Violência, racismo e intolerância da PM em Ilhéus exigem ação pública

 

I – Da Constituição de 1988.

Art.5º, VI– é inviolável a liberdade de consciência e crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias.

O inciso VIII estatui que ninguém será privado de seus direitos por motivo de crença religiosa.

  

II – Do Código Penal. 

Título V, Cap. I, Dos Crimes contra o Sentimento Religioso: 

Ultraje a culto e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo 

Art.208 do CP – Escarnecer de alguém publicamente por motivo de crença ou função religiosa, impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso, vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:

Detenção – 1mês a 1ano, ou multa.

Parágrafo Único. Se há emprego da violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.

 

Ao

Secretário de Segurança Pública do Governo do Estado da Bahia, Antonio Cesar Fernandes Nunes

Secretária da Casa Civil do Governo do Estado da Bahia, Eva Maria Chiavon

Secretária da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Estado da Bahia, Luciana Tannus da Silva

Secretária de Promoção da Igualdade do Governo do Estado da Bahia, Luiza Bairros

Secretária de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza do Governo do Estado da Bahia, Arany Santana Neves Santos

 

Queremos expressar, como cidadãs e cidadãos do Brasil e de outros países solidários, nossa indignação e pedido de providências com relação aos fatos a seguir relatados, que denunciam episódios de violência que agridem vários direitos humanos e, em especial, a liberdade religiosa:

 

RACISMO, INTOLERÂNCIA RELIGIOSA, VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER, ABUSO DE AUTORIDADE E TORTURA

Sábado dia vinte e três de outubro de 2010, por volta das 14hs, um pelotão da Polícia Militar da Bahia invadiu o assentamento D. Helder Câmara, em Ilhéus, levando a comunidade de trabalhadores e trabalhadoras rurais a viverem um momento de terror, tortura e violência racial.

Os fatos: A coordenadora do assentamento e sacerdotisa (filha de Oxossi) Bernadete Souza, questionou sobre a ilegalidade da presença do pelotão da Polícia Militar na área do assentamento, por ser este uma jurisdição do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e, portanto, a polícia sem justificativa e sem mandato judicial não poderia estar ali; menos ainda, enquadrando homens, mulheres e crianças, sob mira de metralhadoras, pistolas e fuzil, o que se constitui numa grave violação dos Direitos Humanos. Diante deste questionamento, o comandante alegando “desacato a autoridade” autorizou que Bernadete fosse algemada para ser conduzida à delegacia. Neste momento o orixá Oxossi incorporou a sacerdotisa que, algemada, foi colocada e mantida pelos PMs Júlio Guedes e seu colega identificado como “Jesus”, num formigueiro, onde foi atacada por milhares de formigas provocando graves lesões, enquanto os PMs gritavam que as formigas eram para “afastar satanás”. Quando os membros da comunidade tentaram se aproximar para socorrê-la um dos policiais apontou a pistola para cabeça da sacerdotisa, ameaçado que se alguém da comunidade se aproximasse ele atiraria. Spray de pimenta foi lançado contra os trabalhadores. O desespero tomou conta da comunidade. Crianças choravam e idosos passavam mal. Enquanto Bernadete (Oxossi), algemada, era arrastada pelos cabelos por quase 500 metros e em seguida jogada na viatura, os policiais numa clara demonstração de racismo e intolerância religiosa, gritavam “fora satanás”! Na delegacia da Polícia Civil, para onde foi conduzida, Bernadete ainda incorporada e bastante machucada, foi colocada algemada em uma cela onde havia homens, enquanto policias riam e ironizavam que tinham chicote para afastar “satanás”, e que os Sem Terras fossem se queixar ao Governador e ao Presidente.

A delegacia foi trancada para impedir o acesso de pessoas solidárias a Bernadete, enquanto os policias regozijavam-se, relatando aos presentes que lá no assentamento além dos ataques a Oxossi (incorporado em Bernadete), também empurraram Obaluaê manifestado em outro sacerdote, atirando o mesmo nas máquinas de bombear água. Os policias militares registraram na delegacia que a manifestação dos orixás na sacerdotisa Bernadete se tratava de insanidade mental.

A comunidade D. Hélder Câmara exige Justiça e punição rigorosa aos culpados e conclama a todas as Organizações e pessoas comprometidas com a nossa causa.

Contra o racismo, contra a intolerância religiosa, contra a violência policial, contra a violência à mulher, pela reforma agrária e pela paz.

Informe produzido pelo Projeto de Reforma Agrária D. Hélder Câmara e pelo Terreiro Ylê Axé Odé Omí Wa.

Demonstre a sua indignação enviando este manifesto para os e-mails das autoridades do Governo de Estado da Bahia, relatadas acima:

, [email protected], [email protected], [email protected],

 

 

Entidades de Direitos Humanos encaminham petição sobre violência em Ilhéus

As Entidades de Direitos Humanos, reunidas no Seminário Nacional de Indicadores de Direitos Humanos promovido pelo INESCSOCIAL WATCH, enviam documento a Conselhos e Ouvidorias solicitando imediatas providências no que se refere aos crimes de tortura, discriminação racial, abuso de autoridade, violência contra mulher e intolerância religiosa, que foi cometida por agentes do Estado os Policiais Militares do Batalhão de Polícia da cidade de Ilhéus contra a Sacerdotisa Bernadete de Souza no último dia

No anexo, a Petição do “Caso” de Ilhéus e os protocolos de entrada nas ouvidorias em Brasília.

 

EXMO. SR. DR. OUVIDOR DA SECRETARIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.

EXMO. SRA. DRA. OUVIDORA DA SECRETARIA NACIONAL DE POLÍTICAS PARA MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.

EXMO. SR. PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA.

EXMO. SR. OUVIDOR DA SECRETARIA DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL.

EXMO. SR. PRESIDENTE DO CONSELHO DE DEFESA DOSD DIREITOR DA PESSOA HUMANA.

 

As Entidades de Direitos Humanos, reunidas no Seminário Nacional de Indicadores de Direitos Humanos promovido pelo INESCSOCIAL WATCH, por meio deste documento solicitam imediatas providências no que se refere aos crimes de tortura, discriminação racial, abuso de autoridade, violência contra mulher e intolerância religiosa, que foi cometida por agentes do Estado os Policiais Militares do Batalhão de Polícia da cidade de Ihéus contra a Sacerdotisa Bernadete de Souza.

Direitos Humanos

O Conceito de Direitos Humanos é o resultado de uma evolução do pensamento filosófico, jurídico e político da humanidade. É importante reconhecer a sua evolução e observarmos como o mesmo se constrói através das vozes e esforços dos milhões de homens e mulheres, uma vez que, a concepção de direitos humanos se baseiam em amplas e profundas raízes históricas, basta vermos que diversas religiões  e culturas contém princípios de direitos humanos embora muitas vezes tenham práticas incompatíveis com esses mesmos direitos.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos tem sido aplicada por meio de um grande conjunto de convenções e declarações internacionais, algumas vinculadas e outras declarações políticas em que os Estados Membros da ONU – Organização das Nações Unidas – se comprometem a seguir estas legislações. Os direitos humanos são definidos na Declaração Universal de Direitos Humanos, no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e no Pacto Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Culturais que o Brasil é signatário.

DA CONSTITUIÇAO FEDERAL

O artigo 5o, inciso IX do Crime de Racismo.

Já o inciso XIII aponta o racismo como crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão nos termos da lei. Isso foi uma verdadeira vitória na tentativa de amenizar a triste realidade social brasileira, repleta de casos discriminatórios.

O Brasil é signatário do Programa de Ação da Conferência Mundial Contra o Racismo ocorrida em 2001 em Durban que recomenda medidas enérgicas em casos relacionados à pratica de racismo, discriminação e intolerâncias correlatas incluindo também a prática da Intolerância Religiosa, neste caso  agravada  pelos Agentes do Estado.

A Sacerdotisa Bernadete de Souza foi vítima da perversidade dos Agentes do Estado, Policiais Militares do batalhão de Polícia de Ilhéus tais como; VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL, uso abusivo da força através do constrangimento e exposição pública.

Tal prática foi cometida principalmente frente aos grupos mais vulneráveis como crianças, adolescentes, mulheres e idosos presentes no assentamento.

Crime de Tortura

A Sacerdotisa Bernadete de Souza foi submetida à prática de crime de tortura quando foi colocada sobre um formigueiro, provocando dor, sofrimento e humilhação. A lei brasileira nº. 9455, de 7 de abril de 1997, define que é crime de tortura constranger ou causar sofrimento físico e mental a alguém com emprego de violência ou grave ameaça, seja com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa, seja para provocar ação ou omissão de natureza criminosa, ou ainda em razão de discriminação racial ou religiosa, constituindo essa prática um delito inafiançável e insuscetível de graça ou anistia. O inciso III do artigo 5o prioriza que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante. A tortura, como diz José Afonso da Silva, não é só um crime contra o direito à vida, mas sim, uma crueldade que atinge todas suas dimensões, e a humanidade como um todo. O direito internacional também cuida do assunto, definindo em declarações, convenções, pactos e protocolos firmados entre nações, que o motivo é o elemento que distingue e diferencia tortura de tratamento desumano ou cruel.

Violência de gênero

A violência sofrida pelo fato de se ser mulher, sem distinção de raça, classe social, religião, idade ou qualquer outra condição é produto de um sistema social que subordina o sexo feminino.

Uma vez que foi também colocada numa cela juntamente com outros homens na Cadeia Pública de Ilhéus, com aval do Delegado de Polícia.

Intolerância Religiosa

A Sacerdotisa Bernadete Sousa foi vítima de Intolerância Religiosa, praticada pelos agentes do Estado da Bahia, pois no meio da tensão que se estabeleceu por parte das autoridades policiais ao entrar em um Assentamento de Reforma Agrária do Governo Federal e administrado pelo INCRA (documento anexo), a mesma foi tomada “incorporou” o Orixá Oxossi e ainda assim foi algemada e através de frases como: “está possuída por Satanás”, “vamos tirar o Satanás dela na porrada” e “sabemos como tirar estes demônios do seu corpo” foi colocada sob um formigueiro, conforme consta em fotos anexas, chegando mesmo a perder os sentidos e ainda assim ser arrastada por aproximadamente 600 metros e ter uma arma apontada para a sua cabeça e ao chegar na delegacia foi colocada em uma cela com um homem e algemada a uma barra de ferro. As ações dos Policiais Militares, ora representando o Estado foram motivadas contra a crença e religiosidade da vítima, atingindo assim a honra, a integridade física e a moral e desrespeitando a Constituição Federal de 1988.

Art.5º, VI- é inviolável a liberdade de consciência e crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias e o Art.208 do Código Penal – Escarnecer de alguém publicamente por motivo de crença ou função religiosa, impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso, vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso. Trazendo a monta a importância da laicidade do Estado e do Princípio de Garantia de Liberdade Religiosa.

Sendo assim diante dos fatos ocorridos conforme documentos anexos, solicitamos providências urgentes, uma vez que temos um Programa Nacional de Direitos Humanos, às Resoluções da Conferência Nacional de Segurança Publica, as Recomendações do Planapir – Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial e o Plano Nacional de Políticas para Mulheres.

Assinam este documento.

Coletivo de Entidades Negras/CEN

Fala Preta!

Dom da Terra/Fórum Paranaense das Religiões de Matrizes Africanas

Terra de Direitos

Instituto de estudos Socioeconômicos/Inesc

Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos/FENDH

Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

Intervozes

Plataforma Dhesca Brasil

Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente/ANCED

Conectas Direitos Humanos

Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares/GAJOP

Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza

Conselho Nacional de Mulheres Indígenas

Social Watch

Cáritas

 

Documento encaminhado pelo Memorial Lélia Gonzalez

Fonte: Koinonia

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