13 de maio – Assinada a Lei Áurea

Lei Aurea

O Brasil está livre do trabalho escravo. Na tarde de ontem, a Princesa Isabel sancionou a lei que pôs fim a mais de 300 anos de escravidão. Conforme o senador  Sousa Dantas, havia no país 600 mil escravos. Levantamento do Império mostra que, no ano passado, eram mais de 700 mil. A Lei João Alfredo, mais chamada de Lei Áurea, foi aprovada em tempo recorde na Câmara dos Deputados e no Senado, apesar dos protestos dos poucos parlamentares contrários à abolição.

Calcula-se que cerca de 5 mil pessoas se concentraram diante do Paço da Cidade, para acompanhar a solenidade de assinatura. O povo irrompeu em aplausos quando o  deputado Joaquim Nabuco, de uma sacada, comunicou que não havia mais escravos no Brasil. Em uma das janelas, Dona Isabel foi aclamada pelos manifestantes.

O Imperador Dom Pedro 2 º , que se encontra gravemente enfermo em Milão, na Itália, onde se submete a tratamento de sáude, ainda não sabe da sanção da lei. Por meio do telégrafo, a notícia já chegou à várias províncias do País e nações americanas e européias.

Uma primeira tentativa de proibir o tráfico de negros

Com poucos efeitos práticos, a Lei Eusébio de Queiroz, a do Ventre Livre e a dos Sexagenários antecederam a Lei Áurea. Em 7 de novembro de 1831, a Câmara dos Deputados promulgou uma lei que proibia o tráfico de escravos africanos.

13 de maio

O texto, resultado de acordo do Brasil com a Inglaterra, estabelecia que todos os escravos que entrassem no território ou portos do Brasil vindos de fora ficariam livres. Porém, o último desembarque de escravos africanos no país só ocorreria em 1855, no litoral de Pernambuco.

Os 14 anos entre a intenção e a realidade foram a sobrevida daquilo que José Bonifácio de Andrada e Silva chamou de “cancro mortal que ameaçava os fundamentos da nação”. O ato de 1831 foi um primeiro passo, mas ineficaz.

A turbulência política em várias províncias impediu que o governo central fizesse cumprir a lei durante as duas décadas seguintes.

Só com a pressão política e militar inglesa o cenário se modificou. Em 1845, o Parlamento em Londres aprovou lei (o Bill Aberdeen) que dava à Marinha inglesa o direito de aprisionar navios negreiros, mesmo em águas territoriais brasileiras, e julgar seus comandantes.

O governo brasileiro não resistiu à pressão e o ministro da Justiça de Dom Pedro 2º, Eusébio de Queiroz, enviou projeto ao Parlamento que determinava a apreensão de navios que traficassem escravos. A Lei nº 581, de 4/9/1850, conhecida como Lei Eusébio de Queiroz, considerava criminosos o dono do navio, o capitão e seus subordinados, além do pessoal em terra que participasse do comércio ilegal.

Para burlar a lei, fazendeiros incentivaram o tráfico interno, tirando escravos de áreas em que a agricultura decaía, como os engenhos de açúcar do Nordeste, para as lavouras de café no Centro-Sul. Mas foi aprovado, em 1854, a Lei Nabuco de Araújo (ministro da Justiça), que previa sanções para as autoridades que encobrissem o contrabando de escravos.

Com o fim do tráfico, progressivamente os imigrantes europeus começaram a substituir a mão-de-obra servil.

Ordem do dia de hoje, segundafeira, 14 de maio de 1888, às 11h

Terceira dita da proposta da Câmara dos Deputados n. 42, de 1887, aprovando a pensão de 1$4000 diários aos menores irmãos
do 2º sargento do Corpo Militar da Polícia da Corte Antonio Nery de Oliveira Araújo, para que votou-se dispensa de interstício.

Segunda dita do projeto do Senado letra S de 1887 determinando que a disposição do parágrafo 1º do artigo 1º do Decreto nº 3.300, de 9 de outubro, não é aplicável ao ministro do Supremo Tribunal de Justiça que exercesse já semelhante cargo e tivesse mais de 72 anos de idade.

Lei dos Sexagenários foi fruto de acordo político

Muita negociação política entre liberais e conservadores foi necessária para que a Câmara dos Deputados aprovasse outro projeto
antiescravagista enviado pelo governo imperial à Assembléia Geral. Sancionada pelo Imperador Dom Pedro 2º com o nº 3.270,
em 28 de setembro de 1885, a Lei dos Sexagenários também ficou conhecida como Saraiva-Cotegipe, em referência aos dois chefes
do gabinete ministerial do Império, o liberal conselheiro Saraiva e o conservador (e mulato) Barão de Cotegipe, que deram apoio
à medida.

Na verdade, a iniciativa é do ano anterior, 1844, proposta pelo senador Sousa Dantas, então chefe de gabinete. Muito mais abrangente, ao fixar os 60 anos como idade limite para o escravo, não prevendo qualquer tipo de indenização aos proprietários, o projeto foi violentamente torpedeado pelos escravocratas no Parlamento, a ponto de causar a queda do gabinete e a dissolução da Assembléia Geral.

A lei sancionada no ano seguinte continha diversas normas para regular a extinção gradual do elemento servil. Eram libertados os
escravos que completassem 60 anos, com a obrigação de prestar serviços, a título de indenização ao senhor, pelo prazo de três anos. O maior de 65 anos ficava liberado de tais trabalhos.

A crítica dos abolicionistas à lei era aos limitados efeitos práticos, pois os poucos que chegavam a essa idade já não tinham condições de garantir seu sustento.

Dom Pedro 2º defendeu a Lei do Ventre Livre

Nasceu da vontade de Dom Pedro 2º o projeto da Lei do Ventre Livre, elaborado pelo gabinete conservador do Visconde do Rio Branco em 27 de maio de 1871.

Em sua Fala do Trono, dias antes, na abertura do ano legislativo, o Imperador antecipara que “considerações da maior importância aconselham que a reformada legislação sobre o estado servil não continue a ser uma aspiração nacional indefinida e incerta”.

Por vários meses, deputados dos partidos Conservador e Liberal discutiram a proposta. Quatro meses depois, em 28 de setembro,
transformou-se na Lei nº 2.040, assinada por Dona Isabel. Os defensores dessa lei afirmavam que ela, juntamente com a proibição do tráfico negreiro, assegurava a extinção gradual da escravidão. Já os donos de escravos acusavam o governo de querer provocar uma crise econômica.

As controvérsias foram desproporcionais aos seus efeitos práticos. A lei deu liberdade aos filhos de escravos nascidos a partir daquela data, mas os manteve sob a tutela dos seus senhores até os 21 anos.

Segundo essa norma, os filhos menores ficariam “em poder e sob a autoridade dos senhores de suas mães”, os quais deveriam criá-los até os 8 anos. Nessa idade, o senhor optava entre receber do Estado indenização de 600 mil réis ou de utilizar-se dos serviços do menor até 21 anos.

– A verdade é que a lei, ao libertar os bebês, estabeleceu ao mesmo tempo que até os 21 anos eles permaneceriam em poder do senhor. Na prática, até essa data, continuavam escravos – analisou Joaquim Nabuco.

Princesa Isabel assina a Lei Áurea

 

Texto possui apenas dois artigos e já está em vigor tanto na Corte como nas províncias.

Princesa Isabel

 

Desde a tarde de ontem, dia 13, está extinto em todo o Brasil o trabalho escravo, prática das mais cruéis e condenáveis que foi permitida legalmente no país por mais de 300 anos. Menos de três horas depois da aprovação do projeto pelo Senado do Império, a  princesa Regente Dona Isabel, com uma pena de ouro ofertada pelo povo, sancionava em solenidade no Paço da Cidade a já chamada Lei Áurea.

É opinião generalizada que a Pátria se tornou realmente livre com o ato que retirou o Brasil da condição de única nação do Ocidente que ainda explorava o elemento servil. Estima-se que mais de 600 mil negros foram beneficiados pela lei.

Poucas vezes nos seus 62 anos de funcionamento a Assembléia Geral produziu uma lei com extraordinária rapidez como a que acaba de emancipar os escravos. Foram só seis dias de tramitação da mensagem, não obstante a tentativa dos parlamentares antiabolicionistas de imporem obstáculos à adoção de urgência para a matéria.

Nos debates na Câmara e no Senado se enfrentaram, quer defendendo, quer atacando o projeto, alguns dos maiores tribunos do país.

Sorriso e lágrimas

A fisionomia da Princesa Regente, sempre expressando contentamento pelo ato que acabava de assinar, às vezes dava ares de preocupação, em virtude da gravidade do estado de saúde de seu augusto pai, que está em tratamento na cidade italiana de Milão, sob os cuidados de três dos melhores médicos europeus.

Confiante em que o Senado aprovaria a proposta nesse domingo, Dona Isabel, que se  encontrava em Petrópolis, dirigiu-se de trem de ferro logo após o meio-dia para o Rio de Janeiro. Acompanhada de seu esposo, o Conde d’Eu, e dos ministros do Império, Costa Pereira, e da Agricultura, Rodrigo Silva, Sua Alteza chegou ao Paço por volta das 14 horas, recebendo demorados aplausos do público.

Coube a uma comissão de senadores, tendo à frente Sousa Dantas, entregar à Princesa Regente o autógrafo do projeto, cujo texto foi transformado numa verdadeira peça de arte pelo conhecido calígrafo Leopoldo Heck. Na oportunidade, Dantas felicitou Dona Isabel “por caber-lhe a glória de assinar a lei que apaga dos nossos códigos a nefanda mácula da escravidão, como já lhe coube a de confirmar o decreto que não permitiu nascerem mais cativos no Império (a Lei do Ventre Livre)”. Falando em seguida, sem conter as lágrimas, Dona Isabel declarou:

– Seria o dia de hoje um dos mais belos de minha vida se não fosse saber estar meu pai enfermo. Deus permitirá que ele nos volte para tornar-se, como sempre, útil à nossa Pátria.

Participaram da cerimônia, na Sala do Trono, senadores, deputados, ministros, magistrados, embaixadores e outras personalidades, além de gente do povo que, em verdadeiro delírio, invadiu o palácio.

Em frente ao edifício, na Praça Dom Pedro 2º, cerca de 5 mil pessoas se aglomeravam. A multidão irrompeu em ruidosas aclamações quando o deputado Joaquim Nabuco, de uma sacada do Paço, comunicou ao povo que não havia mais escravos no Brasil. Chamada pelos

cidadãos que se concentravam diante do palácio, Dona Isabel surgiu numa janela, sendo mais uma vez aclamada pelos manifestantes.

Dom Pedro 2º ainda não foi informado

D. Pedro II

O Imperador Dom Pedro 2º, que se encontra em Milão, na Itália, onde se submete a  tratamento de saúde, ainda não pôde ser informado da lei que baniu de nosso país o regime de escravidão.

Transcrevemos, a respeito, os seguintes telegramas:

Milão, 12 – O estado de S.M. o Imperador apresenta uma pequena melhora.

Os fenômenos cerebrais cessaram após delírio intenso. Agora está em plena integridade de suas faculdades mentais. Atribui-se esse resultado à aplicação de gelo na cabeça e às injeções hipodérmicas de cafeína, receitadas pelo Dr. Semmola.É esperado o Dr. Charcot.

Milão, 13 – O estado de S.M. o Imperador apresenta progressivas melhoras, conforme o boletim dos médicos assistentes. Os Drs. Charcot, Semmola, e Giovani declaram em oletim que a febre tem declinado quase totalmente e que o estado nervoso do augusto enfermo é calmo.

Bandas animam festejo nas ruas

Concebida para abolir de forma imediata e incondicional o elemento servil no País, a mais importante e mais humana norma legal já adotada pelo Brasil, e que recebeu o número 3.353, contém apenas dois dispositivos:

“Art. 1º É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil.

“Art. 2º Revogam-se as disposições em contrário”.

Assim que a Câmara recebeu o texto – na terça-feira dia 8 – das mãos do ministro Rodrigo Silva, o deputado Joaquim Nabuco, lançando mão de recurso regimental, solicitou ao presidente daquela Casa, deputado Henrique Pereira de Lucena, a designação imediata da comissão especial que daria o parecer transformando a mensagem em projeto. Sob os  protestos do deputado conservador Andrade Figueira, o parecer foi acolhido pela Câmara no mesmo dia 8, seguindo-se, nos dias 9 e 10, a discussão e aprovação.

Da mesma forma agiu o Senado, nomeando em 11 de maio a comissão especial, cujo parecer foi votado no mesmo dia. Ontem, dia 13, ocorreu a aprovação final, mediante votação simbólica. Pessoas que se encontravam nas galerias jogaram flores no Plenário.

Apenas dois senadores se manifestaram contrários à matéria: o Barão de Cotegipe e Paulino de Sousa. Quando o Senado concluía a deliberação sobre a proposta, chegava ao Plenário a notícia de que alguns fazendeiros fluminenses já estavam libertando seus escravos.

Soar de sinos

Em razão da grande concentração de pessoas na praça, só com muita dificuldade as carruagens que levavam a comissão de senadores e o presidente do Ministério, senador João Alfredo, conseguiram chegar às portas do Paço, sob aplausos dos manifestantes. Na ocasião, soaram os sinos das igrejas do Rio, três delas situadas perto do palácio: as de São José, de Nossa Senhora do Carmo e da Capela Imperial.

Depois de sancionada a lei, intensificaram- se os festejos e passeatas pelas ruas do Rio de Janeiro, em meio a bandas de músicae espocar de foguetes. Ao entrar na Rua do Ouvidor, após deixar o Paço, o veterano abolicionista Sousa Dantas foi carregado nos braços do povo.

Pena será exposta

A pena de ouro com que a Princesa Regente assinou o decreto da abolição da escravatura ficará exposta a partir do dia 21 de maio no salão do jornal O Paiz. A pena, que tem no dorso 43 brilhantes, traz a seguinte inscrição: “A D. Isabel, a redentora, o povo agradecido”, e tem no lado oposto o número e a data da Lei Áurea.

A campanha de subscrição iniciada por aquele diário logo recebeu a adesão da Revista Ilustrada.

Abolição repercute nas províncias e no estrangeiro

O milagre da ciência e da técnica neste final do século 19, de que é exemplo o telégrafo, com a ajuda dos cabos submarinos, fez com que a notícia da abolição chegasse rapidamente à maioria das províncias brasileiras e a grande parte das nações americanas e européias.

Habitantes de São Paulo, Santos, Campinas, Salvador, Recife, Vitória, Belém, Ouro Preto, Fortaleza e outras cidades saíram às ruas em procissões cívicas, não faltando bandas de música e fogos. À noite, edifícios públicos e particulares da capital paulista foram iluminados.

Das capitais das províncias e do exterior chegam a toda hora ao Rio telegramas de congratulações. Em Buenos Aires, foi decretado feriado a próxima quintafeira, para grande festejo cívico em honra do Brasil livre. O Senado argentino e a corporação acadêmica telegrafaram a Dona Isabel, felicitando-a.

Fonte: Transcrição do documento em PDF chamado “Encarte Abolição” publicado pelo Senado.

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