África: potencial de 300 milhões de pessoas

Após uma década, os africanos conseguiram romper a recessão, fizeram os ajustes estruturais necessários



Com uma classe média de 300 milhões de habitantes, duas vezes maior do que a classe C brasileira, a África está de portas abertas para o mundo, para consumir produtos e serviços, abrigar novas empresas, gerar e produzir riquezas. Após quatro décadas marcadas por guerras, por conflitos internos e enfermidades, os africanos iniciaram, nos últimos 12 anos, um novo processo de crescimento econômico e social, transformando-se em grande oportunidade de investimentos externos diretos para o Brasil e para o Ceará.

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“Após uma década, os africanos conseguiram romper a recessão, fizeram os ajustes estruturais e macroeconômicos necessários, organizaram a questão fiscal, sanearam a economia e hoje mantém inflação em torno de 4,5%, ao ano. Esses são dados que falam por si”, aponta o professor titular da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores, José Flávio Sombra Saraiva.

Palestrante da tarde de ontem, do Fórum Brasil África, Saraiva avalia que os brasileiros têm uma oportunidade única de fazer convergir a elevação da economia do Brasil com a elevação do patamar histórico da África, na economia mundial. “Esse é o primeiro ciclo histórico da África em que o PIB, de 2001 a 2012, mantém crescimento médio, anuais, de 5,5% a 6%. Isso significa elevação da renda média do africano”, alerta.

Último eldorado

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Nesse cenário de crescimento econômico continuado, ele aponta os setores mineral e vegetal como áreas de grandes oportunidades para o Brasil e para qualquer outro país que decida investir na África.

Conforme expôs, as reservas minerais são da ordem de 35% de manganês, 25% de ferro da terra, 50% de diamantes. “Isso tudo está sob a maior base do planeta de commodities minerais, o que já atraiu a cobiça do industrialismo chinês e da economia americana”, destaca Saraiva.

Ele aponta, ainda, terrenos de serrados e savanas, semelhantes ao do Centro-Oeste brasileiro, campo fértil para a soja e frutas brasileiras, além da grande biodiversidade florestal para fármacos, que também podem ser explorados pelo Brasil. “Tudo isso quem diz é o relatório do banco mundial, que aponta o país africano como “o último eldorado da Terra”, explica o professor.

Ceará

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Especificamente em relação ao Ceará, ele avalia que o setor produtivo cearense tem muito espaço para avançar no mercado africano. Ele cita as áreas de tecnologia de caju e da castanha, a experiência com mel de abelha, nos setores têxtil e alimentício, de doces diversos, “que são adorados do outro lado do atlântico”.

“O turismo, o artesanato semi- industrial são áreas que também devem ser estimuladas. Temos que imaginar operações nesses campos, porque ainda não podemos competir com a indústria chinesa”, defende Saraiva.

Por sua vez, Sombra lembra que os chineses aportaram na África em 1998, enquanto os brasileiros só agora começam, a despertar às oportunidades e o potencial do mercado africano.

Corrida à África

Para Flávio Sombra, todos esses fatores vêm justificando uma corrida à África, nos últimos anos. Segundo ele, o Brasil está no “jogo”, mas ainda de forma tímida. Situação que poderia ser melhorada, conforme disse, com esforço mais objetivo do ponto de vista do financiamento, do desembaraço aduaneiro, da cooperação do governo brasileiro. “Os investimentos ainda são modestos”, aponta.

Reconhece, porém, que ainda há uma institucionalidade baixa na África, riscos maiores do que o do mercado interno do Brasil, o que faz com que os investidores brasileiros só se estimulem a investir no continente africano, com isenções e benefícios fiscais.

Para ele, “outro grande entrave ainda é a logística. Esse é um gargalo que só se resolve com apoio público-privado”, conclui.

Economia
5 por cento tem sido o crescimento médio anual, nos últimos 12 anos, do Produto Interno Bruto (PIB), do continente africano
4,5 por cento é a inflação média da África, nos últimos anos, após uma série de ações macroeconômicas

Faltam linhas de navegação

Um círculo vicioso impede o avanço do comércio bilateral entre o Brasil e o continente africano: não há linhas de navegação entre os dois mercados porque não há produtos, e não há produtos porque não há linhas de navegação. Na prática, os produtos nordestinos, em especial, que chegam aos países da África têm que ir à Europa para depois descerem para o destino final, tornando o seu custo bem maior. A discussão desta problemática ocorreu ontem durante o Fórum Brasil-África.

“A questão da logística ainda é complicada. Hoje, se vai a Roterdã, na Holanda, desce para as Ilhas Canárias e, de lá, para os portos africanos. Isso é uma loucura. Tem algumas linhas que vão a Portugal, e essas têm um trajeto mais curto, porém a maioria vai para o porto número um do Ocidente, que é Roterdã. Nós temos que acabar, temos que atravessar o Oceano Atlântico direto. Daqui pra Cabo Verde, ou pras Canárias, e depois descer para os portos africanos”, defende o superintendente do Centro Internacional de Negócios (CIN), Eduardo Bezerra.

Solução

Segundo ele, uma ação mais direta da Secretaria Especial dos Portos (SEP) poderia solucionar o problema. “Eu creio que se o ministério, mais precisamente Leônidas Cristino (ministro da SEP), que é cearense, se ele tomasse a iniciativa de financiar por um certo período o prejuízo que houvesse no deslocamento de navios entre o Nordeste do Brasil e a África, nós poderíamos cobrir isso em pouco tempo. Entre seis meses e um ano, tendo as linhas, os produtos aparecerão. Aí, não haveria mais necessidade de subsídio”, sugere.

“O Brasil está muito próximo da África, mas está muito distante. Nós temos um oceano que nos separa, que pode ser transpassado de forma muito rápida, muito eficiente, mas a realidade não é essa hoje”, reforça o coordenador do Fórum Brasil-África e professor de comércio exterior da Unifor, João Bosco Monte.

De acordo com Bosco, a dificuldade que existe para que as cargas brasileiras, notadamente as nordestinas, cheguem ao continente africano têm desestimulado os empresários locais. “Nós temos uma logística que nos maltrata bastante, maltrata o empresário, que precisa pagar um preço muito caro para que as suas mercadorias cheguem aos portos africanos. E muitos não chegam, não ultrapassam esta dificuldade, porque não há uma operação eficiente”, afirma.

Canal do Panamá

O professor aponta também para as oportunidades que advirão com a ampliação do Canal do Panamá, prevista para 2014, permitindo que navios de até 120 mil toneladas possam fazer a travessia (hoje são 70 mil toneladas). “Os navios que saem da África, que podem sair de lá, passando pelo Nordeste do Brasil e indo em direção à Ásia via Canal do Panamá, podem ser uma grande operação. O Brasil então precisa oportunizar”, diz.

Acrescenta que o governo federal, os estaduais, os municipais, precisam olhar para os seus parceiros na África. Observando essa vocação e essa demanda que o Canal do Panamá vai oferecer, tirar proveito.

 

 

 

 

Fonte: Diário do Nordeste 

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