“As memórias tinham sido publicadas em 1912 e 1913 na Gazeta de Notícias, mas, na coleção da Biblioteca Nacional, faltavam esses exemplares. Localizamos os jornais na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo”, relata Marco. A nova edição – as anteriores foram em 1959, 1963, 1979 e 1986 – incorpora a ficha de João Cândido na Marinha, revelada em 2008, e notas, que ajudam na contextualização dos fatos, além de fotos dos rebelados.
O movimento envolveu mais de 2,3 mil marinheiros, a maioria negros e mulatos pobres, nos navios Minas Gerais, São Paulo, Bahia e Deodoro, na Baía de Guanabara, de 22 a 27 de novembro de 1910. Edmar o batizou de Revolta da Chibata. A frota naval do Brasil, na época, era a terceira maior do mundo, o que ajudou a dar peso à rebelião.
Alguns marujos, como o próprio João Cândido, tinham acompanhado a construção de um dos navios, o Minas Gerais, no estaleiro Vickers-Armstrong, em New Castle, na Inglaterra, aprendendo a manobrá-lo. Isso foi fundamental para o sucesso inicial.
A rebelião foi desencadeada pelo castigo imposto ao marinheiro Marcelino Rodrigues Meneses: 250 chibatadas no Minas Gerais, cujo comandante, capitão-de-mar-e-guerra Batista da Neves, foi morto, assim como outros oficiais e alguns marujos.
No primeiro dia, os marinheiros enviaram manifesto ao presidente Hermes da Fonseca reivindicando o fim do chicote, aumento de soldo e demissão dos oficiais “indignos”. Uma anistia encerrou a revolta, mas, dias depois, foi revogada. Muitos revoltosos foram expulsos, presos, torturados, fuzilados. João Cândido foi parar no Hospital de Alienados.
“As pessoas sofriam perseguições por escrever sobre a revolta”, conta Morel. Após o golpe de 64, ele próprio teve direitos cassados. “Meu avô não conseguia emprego nas redações dos grandes jornais e recebia ameaças por telefone e por carta”, conta Marco.
Em 2008, o presidente Lula sancionou a anistia a João Cândido e os companheiros.Uma estátua do líder da rebelião saiu dos jardins do Museu da República, no Rio, e foi para a Praça XV. Uma proposta da indenização aos descendentes, contudo, foi vetada e, na Marinha, ainda há animosidade. Quase 40 anos após a morte de João Cândido (1969), o Almirante Negro permanece maldito.