Candidatos ignoram combate ao racismo em debates em SP, 2ª capital mais desigual do país

Tema ocupou menos de 1% do tempo desses programas, ainda que planos de governo incluam políticas antirracistas

As políticas de combate ao racismo foram praticamente ignoradas até agora nos debates dos candidatos à Prefeitura de São Paulo.

Os encontros ficaram marcados por trocas de acusações, discussões acaloradas e até um episódio de agressão física, deixando de fora propostas reais para a cidade.

Em sete embates dos candidatos (TV Bandeirantes, Terra/O Estado de São Paulo/Faap, Veja/ESPM, TV Gazeta/MyNews, TV Cultura, RedeTV!/UOL e SBT/Terra/rádio Novabrasil), apenas seis minutos foram dedicados ao tema —menos de 1% da soma do tempo desses programas, segundo levantamento pela Folha.

A questão racial foi tratada diretamente na pergunta feita por uma jornalista no evento promovido pelo portal Terra, a Faap e o jornal O Estado de S. Paulo.

Pablo Marçal (PRTB) e Tabata Amaral (PSB) foram questionados a respeito da aplicação da lei 10.639, de obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas. Marçal respondeu que irá aplicar a lei e Tabata disse que avançar na educação antirracista é parte de seu plano de governo.

A desigualdade não é questão menor na cidade. O Ifer (Índice Folha de Equilíbrio Racial) aponta que a capital paulista tinha o pior indicador de equidade entre negros e brancos em 2012. Apesar de um avanço, dez anos depois a cidade era a segunda pior capital em termos de equilíbrio racial no país.

“A questão racial tem ganhado mais espaço nas discussões políticas, mas ainda está longe de ter uma inclusão cuidadosa nos planos de governo. Em algumas cidades, especialmente nas maiores capitais, o tema é mais visível, mas ainda é comum que essa questão seja tratada de forma superficial ou secundária, sem um compromisso concreto com políticas públicas que enfrentem as desigualdades raciais de maneira estruturada”, avalia Michael França, colunista da Folha e pesquisador do Insper.

Nas propostas de governo dos seis candidatos que têm participado dos debates que foram registradas no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) há diferentes promessas de políticas antirracistas.

Guilherme Boulos (PSOL) propõe a recriação da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial. Uma política de educação antirracista nas escolas e um pacto de enfrentamento à violência contra a juventude negra também compõem o plano do candidato.

Em sabatina promovida pelo jornal Brasil de Fato, o candidato do PSOL disse que pretende ter “a maior proporção de representação negra no secretariado na história da cidade de São Paulo”, sem detalhar um número.

José Luiz Datena (PSDB) propõe priorizar a contratação de fornecedores que cumpram integralmente a Lei de Cotas. Na educação, se compromete a implementar o estudo da história e da cultura afrobrasileira nas escolas municipais.

Ricardo Nunes (MDB) relata que em seu mandato os Centros de Igualdade Racial foram ampliados e que foram desenvolvidas formações específicas sobre o tema para servidores. De acordo com a campanha, a iniciativa poderá ser ampliada, conforme demanda.

Segundo a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania, São Paulo possui nove desses centros e prevê a entrega de seis unidades este ano. O contrato para a manutenção até 2026 é de R$ 6,5 milhões. Ainda estão previstas a distribuição de bonecos negros e migrantes para a educação infantil e a compra de livros com temática étnico-racial.

O plano de Tabata Amaral propõe apoio a empreendedores negros e indígenas com mentoria e capacitação, criação de roteiros de turismo étnico e lançamento de editais temáticos com foco na cultura negra.

Também constam o letramento racial para servidores, campanhas de combate à intolerância e promoção da diversidade religiosa e capacitação de profissionais de saúde.

Nos documentos de Marina Helena (Novo) e de Pablo Marçal que estão no portal do TSE não há proposições específicas para a questão racial.

À Folha, a candidata do Novo afirmou que a boa política pública beneficia a todos, principalmente os mais pobres ou vulneráveis. “Como uma proporção maior de negros estuda em escola pública, nossa principal proposta para igualdade racial é modernizar a educação pública.”

Também questionada, a campanha de Marçal não respondeu até a publicação desta reportagem.

Pela mais recente pesquisa Datafolha, entre os entrevistados que se declaram pretos, 35% dizem votar em Boulos, em seguida aparecem Nunes (19%), Marçal (15%), Datena (9%), Tabata (8%) e Marina Helena (3%). Bebeto Haddad (DC) e João Pimenta (PCO) têm 1% cada um. Brancos e Nulos são 5% e os que não sabem, 4%.

Entre os que se declaram pardos, Nunes tem 31%, em seguida vêm Boulos (21%) e Marçal (20%). Datena e Tabata têm 7% cada um e Marina Helena, 3%. Brancos e nulos são 7% e 4% não sabem.

A margem de erro para os autodeclarados pretos é de sete pontos, para mais ou para menos, e para pardos é de cinco. A pesquisa, registrada sob o código SP-03842/2024, ouviu 1.204 eleitores, de 17 a 19 de setembro.

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