Racismo institucional e saúde das mulheres negras

Ao estudar mulheres negras, é importante considerar que estamos falando de um grupo historicamente invisibilizado, marcado por estereótipos

Este artigo tem como objetivo refletir sobre o racismo institucional (RI) e suas implicações na saúde das mulheres negras. O racismo e a discriminação de gênero têm efeitos diversos na sociedade, o que significa que existem restrições específicas aos direitos da população vitimada, e no caso das mulheres negras também se considera o duplo preconceito. Estudos mostram que as mulheres negras possuem o pior acesso e qualidade de atendimento médico, fruto do racismo institucional.

O RI é uma das maiores dificuldades à garantia do direito à saúde, para as mulheres negras, dificultando não apenas o acesso, mas a assistência à saúde, que deveria garantir e efetivar as políticas públicas equânimes. Para Macedo (2018), a desigualdade racial e suas repercussões na saúde refletem o RI, que vai contra os princípios e normas do SUS e das políticas públicas de saúde da mulher negra.

Ao estudar mulheres negras, é importante considerar que estamos falando de um grupo historicamente invisibilizado, marcado por estereótipos. Sua inferiorização baseia-se em um contexto em que características como cor da pele e sexo, passam a legitimar sistemas de hierarquização sociais denominadas racismo e sexismo. A representação das mulheres negras tem origem na escravidão. Como aponta Lélia Gonzalez (1984), é preciso entender que o racismo produz duplo impacto nas mulheres negras, contribuindo para a criação de estereótipos como mulata, mucama, mãe preta e por aí vai. “Para a mulher negra, o lugar que lhe é reservado é o menor. O lugar da marginalização. O lugar do menor salário. O lugar do desrespeito em relação a sua capacidade profissional”. (Gonzalez, 1989),

Para Nathalia Roberto (2016), a combinação racismo e machismo potencializa a posição de fragilidade social na qual as mulheres negras se encontram, reforçando o descaso institucional. O RI e seus impactos na alocação de recursos de maneira geral são elementos estruturais da desigualdade social no Brasil. Como a população negra apresenta os piores indicadores sociais, o impacto e a extensão dessa diferenciação racial são reconfirmados através de estatísticas. A violência física e simbólica aplicada à população negra ao longo de todo o processo histórico acarreta, muitas vezes, a negação de sua alteridade, como aponta Luciana Jaccoud: “A presença do racismo, do preconceito e da discriminação racial como práticas sociais, aliadas à existência do racismo institucional, representam um obstáculo à redução daquelas desigualdades, obstáculo este que só poderá ser vencido com a mobilização de esforços de cunho específico” (Jaccoud 2008, p. 137).

Jurema Werneck, médica e feminista negra brasileira, especifica como o racismo institucional se manifesta, nas estruturas organizacionais da sociedade priorizando os interesses do grupo hegemônico, negligenciando e deslegitimando as necessidades dos outros, limitando suas oportunidades e acesso aos serviços. E ela acrescenta: “O racismo expõe as pessoas a riscos enormes. Seja na hipertensão, diabetes, seja na gravidez, no parto, seja na saúde neonatal infantil. Expõe. Está exposto. Foram criadas piores condições de vida aquelas pessoas, tá cara que vai ter impacto na saúde, o sistema finge que não tem, isso é uma camada do racismo institucional. Esta cegueira ou esse deixar acontecer, fingir que não está acontecendo” (Werneck, 2020).

A falta de políticas públicas que considerem especificidades das mulheres negras afeta sua saúde potencializando agravos e doenças. As iniquidades em saúde relacionadas a demandas sociais econômicas e de gênero afetam muito mais as mulheres negras, ao interseccionalizar racismo, gênero e condição econômica. É preciso reconhecer as vulnerabilidades das mulheres negras, para determinados agravos e doenças, compreendendo que, além das doenças de ordem genéticas, o racismo atua como um importante determinante nas condições de vida e acesso das delas aos serviços de saúde. Portanto, é de profunda importância debater o racismo institucional e seus impactos na saúde das mulheres negras.

*Ana Carla Vidal Teixeira é formada em história, mestranda em sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e integra a Associação Cultural de Mulheres Negra (Acmun)

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