ou sexta-feira porque está em uma reunião”, afirmou.

Horas depois, em conversa com os indígenas, a representante da pasta disse que um “especialista” receberia os manifestantes até o fim da semana. Os indígenas insistiram em falar diretamente com Alexandre de Moraes e afirmam que permanecerão em Brasília até que o encontro ocorra.

Representantes do CIMI (Conselho Indigenista Missionário) acompanharam toda a manifestação, que ocupou a entrada lateral do ministério.

_89734618_indiosministériodajustiça

“A própria fala do ministro dá indícios de que poderia haver a revisão de atos feitos no final da administração. Alguns (índios) estão há mais de 5 anos esperando e essa sinalização de revogação é um retrocesso de algo que já é moroso e demorou demais”, afirmou Gilberto Vieira, representante do conselho.

A subprocuradora-geral da República, Debora Duprat, disse ao jornal O Globo na última segunda-feira que a revisão de demarcações só é permitida quando há erros no processo e que não acredita ser este o caso neste momento.

“Vim chorar aqui para o ministro para dar para nós nossas terras, onde papai e mamãe morreram, e eu quero voltar lá”, afirmou a indígena Adelaide Moraes à reportagem.

“Já foi publicado e agora querem engavetar de novo”, disse seu conterrâneo M’taeroe.

Alexandre de Moraes, ministro da Justiça, não nega as revogações, mas afirma que “qualquer revisão será feita em total diálogo” com as populações afetadas.

+ sobre o tema

Ex-vítimas de trabalho escravo ganham vida nova em estádio da Copa

José Divino da Silva, de 58 anos, ainda...

PNUD vai lançar atlas com IDH de municípios brasileiros dia 29 de julho

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) vai lançar...

Desigualdade é o maior desafio da América Latina e Caribe, diz ministro brasileiro em reunião da ONU

“O vínculo entre desenvolvimento social e direitos humanos deve...

“Meia dúzia de índios e alguns vagabundos pintados”

sugerido pelo Pedro Brandão, no Facebook O deputado...

para lembrar

Classe média antipetista irá pagar em breve o preço de apoiar Temer

O colunista Jânio de Freitas, em artigo publicado na...

Campanha #MaisQueImigrante visa desconstruir xenofobia dos brasileiros

Até o fim do mês, projeto reunirá relatos, fotos...

Anistia Internacional e juízes criticam Estado brasileiro por mortes em Manaus

A Associação Juízes para a Democracia (AJD), criticou o...

Nova Política de Drogas com Nathália Oliveira

“Justificando Entrevista” começa neste 2017 com o debate mais...
spot_imgspot_img

Ministério da Igualdade Racial lidera ações do governo brasileiro no Fórum Permanente de Afrodescendentes da ONU

Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, está na 3a sessão do Fórum Permanente de Afrodescendentes da ONU em Genebra, na Suíça, com três principais missões: avançar nos debates...

Conselho de direitos humanos aciona ONU por aumento de movimentos neonazistas no Brasil

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, acionou a ONU (Organização das Nações Unidas) para fazer um alerta...

Ministério lança edital para fortalecer casas de acolhimento LGBTQIA+

Edital lançado dia 18 de março pretende fortalecer as casas de acolhimento para pessoas LGBTQIA+ da sociedade civil. O processo seletivo, que segue até...
-+=