Grupos secretos em rede social viram comunidades de apoio entre mulheres

Perdida dos amigos e preocupada por haver bebido demais, a estudante Mika Franco, 19, pediu ajuda a três grupos de meninas em uma festa. Ninguém a socorreu. Estava longe de casa, em Barretos (a 423 km de SP), nos “Jogos Jurídicos”, competição esportiva de faculdades de direito.

Por Angela Boldrini e Juliana Gragnani, no Paraíba.com

Mas encontrou Nariman Gonzales, 21. Ela acalmou Mika e a deixou em segurança em seu hotel. Enquanto ajudava a nova amiga, perguntou: “Você é uma pepeka?”.

“Pepeka” é como são apelidadas as integrantes do grupo feminino de Facebook “Share Your PPK” (compartilhe sua pepeca), comunidade secreta –só entram indicadas por amigas– cujos laços extrapolam a internet.

“Na hora, eu comecei a chorar”, conta Mika, que diz ter se sentido acolhida quando soube que ambas eram do grupo. Criada em 2015, a comunidade reúne 22 mil jovens mulheres (de 15 a 30 anos) para falar sobre sexo, relacionamentos “e, acima de tudo, se empoderar”, diz sua descrição.

Grupos de Facebook viraram redes de apoio entre usuários, com debates e dicas de serviço. Entre as mulheres, fortaleceu-se a ideia de “sororidade” –aliança entre elas.

Se as “pepekas” estão sobretudo em SP e a maior parte é adolescente, em Curitiba 202 mil entre 30 e 50 anos são “Alices”, apelido nascido no grupo secreto “Clube da Alice”, criado no Facebook para que mulheres compartilhassem trabalhos que vendem.

Com câncer de mama e dor nas pernas, a secretária Fabiana Ribeiro, 35, ouviu do médico que deveria fazer caminhadas. “Mas não ia ter forças para caminhar sozinha”, diz. Postou o dilema no grupo. Na manhã seguinte, 14 mulheres desconhecidas a esperavam num parque perto de casa.

“Não acreditei. Comecei a chorar.” Desde então, as 15 mulheres se encontram todos os dias para caminhar juntas.

Em certa ocasião, 17 “Alices” que também não se conheciam foram à casa da designer Thayza Melo, 39, para ajudá-la a empacotar objetos depois que ela pediu ajuda.

FEMINISMO E APOIO

No “Share Your PPK”, jovens publicam mensagens como: “Ppks, estou numa formatura e fiquei menstruada. Alguma outra ppk está aqui e pode me dar um absorvente?”.

“Pepekas” se juntam para jogar futebol. Quatro partidas já aconteceram, com cerca de 20 delas. A próxima é neste domingo (1º). “Tentamos quebrar o tabu de que mulher não sabe jogar”, afirma a atacante Luciana Louzas, 19.

Vítimas de abuso compartilham suas histórias anonimamente –enviam textos para as moderadoras, que os publicam. As jovens respondem com mensagens de apoio.

“Acompanhamos a participação dessas meninas e vemos que vão ficando cada vez mais fortes. Às vezes se identificam e dão apoio a outras que passaram por experiências semelhantes”, diz a jornalista Amanda Previdelli, 26, uma das criadoras do grupo.

“As comunidades funcionam quando há acolhimento”, diz Jackeline Giusti, psiquiatra da Infância e Adolescência do Hospital das Clínicas. “Mas não servem para fazer diagnóstico ou tratamento, trabalho de profissionais.”

No “SYPPK”, há ainda debates sobre feminismo –meninas dizem que, nesse sentido, a rede mudou suas vidas. Mas há brigas e problemas com “prints” –quando uma publicação vaza a partir de um registro da tela. “Quando descobrimos quem vazou, expulsamos”, diz Previdelli.

No total, 10 mil meninas esperam para entrar –as administradoras verificam todos os perfis e meninas negras têm prioridade. O objetivo é diversificar o grupo.

Dele, derivaram dezenas de pequenas redes, como a “Share your FitTip” –com dicas de exercícios–, o “Esquerdeusas” –para debater política– ou ainda grupos étnicos, como o das “pepekas” árabes ou o das judias.

O “Clube da Alice” está virando uma empresa capitaneada por Thayza, uma das administradoras, e a criadora do grupo, Monica Balestieri, 46. As duas distribuem carteirinhas às “Alices” e vendem espaços on-line a empresas que queiram dar descontos.

Folha de São Paulo

+ sobre o tema

Adolescente lança campanha contra cyberbullying após ser vítima de estupro

A história da adolescente Jada, americana de 16 anos,...

Oito de Março para Luana e Veronica

As mulheres negras elegeram o 25 de Julho; e...

Conselho de Psicologia proíbe profissionais de realizar ‘cura’ de travestis e transexuais

Entidade determina que não sejam feitos pronunciamentos que legitimem...

para lembrar

Mulheres criam página na internet para denunciar mortes em hospital do RJ

Perdas no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, no Acari, são...

Calar é preciso

Sem a possibilidade de parar no Dia Internacional da...

“A pedofilia está tão enraizada que a Igreja teme uma hecatombe”

Sara Oviedo é coautora do relatório da ONU que...
spot_imgspot_img

Universidade é condenada por não alterar nome de aluna trans

A utilização do nome antigo de uma mulher trans fere diretamente seus direitos de personalidade, já que nega a maneira como ela se identifica,...

O vídeo premiado na Mostra Audiovisual Entre(vivências) Negras, que conta a história da sambista Vó Maria, é destaque do mês no Museu da Pessoa

Vó Maria, cantora e compositora, conta em vídeo um pouco sobre o início de sua vida no samba, onde foi muito feliz. A Mostra conta...

Nath Finanças entra para lista dos 100 afrodescendentes mais influentes do mundo

A empresária e influencer Nathalia Rodrigues de Oliveira, a Nath Finanças, foi eleita uma das 100 pessoas afrodescendentes mais influentes do mundo pela organização...
-+=